A Consulta à Comunidade Universitária da Universidade Federal de Goiás ocorre nos dias 8 e 9 de junho. O Jornal Opção solicitou para as duas chapas postulantes à administração da UFG no quadriênio 2022-2025 um texto em que expusessem suas ideias. Aqui está o artigo enviado pela Chapa 2, Movimenta UFG. Para conhecer as propostas da Chapa 1, UFG Viva!, clique aqui.

Para revitalizar, Movimenta UFG!

¹ Prof.ª Dr.ª Maria Clorinda Soares Fioravanti Candidata a Reitora
² Prof. Dr. Adriano Correia Silva Candidato a Vice-Reitor

A universidade pública, gratuita, laica, de qualidade, autônoma e inclusiva é um dos maiores patrimônios da sociedade brasileira. Como espaço de produção de conhecimento e de formação de pessoas, a universidade é constituída a partir da pluralidade dos saberes e da diversidade de perspectivas. Por esta razão, deve ser inclusiva e acolhedora, além de manter seu compromisso com a equidade e a justiça. A universidade será tanto mais rica quanto mais estiver aberta para todos os segmentos da sociedade, pois, assim, ampliará os horizontes dos problemas com os quais lidará e das soluções que será capaz de oferecer à sociedade.

Nós, da Chapa 2 – Movimenta UFG, Clorinda Fioravanti e Adriano Correia, além de docentes, pesquisadores e extensionistas, temos experiência na gestão da universidade e na representação de nossas áreas de conhecimento dentro e fora do País. Não somos gestores profissionais, mas nos apresentamos para esta tarefa a partir de nossa experiência acumulada. Como sabemos, a dedicação à administração é parte de nossas funções por que a vivência universitária, em sua plenitude, necessita de gestores competentes e comprometidos com o bem comum. No exercício da autonomia universitária é fundamental conhecer nossos problemas e potencialidades. A universidade precisa ser conduzida por aqueles que a vivenciam em suas diversas dimensões, em parceria estreita com a comunidade acadêmica, reconhecendo as fundamentais contribuições de estudantes, de servidoras e servidores técnico-administrativos em educação e docentes nos processos de tomada de decisão.

Prevista na Constituição Federal de 1988, a autonomia universitária é baseada nos seguintes princípios: o de que o conhecimento é mais diverso quando não é tutelado; o de que o intercâmbio entre as várias formas do conhecimento – teórico, prático, artístico, humanístico, produtivo, crítico, tecnológico – enriquece cada uma delas; o de que o conhecimento é mais abrangente quanto mais livre e plural for e, exatamente por isto, é socialmente mais relevante quando compartilhado de modo irrestrito.

Além da autonomia didático-científica, o Art. 207 da Constituição Federal estabelece que as universidades gozam de autonomia administrativa e de gestão financeira e patrimonial. Nestes aspectos, entendemos que a autonomia traz responsabilidades de grande impacto na função social da instituição e que as ações de gestão institucional devem ser integralmente permeadas pela transparência e pelo compartilhamento de informações.

A face mais importante da universidade pública brasileira é sua responsabilidade pela formação de pessoas bem qualificadas; basta acompanhar, nos últimos anos, o desempenho das instituições de ensino superior (IES) nos diversos sistemas de avaliação da educação superior brasileira. E, mais ainda, cabe à universidade o papel de principal produtora do conhecimento científico no Brasil. Ou seja, a promoção do desenvolvimento social e econômico do País depende, em grande medida, de nossa capacidade de buscar cada vez mais a excelência na formação das pessoas, na geração e transferência do conhecimento científico e na capacidade de garantir a apropriação desse pela sociedade, uma vez que o desenvolvimento de um país tem relação direta com a sua capacidade de geração autônoma do conhecimento.

