Jornalista é agredido por dirigente esportivo. “Crime”: criticar a politicagem no futebol. Veja vídeo

15 dezembro 2016 às 11h14

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O ex-presidente do Internacional de Porto Alegre Fernando Miranda esmurra o repórter Julio Ribeiro durante programa de televisão

Na década de 1970, os torcedores eram mais amenos, quiçá menos fanáticos. Eu mesmo torcia vários times, como Grêmio, no Rio Grande do Sul; Atlético, em Minas Gerais; Fluminense, no Rio de Janeiro; Santos, em São Paulo; e Goiás, em Goiás. Porém, mesmo apreciando o Grêmio, sempre tive o maior respeito pelo Internacional — um time de primeira linha. O Grêmio e o Inter sempre disputaram de igual para igual com os grandes times de São Paulo e Rio de Janeiro. Não há a menor dúvida de que, embora lamentável, o Inter merecia mesmo ser rebaixado para a Série B, porque jogou mal durante quase todo o Campeonato Brasileiro Série A.
Mas o time do Inter não está perdendo apenas fora do campo. Na segunda-feira, 12, como se estivesse “ensinando” os torcedores na Escola da Barbárie do Internacional, o ex-presidente do time Fernando Miranda deu um soco no rosto do jornalista Julio Ribeiro, diretor-geral da revista “Press”, durante a apresentação do programa “Cadeia Cativa”, da Ultra TV (recolho a informação do portal Comunique-se, do Portal Imprensa e de um vídeo postado na internet).
O que Julio Ribeiro disse de tão grave para despertar o bárbaro que habita o ser de Fernando Miranda? Nada de tão pesado assim. O jornalista criticou “a politicagem” nos clubes de futebol. Irritado, Fernando Miranda gritou que o repórter era “asqueroso” e “babaca”. Na resposta, o jornalista usou uma palavra do cartola: “Babaca é tu”. Aí, perdendo as estribeiras, o ex-presidente do Inter atacou fisicamente. O jornalista não estava criticando — ao apontar a politicagem que prejudica o Inter — de Fernando Miranda. Ele estava falando, aparentemente, de maneira genérica. Porém, este, sentindo-se agredido verbalmente, levantou-se e socou-o. Curiosamente, o que não parece ter percebido por aqueles que comentaram a nota na imprensa, os discursos de ambos não eram contraditórios: os dois estavam criticando a politicagem no futebol. O problema é que Fernando Miranda pensou que o jornalista estava falando especificamente dele — o que, tudo indica, não era. Depois, quando começaram a discutir, aí, sim, Julio Ribeiro sugeriu que Fernando Miranda ficava falando “eu, eu, eu, eu”. De fato, o ego do dirigente esportivo não parece pequeno, mas é fato que também criticou a politicagem no futebol.

No Facebook, Júlio Ribeiro escreveu: “Estou bem fisicamente, mas muito abalado emocionalmente. Amanhã pela manhã, vou contar detalhadamente o que aconteceu. Já tem vídeo rolando pela internet — editado, sem a minha fala de menos de um minuto. Já acionei meu advogado e amanhã mesmo ingresso com uma ação contra esse descontrolado”. A fala é de terça-feira, 13.
Uma fala do apresentador do programa, Luiz Carlos Reche, no lugar de criticar duramente a agressão, contemporiza: “Infelizmente acontece, os nervos estão à flor da pele, o presidente se sentiu ofendido e acabou partindo para as vias de fato. Fazer o quê? Aconteceu. Peça desculpas”. Na verdade, deveria ter condenado a agressão. Fica-se com a impressão de que, de algum modo, está justificando-a.
Na terça-feira, 13, a Associação Riograndense de Imprensa divulgou uma nota na qual condena a violência: “A ARI manifesta indignação e denuncia mais um ato violento de desrespeito à liberdade de expressão e a profissão de jornalista. Condenável, sobre todos os aspectos, a agressão física do ex-presidente do Internacional Fernando Miranda ao jornalista Julio Ribeiro, diretor da revista ‘Press’, durante programa de televisão, sob o comando de Luiz Carlos Reche, da Ulbra TV, ultrapassou todos os limites, demonstrando intolerância e incivilidade. Estamos solidários com o colega em todas as medidas que venha adotar para que este episódio triste não resulte impune. Atos de selvageria não têm qualquer relação justificável com o tempo em que vivemos. O público que acompanhava o programa foi também ofendido”.
Numa entrevista à Rádio Bandeirantes, na terça-feira, 13, no lugar de pedir desculpas, tanto ao jornalista quanto aos telespectadores e aos torcedores, Fernando Miranda manteve-se no ataque: “Não estou em um confessionário. Essa história de arrependimento, não é esse o aspecto de que estamos falando. O que aconteceu ali foi de um ser humano, não foi pensado. Quem nunca teve um bate-pronto, foi reativo a algo que estava acontecendo? Tem algumas pessoas que, como têm rabo (preso), elas aguentam. Eu não tenho rabo. Nunca tiveram nada para dizer a meu respeito”. O que está dizendo é que, quando um indivíduo fica irritado ao ser criticado, pode sair esmurrando as outras pessoas? É o que parece.
O futebol brasileiro vive um mau momento — dentro e fora do campo. Talvez mais fora.