Programas sociais e indústria ajudariam Brasil a sair da crise, diz Luiz Gonzaga Belluzzo
03 setembro 2022 às 18h00
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Apesar de não possuir pretensões em ser Ministro da Economia, em entrevista para o Jornal Opção, o economista e professor, Luiz Gonzaga Belluzzo, explicou sobre ações para ajudar a situação econômica do Brasil. “Observando os choques sofridos, uma das preocupações centrais para orientar o atual momento na política econômica seria pensar em questões de curto e longo prazo. Algumas medidas mais imediatas, com o prazo mais curto, e outras que demandam persistência, uma reorganização mais profunda na economia”, defendeu o docente da da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
A primeira questão que Belluzzo defendeu que seja combatida de forma mais imediata é a questão da insegurança alimentar. “É inadmissível um país como o Brasil, com capacidade tão brilhante de produção no agronegócio, que existam pessoas passando fome”, conta. O economista comentou que é necessário uma organização institucional e programas sociais adequados para impedir que isso afete uma boa parcela da população. Ele também citou o exemplo dos Estados Unidos e o governo de Joe Biden como referência para investimentos nas camadas sociais mais frágeis.
Outro problema levantado pelo professor da Unicamp foi a desindustrialização do país, uma situação de longo prazo que, segundo ele, acontece desde os anos de 1990. “O Brasil já foi o mais industrializado entre os países entre os países conhecidos como emergentes, a participação da indústria de transformação chegou a 28% do Produto Interno Bruto (PIB), mas hoje está por volta de 10,8% a 11%”, explicou o especialista, ainda defendendo que seja seguida uma articulação que tenha sucesso igual a do ex-presidente Juscelino Kubitschek, em meados do século passado. “O Brasil precisa de uma reorganização institucional que combine os impulsos do setor privado para avançar em certas áreas, com organização do Estado que seja capaz de estimular o empreendedorismo privado”, completou.
O ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda do governo de José Sarney defende que haja um empenho da sociedade para discutir as questões econômicas, assim como houve na era JK. “Sempre uso o exemplo do Juscelino (Kubitschek) porque ele criou os grupos executivos, por exemplo, tinha o grupo executivo da indústria automobilística, o da indústria de transportes e da indústria mecânica. Com essa reformulação, ele deu um salto muito grande porque chamou uma parte da sociedade estar envolvida”, justifica. Ele também ressaltou que isso também aconteceu com muito sucesso após a Segunda Guerra Mundial nos Estados Unidos e na Europa.
Entretanto, para poder reindustrializar o país, o Luiz destacou que é necessário um investimento pesado em tecnologia para que se tenha uma nova indústria contemporânea. O que para ele é algo que não pode ser feito sozinho e que precisa de investimento estrangeiro. Além de defender uma articulação entre as empresas nacionais com as universidades do país. “Essa relação Estado, universidade e empresa é decisiva para você conseguir um resultado favorável, mas não é simples igual fritar um ovo na cozinha, só que com paciência e empenho, a economia pode recuperar minimamente a sua capacidade industrial e de avanço tecnológico”, contou doutor em economia pela Unicamp.
“O teto de gastos é uma aberração”
“O Teto de Gastos é um dos maiores absurdos do ponto de vista fiscal que eu já vi na minha vida. Não conheço nenhuma experiência similar”, afirmou Belluzzo, quando questionado a respeito de como a emenda constitucional estaria em um processo de retomada econômica.. “Essa é uma ideia que você tem o dinheiro em uma caixinha, sendo que quando pega o dinheiro para repassar para a educação, você não poderá enviar para a saúde também”, explicou o economista.
Para criticar o Teto de Gastos, o autor do livro “Os Antecedentes da Tormenta” voltou no passado bem distante. “Desde o século 17, o capitalismo inventou uma forma de você aumentar a economia através da criação monetária, isso é uma estrutura institucional do Banco Central e dos bancos privados. Eles articulam a produção monetária a partir do crédito para que sejam respeitados os critérios mínimos de eficiência e propriedade”, explica. Luiz também destacou que é necessário um controle de gastos, mas que a economia flutua. “Você não vai ter solidez fiscal porque a economia deixa de crescer, se o denominador PIB cresce menos que o gasto público e que o endividamento do Estado, não haverá uma solução para o nível da dívida”, completou.
Dessa forma, Belluzzo defende que haja uma estabilização que seja anti-cíclicas, com o governo coordenando. “Tem um economista britânico chamado John Maynard Keynes que eu admiro muito, ele explicou que você precisa ter um orçamento de investimento que aponta para determinados momentos o quanto o Estado está disposto a colaborar. Por exemplo, se o setor privado está muito disposto a investir, você reduz a participação, mas se a economia perde força e desacelera, entrando em uma fase de desemprego, você tem que aumentar o gasto de investimento”, argumenta. O professor também falou que essa situação já ocorreu no Brasil no passado e foi replicada pela China.
Economia e energia
Ainda na entrevista, o economista defendeu que a Petrobras seja transformada em uma empresa de energia, já que este tipo de negócio é um fator fundamental para o desenvolvimentos das economias. “Não se pode deixar que a economia tenha choques de energia, fora que ainda vamos transitar da energia dos combustíveis fósseis para fontes renováveis. Isso vai ser obrigatório no mundo inteiro”, conta. O professor também salientou que o processo de mudança ainda pode significar uma oportunidade tecnológica. Por exemplo, caso o programa seja bem articulado, ele pode estimular o surgimento de empresas de painéis solares. Sendo que vários países estão adotando programas nacionais de produção dessa tecnologia.
O que é mais difícil: comandar a economia de um país ou um time de futebol?
Além de lecionar e trabalhar com a economia de um país, Luiz Gonzaga Belluzzo também foi presidente da Sociedade Esportiva Palmeiras entre os anos de 2009 e 2011. Segundo o professor, a função de gerenciar um clube é uma tarefa árdua. “Comandar um time de futebol é algo que eu não recomendo para ninguém porque a paixão acaba dificultando a razão. Eu sobrevivi”, relatou Belluzzo.
“Eu consegui, com a ajuda de muita gente, a construção da arena Allianz Parque. As pessoas me perguntavam se eu era o ‘pai do estádio’, mas eu não sou nada, sou eu sou companheiro das pessoas e foi assim que foi feito”, contou o ex-presidente do Palmeiras, ressaltando que sofreu muita oposição para tirar o projeto do papel. “As pessoas acham que o time é a paixão deles e a partir disso, eles têm o direito de se apropriar das coisas, não é essa a questão”, completou.
Por fim, Luiz ainda comparou as dificuldades entre gerir um clube esportivo e a economia do país. “Eu não vou dizer que é mais difícil. Mas, ser presidente de futebol talvez seja tão difícil quanto ser ministro da economia”, destacou o ex-diretor.