Comprometemo-nos com uma universidade inclusiva, acolhedora, que busca a excelência acadêmica e de gestão, capaz de responder de forma contínua às demandas da sociedade. Comprometemo-nos, ainda, com uma gestão participativa e transparente que dialoga com a comunidade acadêmica para identificar, avaliar, decidir e estabelecer prioridades, considerando os diversos segmentos: estudantes, técnicos e docentes ativos e aposentados; e os câmpus Colemar Natal e Silva, Samambaia, Goiás e Aparecida de Goiânia, além de Firminópolis e Caldas Novas.

Neste momento a universidade brasileira, especialmente o sistema federal de ensino, passa por um momento extremamente difícil e delicado, por diferentes razões. Em primeiro lugar tem havido uma progressiva redução no orçamento, que tomou proporções catastróficas especialmente a partir de 2019, tornando extremamente difícil manter as universidades em funcionamento com um mínimo de qualidade.

“A UFG que queremos daqui a 50 anos será pública, gratuita, de qualidade, autônoma, democrática, inclusiva, acolhedora e estará em diálogo estreito com a sociedade, contribuindo para o aprimoramento das condições de vida dos cidadãos”

Essa redução no orçamento, por sua vez, possui dois componentes: um deles reflete a crise econômica que se iniciou ainda em 2014, abrangendo o orçamento para a educação e o contingenciamento dos recursos do Fundo Nacional para Ciência e Tecnologia (FNDCT); o outro componente, entretanto, tem dimensão política e está associado à falta de disposição do Ministério da Educação (MEC) em disputar o orçamento para a educação e a postura do governo federal como um todo, que apresenta uma orientação ideológica muito particular e claramente em oposição aos princípios que garantem a existência da universidade pública, gratuita, laica e de qualidade.

Em 2019 houve uma série de ataques e agressões à universidade pública como instituição por parte do próprio ministro da Educação da época, criando ou reforçando uma imagem bastante negativa das universidades federais para diversos setores da sociedade. Essa visão distorcida da universidade e da produção do conhecimento faz parte de uma série de políticas claramente anticientíficas e antieducacionais que vem sendo adotada pelo governo federal e se difundindo fortemente na sociedade, com implicações não só nas universidades, mas em todo o sistema nacional de ensino superior e de desenvolvimento científico e tecnológico, com grandes cortes de orçamento e desmontes estruturais no Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), na Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e na Financiadora de Estudos e Projetos (Finep).

A pandemia da Covid-19, que chegou ao Brasil no início de 2020, agravou muitos dos problemas, mas, ao mesmo tempo, mostrou a importância da universidade e de outros órgãos públicos no combate à pandemia em todo o Brasil. As universidades públicas (federais e estaduais), incluindo a Universidade Federal de Goiás (UFG), ganharam muita visibilidade à medida que sua comunidade (servidoras/es e estudantes) se envolvia em diversas ações de pesquisa e extensão a fim de mitigar os impactos da pandemia, atuando em conjunto com órgãos de saúde pública, gestores e tomadores de decisão.

Internamente, a pandemia forçou a adoção de formas alternativas de ensino e trabalho remoto, com muitas implicações e, certamente, alterando a rotina de toda a sociedade. Apesar de esse novo modelo de ensino e trabalho ter sido adotado de forma emergencial e de estar associado, psicológica e emocionalmente, a diversos problemas, não há dúvida de que há lições a serem aprendidas e utilizadas com o objetivo de melhorar a formação dos estudantes, a qualidade de vida das pessoas e ajudar na resolução de problemas sociais, em curto e médio prazo.

Será preciso muita discussão para entender todas as mudanças pelas quais passamos nos últimos meses, suas implicações e o que é possível aprender com elas. O cenário político e econômico nos próximos quatro anos ainda está incerto e, dependendo de uma série de fatores, precisaremos estar preparados para a possibilidade de que a crise se agrave ainda mais (embora devamos, claro, fazer o máximo para que a crise seja superada o quanto antes). Será preciso ter liderança e conhecimento técnico-científico e acadêmico, em um sentido amplo, para poder organizar e sintetizar pontos de vista alternativos e perspectivas múltiplas em relação ao ensino e ao trabalho na universidade nos próximos anos.

