Polícia precisa ser respeitada por todos para ser mais efetiva no combate ao crime

13 setembro 2020 às 00h00

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Direitos humanos? Só bandidos os têm. Nenhuma “entidade” se lembra de estendê-los aos abnegados policiais. Ponto para a impunidade
Se a Educação é a nossa maior urgência, a Segurança disputa com a Saúde o segundo lugar no universo das preocupações brasileiras.
É antigo o provérbio que reza: “A criminalidade se alimenta da impunidade”. Sendo verdade a assertiva, como de fato é, pois em qualquer mercado, mesmo no do crime, a análise que conta é a de custo versus benefício, é explicável o alto nível da marginalidade em terras pátrias.
Nas democracias, a qualquer malfeitoria, independentemente de seu nível, se opõem — ou devem se opor — três barreiras: a policial, a judicial e a penitenciária. É evidente que o enfraquecimento de uma, duas ou de todas essas contenções democráticas se traduz em impunidade, e, via de consequência, em aumento da criminalidade.
O criminoso só é contido se se convence de que: 1) se reagir à polícia, vai apanhar; se reagir armado, vai morrer; e ninguém vai apoiar bandido contra policial; 2) a Justiça vai condená-lo com rigor, e ele será encarcerado, enquanto sua família ficará desamparada; 3) uma penitenciária é um local horrível para se viver, onde terá que trabalhar, ficará isolado e de onde só sairá depois de cumprida inteiramente sua pena.
Vejamos se isso vem ocorrendo nas últimas décadas por aqui. Na primeira linha de trincheiras — a policial — houve uma diminuição da importância do trabalho de investigação, de prevenção e de repressão desde o governo Fernando Henrique. O trabalho policial passou a ser visto pelos governos de esquerda como truculento, descuidado e atentatório aos direitos humanos. Os congressistas de esquerda a repisam, constantemente. A imprensa, com poucas exceções, passou a apoiar essa visão, e o mesmo aconteceu no meio acadêmico.
Foi — e ainda é — feito um grande trabalho para mostrar o policial como ameaça a parcelas da sociedade, distorcendo por completo sua imagem de guardião dessa mesma sociedade. Balas perdidas, que vitimam inocentes, saem sempre das armas policiais, nunca dos criminosos. Mortes de bandidos armados em confrontos com representantes da lei são evidenciadas como “mortes de pobres e negros, na sua maioria”, levando para o lado ideológico da luta de classes um problema que é única e exclusivamente policial. Ou é verdade que um policial, num confronto com bandidos armados, dispara apenas contra os bandidos negros?
É inegável que existiu um esforço nestas últimas décadas para enfraquecer a superioridade moral que deve ser patente do policial sobre o bandido, esforço que, se fracassou em alguns Estados, noutros, como no Rio de Janeiro, deu resultados, com reflexos negativos sobre o trabalho da polícia, sempre carente de estímulo, dado sua dureza e periculosidade.
Direitos humanos? Só bandidos os têm. Nenhuma “entidade” se lembra de estendê-los aos nossos abnegados policiais. Ponto para a impunidade.
No que respeita à questão judicial, se já enfrentávamos no combate ao crime uma justiça lenta e leniente, vimos ultimamente surgir um verdadeiro código de apoio à impunidade. A Lei de Execuções Penais (Lei 7.210/84), LEP, previa uma progressão de regime cumprido 1/6 da pena, para crimes comuns e 2/5 (ou 3/5 em caso de reincidência), para crimes graves. Não se falava em crimes hediondos, que tiveram suas penas explicitadas na Lei 8072, de 1990. As penas para crimes hediondos deveriam ser cumpridas integralmente em regime fechado, por essa lei. A Lei 11.464, de 2007 já admitia Progressão de Regime, para esses crimes, desde que cumpridos 2/5 da pena.
O Pacote Anticrime (Lei 13.964, de 2019) reafirmou esse entendimento. Contudo, o Supremo Tribunal Federal, por entendimento do ministro Gilmar Mendes, manda aplicar puramente o que diz a Lei de Execuções Penais, ou seja, cumprido 1/6 da pena, o criminoso, por mais hediondo que seja seu crime, terá direito à progressão de regime. Visitas íntimas nos presídios passaram a ser permitidas pela Lei 12.594, de 2012, até mesmo para menores infratores. As penas passaram a sofrer redução por leitura, por estudo e por trabalho, apesar do trabalho dos apenados ser obrigatório pela própria LEP.
