Em busca de retomar o prestígio de outra, o “Jornal do Brasil” reassume o formato impresso e seu novo dono diz que “gente importante” vai escrever em suas páginas

Omar Peres, novo dono do Piantella em Brasília, põe o “Jornal do Brasil” nas bancas em maio deste nao

Uma coisa é: jornais e revistas estão fazendo das tripas coração para viabilizarem-se na internet. Até agora, não conseguiram. Os veículos impressos faturam mais, financeiramente, do que os digitais. É isto que tem retardado os jornais de tornarem digitais de vez. Enquanto não resolvem a contradição — acesso cada vez maior versus menos dinheiro na internet —, os jornais enxugam as edições impressas e reduzem seus quadros de profissionais. Nelson Tanure, que nunca entendeu de jornalismo, ao contrário da família de Nascimento Brito, comprou o “Jornal do Brasil” e, sobretudo para reduzir custos, decidiu editá-lo exclusivamente no formato digital. Parecia moderno e, teoricamente, outros veículos deveriam seguir o mesmo caminho, o que colocaria o grande “JB” na vanguarda da mudança “bem-sucedida”. Ocorre que ninguém seguiu o pioneiro, que, no lugar de se tornar cisne, se transformou no patinho feio do jornalismo. Se já não estava bem, inclusive no impresso, o jornal ficou pior, e praticamente desapareceu, no sentido de que se fala muito da “Folha de S. Paulo”, do “Estadão” e de “O Globo”, mas o “JB” saiu dos comentários — dos bons e dos ruins. O jornalismo não pode deixar o leitor indiferente; no caso do “JB” atual, o da internet, o leitor fica inteiramente indiferente, não tem, é provável, qualquer opinião a respeito.

Cansado de ser considerado como o “fantasma da internet”, o “Jornal do Brasil”, agora na mão de novo dono, voltará ao jornalismo impresso, o que, por certo, acabará por fortalecer o jornalismo digital. O que não se deve esperar é que o “JB” volte a ser o “JB” de outrora, quando era considerado não “um” mas “o” jornal. Era o jornal referencial; existia o “JB” e os “outros”. Lá pontificaram luminares como Janio de Freitas, Ferreira Gullar, Mário Faustino, Reynaldo Jardim, Elio Gaspari, Alberto Dines, Roberto Pompeu de Toledo, Marcos Sá Corrêa, Mario Sergio Conti, Mário Pontes (ótimo crítico literário), Wilson Figueiredo, Villas-Boas Corrêa (pai de Marcos Sá Corrêa), Carlos Castelo Branco (o insuperável Castelinho), Wilson Figueiredo, Walter Fontoura. Não dá mais para montar um time com, digamos, cinco jornalistas de quilate parecido. Primeiro, há o custo, que, na verdade, é investimento, mas é visto pelo patronato como custo. Segundo, os mencionados estão acima da média (alguns morreram). Terceiro, os melhores repórteres estão empregados e talvez não queiram embarcar no que pode ser uma aventura. Quarto, como será o novo “JB”? Retornar ao passado, não dá — é óbvio. Qual será a aposta para o presente?

Sérgio Rangel, da “Folha de S. Paulo” (sábado, 18), publicou uma reportagem com informações sobre o novo destino do “JB”, que será dirigido pelo empresário Omar Peres, que, como Nelson Tanure, não tem experiência com jornalismo. Sua área básica é gastronomia. Há indícios de que, ao contrário do antecessor, vai investir mesmo em jornalismo de qualidade? Não se sabe. A indicação de um editor qualificado é o primeiro passo para saber que música vai tocar. A “Folha” não informa o nome de nenhum jornalista.

Segundo Sérgio Rangel, “o objetivo” de Omar Peres “é vender diariamente cerca de 30 mil exemplares do ‘novo JB’. Inicialmente, a publicação terá dois cadernos, um com 16 páginas e outro com seis, e aos domingos ganhará uma edição ampliada com 24 páginas no primeiro caderno”.

“Gosto de investir em ícones que ficaram na alma das pessoas e da sociedade. Por isso, nunca morrem. Acho que o ‘JB’ é a mesma coisa. Faz parte da alma desta cidade”, afirma Omar Peres. “Ex-dono de uma afiliada da Rede Globo em Minas Gerais, o empresário é proprietário de restaurantes tradicionais do Rio, como La Fiorentina e Bar Lagoa. Sua última aquisição foi o Piantella, reduto de políticos em Brasília”, afirma o empresário. No Rio de Janeiro, atua também na área imobiliária. A questão é que jornalismo é comida para o espírito — não para a pança.

“O Globo” circula no Rio, em Brasília e em São Paulo (em poucas bancas, frise-se). O “JB” não será diferente. O jornal vai circular tão-somente nas bancas do Rio e não terá serviço de assinaturas. O jornal começa a circular em maio.

“As pessoas sentem falta do jornal e queremos resgatá-las. Faremos um produto carioca que fale do Rio, que ofereça uma visão do Brasil e do mundo, mas que tenha informações exclusivas sobre o que acontece aqui”, diz Omar Peres. Na verdade, a ideia semelhante ao projeto original do “JB” (um lançador de modas e comportamentos), mas será muito difícil colocá-lo em pé de novo. Sem contar que o espaço-líder hoje está “ocupado” por “O Globo” — que melhorou muito, inclusive encampando algumas ideias do ex-concorrente e, durante algum tempo, contratando alguns de seus melhores profissionais.

O novo “JB”, se for menos pretensioso, mas sobretudo se for um bom jornal, com reportagens mais amplas e opinião equilibrada e multifacetada, já estará bem. Hoje, no Rio, não há um jornal que se possa sugerir como segundo colocado, atrás de “O Globo”. O “lugar” está vago, pois “O Dia” concorre com o “Extra!” — não com “O Globo”. Se o “JB” conseguir se tornar o segundo colocado, uma espécie de primo pobre mas charmoso (por que não oferecer uma página para Ruy Castro ou Sérgio Augusto escreverem o que quiserem?), os leitores não vão reclamar. Não precisa ser, portanto, o “JB” de outrora. Basta ser um bom jornal, bem informado, criativo, atento e, quando possível, divertido.

30 profissionais

A redação do “JB” terá 30 profissionais (a reportagem da “Folha” não especifica se são 30 jornalistas, ou, se no número, estão incluídos repórteres e fotógrafos). A sede do jornal será na Avenida Rio Branco, no centro do Rio. Omar Peres sustenta que vai investir em qualidade jornalística: “Vamos ter gente importante escrevendo”. Resta saber, quando o jornal começar a circular, o que o empresário entende por “gente importante”. No Brasil, gente importante equivale, às vezes, a estrelas (atores) de televisão.

Um dos pontos fortes do “JB”, nos tempos áureos, além da forte cobertura política, eram os textos de esporte e internacional. Na nova versão, a redação nada vai produzir nesta área, exceto, eventualmente, algum reportagem especial. “Vamos usar o material das agências. A maior parte dos assuntos de Brasília também virá dessa forma”, assinala Omar Peres. O jornal não terá correspondentes internacionais. O empresário assina, na próxima semana, “o contrato para usar a marca” do “Jornal do Brasil”.

O “JB” está fora das bancas desde 31 de agosto de 2010. Há quase sete anos. Mas, para a maioria dos brasileiros, o jornal continuará digital…