Os vereadores derrubaram os vetos à emenda da vereadora Sabrina Garcez (Republicanos) na Lei de Habitação de Interesse Social (HIS), parte do Plano Diretor de Goiânia. Em votação apertada, 19 representantes votaram a favor, enquanto 11 queriam manter o veto, lembrando que era necessária uma maioria simples para derrubá-lo, ou seja, 18 votos. Apesar da votação concluída, parlamentares temem a judicialização da matéria.

A principal polêmica dentro do texto é a possibilidade de verticalização da Avenida Fued José Sebba, que faz divisa entre o Setor Leste Universitário, Jardim Goiás e também da acesso ao Parque Lozandes . Especialistas em urbanismo e moradores da região se posicionaram contrários à possibilidade, além de apontarem que essa medida representa um risco para Goiânia.

Inclusive, a matéria chegou a ser judicializada pelos vereadores Lucas Kitão (UB) e Igor Franco (MDB). Os dois apontam que o texto não deveria estar na lei da HIS, por isso ela seria um “jabuti”. O mandado de segurança dos parlamentares foi acatado de forma parcial pela decisão da juíza Raquel Rocha Lemos.

“A segurança, portanto deve ser concedida apenas parcialmente para declarar vício formal em relação ao processo legislativo Autógrafo de Lei Complementar nº 06/2024, exclusivamente em relação às emendas que alteram o Plano Diretor de Goiânia, uma vez que não realizadas audiências públicas para dar transparência e publicidade às mudanças de ordem material no Plano Diretor de Goiânia”, diz o documento da decisão.

Por conta da decisão, Garcez contou ao Jornal Opção em outubro que já havia realizado duas audiências públicas a respeito do tema, uma no dia 9 e outra no dia 14 de outubro. A vereadora também havia dito que esperava que a matéria fosse votada até o final do ano, o que de fato aconteceu. Na sessão de hoje, ela voltou a reafirmar o mesmo argumento.

“Tivemos duas audiências públicas bem debatidas sobre isso e ficou esclarecido que a avenida suporta o adensamento, a região está sendo tratada como polo atrativo, visto que a administração pública toda está se deslocando para lá, como o Paço Municipal, a Alego, órgãos de controle, como o Ministério Público. É uma região que necessitará de mais moradias, o projeto é mais do que um adensamento em uma avenida, ele trata de habitação de interesse social, que é o que nossa cidade precisa. Já faz quatro anos que não implementamos uma política pública eficaz a respeito, e é fundamental destravar esse projeto para o benefício de Goiânia”, defende a vereadora.

Por outro lado, o presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), Henrique Alves (MDB), apontou que a matéria está na Justiça e recomendou que os vereadores não votassem o texto. Lendo a decisão da última semana, Alves afirmou que a juíza manteve a decisão e que não houve comprovação de que os requisitos estabelecidos foram cumpridos.

“Gostaria de deixar claro, até porque o projeto de habitação de interesse social é essencial para Goiânia, essencial para o nosso prefeito eleito Sandro Mabel, para levar habitações a quem efetivamente precisa na nossa capital. Eu não tenho nada contra, muito pelo contrário, as emendas que foram colocadas, algumas extremamente relevantes, outras que estão sob pena de responsabilidade”, alertou o parlamentar.

Segundo a decisão, os requisitos estabelecidos no Estatuto da Cidade e na Resolução nº 25 do Conselho das Cidades sobre a publicidade das audiência não foram cumpridos. A juíza aponta que dois requisitos ainda não foram cumpridos:

“a) o cronograma e os locais das reuniões, com a apresentação dos estudos e propostas sobre o plano diretor com antecedência mínima de 15 (quinze) dias, de acordo com o artigo 4º, inciso II da Resolução nº 25, de 18 de março de 2005 do Conselho das Cidades;

b) a forma em que foi realizada a convocação para a participação nas audiências públicas, demonstrando a ampla comunicação por meios de comunicação ao alcance da população local, de acordo com o disposto nos artigos 4º, inciso I e 8º, inciso I, da Resolução nº 25, de 18 de março de 2005 do Conselho das Cidades”.

No entanto, Garcez respondeu as falas de Alves e garantiu que as medidas foram cumpridas. “Não houve trânsito em julgado dessa decisão, esse é o primeiro ponto. É uma decisão que cabe recurso e entramos com um embargo informando a juíza que a audiência pública foi realizada.

Votação

Na última quinta-feira, 26, a votação do veto foi incluída na pauta. No entanto, a questão gerou inúmeras discussões, e a sessão precisou ser suspensa para que a Mesa Diretora da Casa pudesse discutir a respeito. No final, a matéria foi retirada de pauta mais uma vez, lembrando que o presidente Romário Policarpo (PRD) já havia havia feito isto na sessão do dia 5 de novembro.

No entanto, o texto foi votado hoje com dificuldades para atingir a votação mínima. Com 19 votos favoráveis ao relatório que possibilita a derrubada do veto, o texto só foi aprovado após o vereador Izídio Alves (DC) optar por votar “sim” e o vereador Wellington Bessa (DC) alterar seu voto de “não” para “sim”.

Posteriormente, os vereadores ainda votaram um destaque para aprovar os artigos 11, 12 e 25. Os artigos tratam sobre a regulação de imóveis destinados para a HIS.