A UFG que queremos daqui a 50 anos será pública, gratuita, de qualidade, autônoma, democrática, inclusiva, acolhedora e estará em diálogo estreito com a sociedade, contribuindo para o aprimoramento das condições de vida dos cidadãos no que diz respeito à equidade e à justiça social, à cultura, à ciência, à arte e à diversidade.

O que queremos para a UFG do amanhã não é apenas responder as circunstâncias imediatas, mas atender às necessidades das pessoas, da vida, do mundo para daqui a 10, 15, 50 anos, alcançando as transformações sociais e culturais que almejamos. É necessário um olhar de vários horizontes de formação e especialização (Ciências Exatas e da Terra, Ciências Biológicas, Engenharias, Ciências da Saúde, Ciências Agrárias, Ciências Sociais Aplicadas, Ciências Humanas, Linguística, Letras e Artes) cuja reflexão transdisciplinar converge em algumas grandes questões fundamentais para se pensar a educação do futuro.

Nossa universidade terá definido e aprovado no Conselho Universitário (Consuni) seu plano diretor com as condições de infraestrutura e de logística que priorizem a realização das atividades acadêmicas, fundamentado na dupla integração, segundo o qual a integração interna da UFG é inseparável da integração à sociedade. Haverá administração integrada dos espaços e das edificações, contemplando uma visão de conjunto do patrimônio fundiário e edificado e do planejamento em longo prazo.

A UFG estará consolidada como “Universidade Internacionalizada”, que respeita o contexto local, que sabe o valor do autoconhecimento, que é capaz de definir indicadores, que utiliza os recursos com responsabilidade, que tem política linguística consolidada, que colabora com instituições estrangeiras, que promove o diálogo entre o mundo acadêmico e o empresarial e que conta com uma rede multidisciplinar de especialistas capazes de obter financiamento para impulsionar as pesquisas. Esta UFG albergará Centros de Estudos Regionais: Centro de Estudos Latino-Americanos, Centro de Estudos Africanos, Centro de Estudos Asiáticos, Centro de Estudos Europeus, e Centro de Estudos Norte-Americanos, institucionalizados, de caráter interdisciplinar e pluri unidade/órgão.

A UFG será reconhecida como “Universidade Intercultural”, que no contexto social e educativo latino-americano, designa um conjunto diverso e heterogêneo de modalidades de educação superior universitária que, diferenciando-se das universidades seculares tradicionais, reconhece, conserva e divulga o valor dos povos indígenas originários e afrodescendentes, promovendo a integração de seus saberes ao mundo acadêmico universitário.

A UFG estará materializada como “Universidade Promotora de Saúde”, por ter revisado seus próprios sistemas e processos, assumindo a responsabilidade de contribuir para a melhoria da saúde e do bem-estar, apresentado ambientes estratégicos para o desenvolvimento de ações de promoção da saúde, tanto pelas implicações da vida acadêmica, quanto pela capacidade de atuar junto a uma grande população, a qual, ao sair das instituições de ensino superior, pode contribuir para difusão da promoção da saúde em diversos espaços sociais.

A UFG será definida como “Universidade Sustentável”, lembrando que sustentabilidade envolve não só a questão ambiental, mas também social e econômica. É papel da universidade ser um agente de transformação. Os indicadores incluem aspectos da paisagem geográfica e da infraestrutura, uso da energia e mudanças climáticas, programas de reciclagem de redução de resíduos, programas de conservação e reuso de água; aspectos relacionados ao transporte; a proporção de cursos voltados à sustentabilidade em relação ao total de cursos, relação entre o orçamento destinado à pesquisa em sustentabilidade em relação ao total; publicações, eventos, relatórios, websites e organizações estudantis na área de sustentabilidade.

