Falta de sono deixa as pessoas mais egoístas, aponta estudo
21 novembro 2022 às 18h53
COMPARTILHAR
Cientistas da Universidade da Califórnia, em Berkeley, publicaram no periódico PLOS Biology um estudo em que acompanharam os efeitos da falta de sono no comportamento. Já se sabia que a privação de sono prejudica o coração, mas a atenção dos pesquisadores foi atraída pelo fato inusitado de que, em todo os Estados Unidos, as doações para organizações de caridade sem fins lucrativos caem em média 10% na semana em que uma hora de sono é perdida na mudança para o horário de verão. No Arizona e no Havaí, estados que não adotam o horário de verão, as doações permaneceram inalteradas.
Como mais da metade das pessoas que vivem em países desenvolvidos relatam que raramente dormem o suficiente durante dias de trabalho, a descoberta tem implicações além do horário de verão. “A falta de sono molda as experiências sociais que temos e o tipo de sociedade em que vivemos”, escreveu o neurocientista Eti Ben Simon, da Universidade da Califórnia, em Berkeley.
Para testar a ligação entre perda de sono e a generosidade, Ben Simon e sua equipe levaram 23 jovens adultos ao laboratório por duas noites. Os participantes dormiram uma noite e ficaram acordados por outra noite. No período da manhã, os participantes preencheram um questionário padronizado que avaliava sua probabilidade de ajudar estranhos ou conhecidos em vários cenários.
Por exemplo, os participantes classificaram em uma escala de 1 a 5 a probabilidade de ceder seu assento em um ônibus para um estranho, ou de oferecer uma carona para um colega de trabalho necessitado. Aproximadamente 80% dos participantes mostraram menos probabilidade de ajudar os outros quando privados de sono do que quando descansados.
Os pesquisadores então observaram a atividade cerebral dos participantes em uma máquina de ressonância magnética funcional, comparando a atividade neural de cada participante em um estado de descanso versus em um estado de privação de sono. Isso mostrou que a falta de sono reduziu a atividade em uma rede de regiões cerebrais ligadas à capacidade de empatia.
Em outro experimento, os pesquisadores recrutaram 136 participantes online e fizeram com que eles mantivessem um registro do sono por quatro noites, monitorados por aplicativos que medem a atividade noturna. Cada participante então completou o questionário de altruísmo. Os pesquisadores descobriram que quanto mais tempo os participantes passavam acordados na cama, uma medida de sono ruim, menores eram suas pontuações de altruísmo. Essa queda no altruísmo se manteve verdadeira tanto ao comparar os indivíduos consigo mesmos quanto em relação a outros indivíduos do grupo.
No experimento final, focado no horário de verão, os pesquisadores analisaram doações de caridade de 2001 a 2016 para a Donors Choose, uma organização sem fins lucrativos que arrecada dinheiro para projetos escolares nos Estados Unidos. Quando a equipe excluiu o Havaí e o Arizona, além de exceções como doações muito grandes, restaram mais de 3,4 milhões de doações. Na semana de trabalho após a implementação do horário de verão, as doações totais, que normalmente giravam em torno de US$ 82 por dia, caíram para cerca de US$ 73 por dia.
A abordagem de metodologia tripla permitiu aos pesquisadores maior certeza de que outras variáveis além do sono não estivessem causando a queda na generosidade. A privação crônica do sono no mundo moderno é um problema sério, escreveu Ben Simon nas conclusões de seu trabalho. Mas, ao contrário de muitos outros problemas de grande escala, este tem uma solução acessível. Desta forma, promover o sono como Saúde Pública pode economizar bilhões em tratamentos de condições crônicas e melhorar as relações sociais e qualidade de vida dos indivíduos.