Vivendo de calotes, Igreja Mundial do Poder de Deus responde a 32 processos em Goiás

Vivendo a pior crise desde que foi fundada em 1998 pelo autointitulado apóstolo Valdemiro Santiago, em Sorocaba (SP), a Igreja Mundial do Poder de Deus (IMPD) é alvo de ao menos 32 ações relacionadas a imóveis, cobranças de aluguel e despejos, em Goiás. O levantamento exclusivo realizado pelo Tribunal de Justiça de Goiás (TJGO), a pedido do Jornal Opção, revela o retrocesso da denominação cristã evangélica neopentecostal internacional.

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Conforme o levantamento, a igreja responde a processos judiciais que correm na Justiça goiana desde 2016. Apenas em 2023, o TJ recebeu 12 processos movidos contra a IMPD, que possui templos espalhados por 218 dos 246 municípios goianos, de acordo com levantamento feito pela reportagem. Neste ano, já são cinco processos acumulados em seis meses.

Goiânia, que abriga seis dos templos religiosos, é responsável por deter quase metade dos processos judiciais, que correm em varas distintas, como a 18ª Vara Cível e Ambiental e 17ª Vara Cível e Ambiental. Há ainda processos tramitando nas comarcas de Petrolina de Goiás, Leopoldo de Bulhões, Aparecida de Goiânia, Anápolis, Sanclerlândia, Goianápolis, Trindade, Inhumas, São Luis de Montes Belos, Niquelândia e Novo Gama. 

A crise vivida pelos templos que compõem a IMPD não ocorre apenas em Goiás, mas em várias partes do país. No Estado de São Paulo, berço da denominação cristã, a igreja é alvo de ao menos 686 ações de cobrança, sendo que nove citam indícios de confusão de bens de Valdemiro e da igreja, que possui ramificações em 22 países dos quatro continentes.

O sigilo bancário de Valdemiro foi quebrado em 2021 para verificar se bens e recursos da igreja e do apóstolo se misturavam. A decisão foi assinada pela juíza paulista Mônica Di Stasi. 

Escândalos

Envolvido em escândalos de desvio de verbas, o fundador da denominação, Valdemiro Santiago, é conhecido pelos pedidos de doações milionárias e pelo estilo de vida luxuoso. Proprietário de imóveis, veículos e propriedades rurais de alto padrão, o apóstolo gastou R$ 12 milhões ao adquirir um avião particular do cantor Amado Batista em 2018. No mesmo ano, foi citado em um processo contra a igreja por falta de pagamento de impostos no valor de R$ 4.448,70, que tramita na 5ª Vara de Execução Fiscal Municipal de Goiânia.

Na última terça-feira, 2 de julho de 2024, o juiz André Reis Lacerda determinou a indisponibilidade de bens e valores da Igreja Mundial do Reino de Deus junto ao sistema conveniado SISBAJUD (sistema que interliga a Justiça ao Banco Central e às instituições financeiras) no processo que corre há seis anos.

Fortuna de Valdemiro e família 

O histórico dos processos analisados mostra que a crise se agravou em 2020, quando a igreja teve de fechar portas devido à pandemia. Mesmo assim, o salário líquido mensal de Valdemiro naquele ano foi de R$ 100 mil. Documentos anexados em processo que tramitam em São Paulo mostram que o apóstolo encerrou o primeiro ano da pandemia com patrimônio de R$ 21 milhões.

Uma lista de 2020 feita pelo Ministério Público Federal (MPF) coloca Valdemiro como proprietário de três lanchas (com os nomes de “Pregador”, “Arara” e “Franciléia”), uma escuna, uma moto aquática e três botes, entre outros bens. O pastor também possui bens em nome de suas empresas.

O avião de R$ 12 milhões, que pertenceu a Amado Batista, foi comprado pela Intertevê Serviços Ltda., da qual é sócio com a esposa, a bispa Franciléia de Oliveira. Valdemiro também já foi ou é proprietário ou sócio de seis empresas, mais quatro filiais.

A ligação é direta, com o pastor sendo representante legal, ou indireta, nos casos em que uma de suas empresas faz parte da sociedade. Figuram nas sociedades sua esposa e uma de suas filhas, Raquel Santiago. As empresas atuam em produção televisiva e musical, táxi aéreo e locação de aeronaves. Todas estão ativas, menos a de táxi aéreo, com status de “inapta” na Receita Federal por ter alguma irregularidade pendente.

Uma filial está registrada como fazenda de criação de gado em Mato Grosso. Foi comprada em 2011 por R$ 30 milhões (cerca de R$ 72 milhões corrigidos), segundo o MPF. Valdemiro também faz dinheiro com os vídeos em seu canal no YouTube, Apóstolo Valdemiro Oficial, criado em 2015.

Com 1 milhão de inscritos, seus 1.200 vídeos publicados receberam quase 56 milhões de visualizações. Segundo o site SocialBlade, que analisa mídias sociais, ele poderia receber até R$ 100 mil por ano monetizando o canal. À Justiça a defesa de Valdemiro afirma que todos os valores recebidos da Mundial se referem à “prebenda” (salário de pastores e padres pela atividade religiosa), além de direitos autorais por seus livros, CDs e DVDs.