Na UFG do futuro a universidade e a indústria estarão colocalizadas e colaborarão em projetos para resolver os problemas do mundo real, funcionando como recinto de inovação que utiliza ativamente a pesquisa para mudar a realidade da sociedade, uma vez que a capacidade de geração autônoma do conhecimento é decisiva para garantir a soberania do País.

Comprometemo-nos com a defesa incondicional da universidade contra todo ataque que vise inviabilizá-la, diminuir sua importância ou violar sua autonomia, seja por caminhos privatistas (como o do programa Future-se) seja por intervenções autoritárias. Para estar à altura desse momento tão desafiador como o que vivemos, a UFG precisa arejar, criar novos canais de comunicação, garantir que a capacidade de ter novas ideias e formular propostas seja renovada. Deve, enfim, movimentar-se! Movimenta UFG!

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 ¹ Maria Clorinda Soares Fioravanti – “Fiz graduação em Medicina Veterinária na Universidade Federal de Goiás/UFG (1986), mestrado em Medicina Veterinária na Universidade Federal de Minas Gerais/UFMG (1992), doutorado em Clínica Veterinária na Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho/Unesp (1999) e pós-doutorado na Universidade de Córdoba, Espanha (2010). Sou professora titular da UFG, tendo iniciado a carreira docente em 1992. Desde 2000 oriento mestrado, doutorado e pós-doutorado no Programa de Pós-Graduação em Ciência Animal/ PPGCA/UFG. Fui coordenadora do PPGCA (2001 a 2002 e de 2007 a 2010), coordenadora de Pesquisa da UFG (2002 a 2005), primeira pró-reitora de Pesquisa e Inovação da UFG (2014 a 2017), presidente do Colégio de Pró-Reitores de Pesquisa, Pós-Graduação e Inovação das IFES/ Copropi/ Andifes (2016 a 2017), membro do Comitê Assessor de Medicina Veterinária do CNPq (2010 a 2014), membro fundadora do Colégio Brasileiro de Nefrologia e Urologia Veterinárias, membro fundadora e primeira presidente da Associação de Buiatria do Estado de Goiás e Distrito Federal (2011), presidente da Associação Brasileira de Buiatria (2009 a 2011) e da Associação Latinoamericana de Buiatria (2013 a 2017). Atualmente sou diretora da Escola de Veterinária e Zootecnia da UFG e vocal da Associação Latinoamericana de Buiatria. Sou bolsista de produtividade em pesquisa do CNPq desde 2002.”

² Adriano Correia Silva “Fiz graduação (1995) e mestrado (1998) em Filosofia na Pontifícia Universidade Católica de Campinas/PUCCAMP e mestrado em Educação (2001) e doutorado em Filosofia (2002) na Universidade Estadual de Campinas/Unicamp. Ingressei na Universidade Federal de Goiás/UFG em 2006 e atualmente sou Professor Associado IV. Fui coordenador do Programa de Pós-graduação em Filosofia da UFG (2009 a 2010), quando foi aberto o nível de doutorado, e diretor da Faculdade de Filosofia (2013 a 2017). Atuo como professor permanente nos programas de pós-graduação em Filosofia e em Artes da Cena da UFG. Realizei pós-doutorado em Teoria Política na Freie Universität, Berlin/ Alemanha (2011), com bolsa Capes/DAAD, em Ética e Filosofia Política na universidade The New School, Nova York/EUA (2017), com bolsa Capes, e atuei como professor e pesquisador visitante em várias universidades estrangeiras (Alemanha, Argentina, Colômbia, Espanha, EUA, Portugal). Fui presidente da Associação Nacional de Pós-Graduação em Filosofia (Anpof), que representa a área de filosofia no Brasil, por dois mandatos (2017-2020) e presentemente sou vice-presidente da Rede Iberoamericana de Filosofia (2018-2022) e diretor da Sociedade Interamericana de Filosofia (2019-2024). Atualmente, sou coordenador de internacionalização da Faculdade de Filosofia e do Programa de Pós-graduação em Filosofia da UFG. Sou bolsista de produtividade em pesquisa do CNPq desde 2010.”