Neurologistas tentam mapear circuitos nervosos associados aos sintomas depressivos e estimular áreas concorrentes com baterias e condutores no cérebro 

Depois de implantar eletrodos na região cingulada subcalosa do cérebro de um paciente, Helen Mayberg e sua equipe testam o dispositivo| Foto: Reprodução/ElenMayberg

Alguns pacientes que sofrem de depressão não mostram melhora mesmo quando tratados com drogas e eletroconvulsoterapia. Parte desse grupo de deprimidos tem alívio com a técnica da estimulação cerebral profunda (DBS, na sigla em inglês), que consiste em aplicar estímulos elétricos com fios implantados cirurgicamente em áreas do cérebro. Recentemente, porém, dois estudos clínicos foram interrompidos após a técnica da DBS render resultados decepcionantes e agora os neurologistas se dedicam a entender onde estão errando. 

Na prática, o tratamento consiste em uma bateria com condutores especiais implantados na cabeça do paciente, programados para estimular periodicamente de forma controlada determinadas regiões do cérebro. O DBS já foi aprovado nos Estados Unidos para tratar epilepsia, transtorno obsessivo-compulsivo e transtornos do movimento, como a doença de Parkinson, e se espera que a técnica também possa mudar os padrões de atividade anormal nos circuitos neurais que causam os sintomas de depressão.

Helen Mayberg foi a neurologista pioneira no uso de DBS para tratar depressão. A pesquisadora da Escola de Medicina Icahn, no hospital Mount Sinai, foi a responsável por identificar a área do cérebro que pode ser estimulada para reduzir sintomas depressivos: o giro cingulado subcaloso (SCC). Um estudo randomizado e com grupo controle acompanhou 30 participantes por um ano para compreender os efeitos de longo prazo do tratamento. Cerca de metade dos participantes teve uma melhora de pelo menos 50% em relação à pontuação do pré-tratamento em uma escala de severidade da depressão. A maioria continua a usar o implante cerca de 10 anos depois.

Recentemente, entretanto, estudos com objetivo de testar a estimulação do SCC como um tratamento para depressão renderam resultados muito abaixo do esperado. A hipótese é que diferenças sutis em onde os cirurgiões colocam os eletrodos são responsáveis ​​pela variação nos resultados dos pacientes. Portanto, o grupo de Helen Mayberg busca uma abordagem de ressonância magnética chamada tractografia para visualizar localizações de feixes de nervos e eletrodos-alvo com mais precisão. 

Além da tractografia, diversas equipes de pesquisadores exploram abordagens de estimulação informadas pela anatomia cerebral de cada indivíduo. Avanços nesse sentido foram permitidos pelo desenvolvimento de tecnologias como os eletrodos de registro neural, que detectam oscilações da atividade elétrica gerada pelos neurônios – uma espécie de mapeamento dos circuitos dentro do cérebro. 

Outras equipes têm uma personalização mais ampla em mente. A psiquiatra Katherine Scangos, da University of California, San Francisco, e colegas estão usando os dados neurais de um indivíduo para decidir qual região-alvo estimular e exatamente quando administrar a estimulação. Antes de inserir os eletrodos DBS, a equipe implanta um segundo conjunto de eletrodos que pode gravar e estimular o tecido em diversas regiões do cérebro. Os cirurgiões já contam com a abordagem, conhecida como eletroencefalografia estereotáxica (sEEG), para identificar a origem das crises antes da cirurgia de epilepsia. Agora, a equipe de Scangos o usou para estimular regiões relacionadas ao humor e selecionar um alvo onde a estimulação alivia os sintomas de forma confiável.

sEEG | Foto: Reprodução

Os resultados de estudos com sEEG foram publicados no periódico científico Nature Medicine. Para o primeiro paciente, de 12 planejados no estudo em andamento, os médicos auxiliados pelo implante encontraram dois alvos de estimulação ideal. O dispositivo, chamado NeuroPace, cujo uso já é aprovado para detectar e parar convulsões – foi programado para estimular os alvos apenas na presença de padrões de atividade típicos da depressão severa. A primeira paciente sentiu um alívio significativo de seus sintomas por mais de 1 ano desde a cirurgia.

Outros pesquisadores estão esperando por mais evidências de que essa abordagem automatizada para o momento da estimulação é necessária. “Com depressão severa, não é como se você estivesse alternando entre realmente deprimido e totalmente normal ao longo de momentos ou horas”, escreveu Sameer Sheth, neurocirurgião do Baylor College of Medicine, em artigo da revista Nature.

A equipe de Sameer Sheth usa eletrodos sEEG para encontrar as melhores configurações para DBS contínuo em cada paciente. Durante uma internação de 10 dias no hospital, os pesquisadores usam leituras sEEG para identificar padrões de atividade cerebral associados a um humor positivo e rastrear como essas leituras mudam em resposta à estimulação DBS. Um algoritmo de computador identifica então a frequência, amplitude e outras configurações ideais para melhorar o humor.

Dados do primeiro participante de um ensaio em andamento, publicados nesta segunda-feira, 22, na Biological Psychiatry, mostram que seus sintomas melhoraram nos primeiros meses após a cirurgia – e então pioraram continuamente durante uma fase de descontinuação, quando a estimulação em alguns dos locais foi reduzida gradualmente em um ponto de tempo desconhecido para o paciente. (Os pesquisadores então voltaram o implante à potência total.)

Sheth observa que implantar o conjunto de eletrodos sEEG para orientar o tratamento é provavelmente muito invasivo e trabalhoso para ser viável para todos os pacientes, embora possa oferecer uma chance de ajustar o DBS em pacientes cujos sintomas não estão respondendo. Ele também espera que os pesquisadores possam desenvolver métodos menos invasivos e mais baratos para guiar as configurações de estimulação DBS.