Carlos Helbingen Júnior
Especial para o Jornal Opção

O Cerrado é o segundo maior bioma brasileiro e representa quase um quarto do território nacional. É a nossa savana, a mais rica em espécies de todo o planeta, contando com mais de 12 mil variedades de plantas e abrigando mais de 30% dos tipos de seres vivos identificados no País.

Além disso, nosso Cerrado é a nascente de oito importantes bacias hidrográficas, entre elas as do Araguaia, do Prata e do Tocantins, rendendo-lhe o apelido de “caixa d’água do Brasil”. No entanto, o imponente Cerrado está sob risco, pois essa caixa d’água está literalmente pegando fogo.

Antigamente, nas lavouras ou em pastos da área de Cerrado – mas não só –, costumava-se usar a técnica de queimadas para “renovar” a terra para o novo plantio. À época, não tínhamos a noção cultural de que essa prática causava danos ao meio ambiente. Além da prática humana, o próprio Cerrado já é um bioma que favorece o aparecimento de queimadas por causas naturais, no período de estiagem. Esses fatores, juntamente às práticas criminosas que em diversos momentos pudemos observar, têm gerado uma situação de extremo risco e de irreversibilidade na destruição do Cerrado.

Segundo dados recentes do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) de maio, o bioma registrou 96% mais queimadas que no mesmo mês em 2021. Obviamente, agricultores e pecuaristas já evoluíram muito em suas práticas e usam atualmente técnicas e tecnologias muito mais avançadas. Não podemos apontá-los mais como os maiores responsáveis pelas queimadas no Cerrado brasileiro. Seria inverter uma responsabilidade do Estado, mas que, no entanto, não tem conseguido sozinho cumprir seu papel de preservação ambiental, pela inexistência  de um programa do governo federal direcionado a preservação e combate a incêndio no bioma.

Lutamos ano após ano heroicamente para combater os milhares de incêndios que acontecem no nosso bioma, mas apenas o heroísmo não conseguirá preservar o Cerrado

Goiás possui 23 unidades de conservação estadual, como os da Serra Dourada, Terra Ronca, Pireneus, Parque das Emas e Chapada dos Veadeiros, entre muitos outros. Quando estive à frente da gestão do Corpo de Bombeiros, entre 2011 e 2018, criamos a Operação Cerrado Vivo, treinando e qualificando tropas especializadas e fazendo parcerias para o trabalho de preservação e combate aos incêndios.

Infelizmente, o Cerrado não tem recebido a atenção do governo federal, como acontece com outros biomas, como a Amazônia ou a Mata Atlântica. Sua conservação tem sido única e exclusivamente, exceto pelos parques federais, preocupação dos governos estadual e municipais, sem receber qualquer verba ou incentivo federal. 

É inacreditável que o segundo maior bioma brasileiro, que concentra cerca de 30% das espécies do País e de onde partem importantes bacias hidrográficas nacionais, como dissemos, não receba qualquer auxílio federal e incentivo aos programas de preservação ambiental.

Nós goianos, bombeiros militares e parceiros voluntários, lutamos ano após ano heroicamente para combater os milhares de incêndios que acontecem no nosso bioma, mas apenas o heroísmo não conseguirá preservar o Cerrado. Esse cenário poderia ser muito diferente se o programa Operação Cerrado Vivo recebesse incentivo, verba e recursos humanos repassados diretamente pelo governo federal. Essa luta é nossa e de toda a população goiana.

* Carlos Helbingen Júnior é coronel da reserva do Corpo de Bombeiros Militar de Goiás.