Ex-ministro do STF diz que lei de direito de resposta é hostil à liberdade de imprensa
21 novembro 2015 às 11h39
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A lei do direito de resposta “trabalha mal com as categorias constitucionais sobre liberdade de imprensa e direito de resposta”. É “hostil à liberdade de pensamento”
O ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Carlos Ayres Britto [foto ao lado] disse, em entrevista ao repórter Graciliano Rocha, da “Folha de S. Paulo” (sexta-feira, 20), que a lei do direito de resposta “trabalha mal com as categorias constitucionais sobre liberdade de imprensa e direito de resposta. Ela foi hostil à liberdade de imprensa e de pensamento”.
Ayres Britto, jurista ponderado, sublinha que “a lei parte de uma presunção equivocada, que é a do abuso da liberdade de imprensa, e não do uso. Ela não é deferente com este valor constitucional maior, que é o da liberdade. É uma lei desconfiada que não cita uma vez sequer a palavra pensamento. Vários dispositivos parecem, para dizer o mínimo, de constitucionalidade duvidosa”.
Para o ex-ministro do Supremo, um dos problemas é o artigo 7º, que “afirma que o juiz, nas 24 horas seguintes à citação, tenha ou não se manifestado o responsável pelo veículo de comunicação, poderá deferir o direito de resposta em até 10 dias se tiver ‘justificado receio’ de ineficácia do provimento final. Ou seja, sem ouvir a parte contrária, e ‘justificado receio’, como está no texto, convenhamos, é muito subjetivo. Outro problema é que a lei elimina a possibilidade de um juízo monocrático no âmbito dos tribunais. Os defeitos pontuais parecem muitos, do ponto de vista da constitucionalidade”.
A lei do direito de resposta — formulada pelo senador Roberto Requião, um político sério, mas obcecado com a possibilidade de controlar a imprensa — ignora, segundo Ayres Britto, a categoria da proporcionalidade. “Do jeito que foi aprovado, o texto permite que se quatro pessoas se sentirem agravadas em uma notícia de televisão, cada uma delas pode pedir e obter o mesmo direito individual na mesma extensão [da reportagem] como resposta. A proporcionalidade foi ignorada pela lei, o que é grave.”
O político Pedro Aleixo disse que o perigo, na ditadura, não era o general, e sim o guarda da esquina (o micropoder). Parece ser o caso. Um jurista como Ayres Britto nota as falhas da lei, e com uma clareza ímpar, mas um magistrado obtuso a aplicará rigorosamente — para cumpri-la ao pé da letra.
Na semana passada, o senador Delcídio do Amaral [foto ao lado], do PT, disse a um repórter da “Folha de S. Paulo” que, se seu nome fosse citado numa matéria sobre propina, exigiria, na Justiça, o direito de resposta. Agora, como se vê, as pressões começaram antes mesmo de as reportagens serem publicadas. É, por certo, o que queria Roberto Requião — manietar a Imprensa, com o uso da lei como recurso de intimidação.
O presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, mesmo sem questionar o mérito de uma reportagem de “O Globo”, exigiu direito de resposta, com base na nova lei.
A lei do direito de resposta, uma excrescência jurídica, quer transformar o jornalismo no sorriso do poder e cárie da sociedade.