O Auxílio Reclusão, previsto na Lei 8.213, de 1991, uma das excrecências do direito brasileiro, passou a ser pago às famílias de traficantes, assassinos e estupradores, em valor superior ao salário mínimo, enquanto familiares de suas vítimas permanecem desassistidas. As saídas temporárias são outro paradoxo da leniência penal brasileira, permitindo saídas em datas especiais (Páscoa, Natal, Dia dos Pais, Dia das Mães, etc.) para presos.
Paradoxo porque, por exemplo, Alexandre Nardoni, que matou a filha Isabella, em São Paulo em 2008, pode sair para comemorar … o Dia dos Pais. Como Suzane Richthofen, que em 2002 mandou matar os próprios pais, pode sair no Dia das Mães.
As Audiências de Custódia, figura estranha ao Direito brasileiro, acabaram por serem adotadas em 2015, por acolhimento do Supremo Tribunal Federal e têm se constituído em ferramenta de proteção a criminosos e desestímulo e injustiça a policiais devotados, muitas e muitas vezes, dependendo da falta de esclarecimento ou da ideologia do juiz. Assassinos e traficantes com 18 anos menos um dia se livram mesmo perpetrando os piores crimes, e nem sequer podem ser fotografados.
Toda a esquerda se levanta se alguém propõe qualquer alteração na maioridade penal. É também um bordão da esquerda dizer que “o Brasil encarcera demais”, que é preciso prender menos. Ou seja, é preciso aumentar a impunidade. Um dado, somente, para o leitor: nos Estados Unidos, onde a criminalidade é muito menor que no Brasil, o número de presos por mil habitantes é de 6. Aqui, essa taxa está quase na metade: 3,6.
A impunidade ataca também a partir dos tribunais superiores e beneficia ricos, políticos e empresários. O jornalista Alexandre Garcia, numa como sempre competente análise, num artigo deste mês, intitulado “Ainda há Constituição?” mostra como a Suprema Corte havia, nos últimos anos, atropelado pelo menos uma dezena de vezes a Constituição que lhe cumpre guardar.
O senador José Serra, dias atrás, viu-se em palpos de aranha para explicar alguns milhões de dólares encontrados em conta dele e da filha em paraíso fiscal. O Supremo, de certa forma, paralisou as investigações.
O procurador da República Deltan Dallagnol teve, por ordem também do Supremo, um inquérito contra si liberado para prosseguimento no Conselho Nacional do Ministério Público. O argumento da Suprema Corte foi de que havia risco de prescrição. O estranho é que quem acionou o Supremo foi Renan Calheiros. Sabe-se que corre contra ele uma dezena de processos na Corte, e por ironia, em risco de prescrição, mas que nem por isso andam.
Os presídios, que os criminosos deveriam por natureza temer, com o passar dos anos tornou-se território de sua dominação. Apenas escapam os presídios federais de segurança máxima. Os demais tornaram-se escritórios de facções criminosas, onde os agentes penitenciários atuam fragilizados, dado o poder cada vez maior do crime organizado e sua audácia em afrontar os poderes constituídos.
Em resumo, para dissuadir o criminoso, a polícia deve ser bastante dura para que ele dela tenha medo; a Justiça deve ser implacável para que ele tema as penas que lhe serão impostas, e estas inflexíveis; e as penitenciárias, locais onde ele tenha pavor de permanecer. Só assim se combate a criminalidade. Nenhuma dessas coisas acontece hoje, por aqui.
O que mais temeriam os criminosos? A população? Mas esta foi desarmada pelos governos de esquerda, sem que existisse o mínimo esforço para desarmar o crime. Daí que o número de assassinatos no país tenha saído da casa de 19.000 ao final do governo do presidente João Figueiredo para mais de 60.000 no fim do governo Dilma Rousseff. E o número de soldados do tráfico, todos bem armados, no Rio de Janeiro já supera o contingente da Polícia Militar no Estado. Lá também existem áreas de favelas fora do domínio institucional do Estado brasileiro, onde os poderes constituídos são os do tráfico. O atual governo federal se empenha para reverter essa situação. Mas é tarefa complexa, para muitos anos. Talvez décadas.