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Confira como votou cada vereador

Sim:

  • Anselmo Pereira (MDB)
  • Wellington Bessa (DC)
  • Bill Guerra (MDB)
  • Cabo Senna (PRD)
  • Denício Trindade (UB)
  • Geverson Abel (Republicanos)
  • Isaías Ribeiro (Republicanos)
  • Izídio Alves (DC)
  • Joãozinho Guimarães (Solidariedade)
  • Juarez Lopes (PDT)
  • Kleybe Morais (MDB)
  • Leandro Sena (Solidariedade)
  • Léia Klebia (Podemos)
  • Léo José (Solidariedade)
  • Pedro Azulão Jr. (MDB)
  • Ronilson Reis (Solidariedade)
  • Sabrina Garcez (Republicanos)
  • Thialu Guiotti (Avante)
  • Welton Lemos (Solidariedade)

Não:

  • Kátia Maria (PT)
  • Fabrício Rosa (PT)
  • Aava Santiago (PSDB)
  • Henrique Alves (MDB)
  • Igor Franco (MDB)
  • Lucas Kitão (UB)
  • Markim Goyá (PRD)
  • Sargento Novandir (MDB)
  • Paulo Magalhães (UB)
  • Willian Veloso (PL)
  • Luciula do Recanto (MDB)

*Luciula do Recanto registrou o voto através de fala no plenário e Aava Santiago votou contra de forma remota.

Adensamento

A arquiteta e professora da Pontifícia Católica de Goiás (PUC-GO), Maria Ester de Souza, explica que alterações como esta podem ser um risco para Goiânia. Ela aponta que essas medidas precisam de estudos técnicos e diagnósticos adequados. Caso contrário, a organização do município pode ficar prejudicada com todas as alterações.

“Quando se propõe uma alteração no zoneamento da cidade, isso coloca em escanteio toda a metodologia do planejamento urbano. A organização da cidade não pode ser feita a partir de emendas. Precisamos de um estudo técnico e um diagnóstico adequado, e não apenas do desejo de alguém”, ressalta a professora, em entrevista para o Jornal Opção.

Segundo a especialista, a saturação da região pode causar problemas de mobilidade, infraestrutura e até drenagem urbana. Ela aponta que mais adensamento no local pode tornar o solo mais impermeável na região, o que não permite uma drenagem adequada.

“Essa proposta de emenda não tem limite de adensamento, ela permite a construção onde couber. Se vão construir muitos prédios em um lugar que já está saturado, isso pode piorar muito a situação. A chance de dar errado é muito grande e na avenida já há superlotação e adensar aquela região não é necessário”, defende a docente da PUC-GO.

Audiência Pública

Como dito anteriormente, houve duas audiências públicas para discutir a possibilidade de adensamento da avenida. Além da presença do representante do CREA-GO, o evento recebeu moradores e trabalhadores locais que deram opiniões em ângulos diferentes.

Em um momento, o corretor de imobiliário Henrique Costa defendeu a possibilidade verticalizar e adensar a região. Ele utiliza o mesmo argumento de Garcez sobre a intenção de aproximar os trabalhadores do local de trabalho. Considerando que na avenida estão construções importantes, como a Receita Federal, a Assembleia Legislativa de Goiás (Alego), o Ministério Público Federal (MPF), entre outros prédios.

“Em virtude de outros países, as pessoas estão indo morar onde trabalham, ao ponto de nem precisarem tirar o carro da garagem porque podem ir a pé”, disse o corretor de imóveis na audiência pública no início do mês. “Há pessoas que trabalham na região e que estão interessadas em morar lá, elas me perguntam a disponibilidade de imóveis na região”, acrescentou.

Em defesa do adensamento, Costa diz que problemas como o trânsito precisam ser resolvidos de outra forma, mas sem impedir a possibilidade de mais construções.

Por outro lado, a arquiteta e moradora da região, identificada apenas como “Patrícia”, alertou sobre as consequências de um possível adensamento no local. “Acrescentar a avenida que não faz parte do Plano Diretor causará um efeito contrário ao desejado. A emenda estará promovendo o caos das funções urbanas trazendo desordenamento da cidade”, apontou.

Moradora da região há 20 anos, ela cita que a região já sofre com problemas de mobilidade urbana e que essa mudança no Plano Diretor pode piorar a situação. Ela também garante que vai fazer de tudo para impedir a modificação. “Vamos lutar, estamos organizando com os vizinhos para que isso não aconteça, já que existem outros locais que podem ser adensados”, relatou.

Jabuti

Para o assessor institucional do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia de Goiás (CREA), Antônio de Pádua, a emenda deveria ter sido para o Plano Diretor de Goiânia e não na lei da HIS por não se tratar exclusivamente de moradias populares.

“A emenda é o que as pessoas costumam a chamar de ‘jabuti’ porque trata de isenção de imposto, outro assunto”, aponta o representante do CREA-GO, que esteve presente em uma das audiências públicas a respeito. “O pessoal acredita que o adensamento vai permitir construir ali habitação de interesse social. E isso não está no texto. Acho que eles estão fazendo uma certa confusão com isso”, explica.

Por isso, ele afirma que a sugestão deveria ter ido direto ao Plano Diretor de Goiânia. “Essa discussão merece uma revisão muito mais ampla e não deveria ser acrescentado em outra matéria para ser aprovada de forma mais fácil”, conta.

Segundo o representante do CREA-GO, emendas como essa estão desvirtuando o Plano Diretor de Goiânia. Por isso, ele defende uma região da atual legislação porque ela estaria completamente diferente do que foi enviado pelo ex-prefeito Iris Rezende (MDB) em seu último mandato.

Ressaltando que há uma emenda vetada sobre a isenção do Imposto sobre Transmissão de Imóveis (ISTI) na lei da HIS. O tributo municipal é cobrado em transferências de propriedades de imóveis. Por exemplo, sempre que há uma venda de imóvel, o novo proprietário paga o imposto.

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