O ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), solicitou mais tempo para analisar a ação que pode ampliar o foro especial para parlamentares e outras autoridades, na sexta-feira, 29. Antes da suspensão, cinco ministros votaram a favor da mudança, ou seja, falta apenas um voto para que uma maioria seja formada.

O ministro Gilmar Mendes, relator do processo, votou para que o foro por prerrogativa de função seja mantido mesmo após o fim do mandato parlamentar, independente da causa: renúncia, não reeleição ou cassação. A perda do direito só deve ocorrer se o crime tiver sido cometido antes do mandato.

Os ministros Cristiano Zanin, Alexandre de Moraes, Dias Toffoli e Flávio Dino acompanharam integralmente Gilmar Mendes. Ainda precisam votar os ministros André Mendonça, Nunes Marques, Luiz Fux, Cármen Lúcia e Edson Fachin.

A ação parte do Habeas Corpus 232.627, impetrado pelo senador Zequinha Marinho (Podemos-PA), acusado do crime de “rachadinha” quando era deputado federal, entre 2007 e 2015. De acordo com as investigações, ele teria exigido que servidores de seu gabinete depositassem mensalmente 5% de seus salários nas contas do partido, sob pena de exoneração.

Marinho afirma que, como ocupou, sem interrupção, os cargos de deputado federal (2007/2011 e 2011/2015), vice-governador do Pará (2015/2018) e senador (2019/2027), o STF é a instância competente para julgar a ação penal, sobretudo porque os crimes teriam sido praticados durante o exercício do cargo público e em razão dele.

Desde 2018, o entendimento do STF é que o foro privilegiado é válido apenas para crimes cometidos durante o mandato parlamentar vigente, sem relação com os cargos seguintes, ainda que sejam do âmbito da administração pública.

Decisão de 2018

Em 2018, o plenário do Supremo restringiu o foro privilegiado. Ficou definido que só devem ser investigados na Corte crimes praticados durante o mandato e relacionados ao exercício do cargo. Com isso, passou a valer o entendimento de que devem ser enviados para a primeira instância da Justiça todos os processos criminais que se refiram a crimes cometidos antes do cargo ou os cometidos no cargo, mas que não tenham relação com a função.

Quando o parlamentar deixa a função, os ministros repassam os casos para outra instância. Só ficam no Supremo as ações em estágio avançado, aquelas em que o réu já foi intimado para apresentar a sua defesa final. Antes, inquéritos ou ações penais que envolviam parlamentares eram repassados ao STF, mesmo que tratassem de fatos anteriores ao mandato.

Como votaram os ministros

O magistrado defende que a saída do cargo somente altera a competência em casos de crimes praticados antes da investidura no cargo ou, ainda, dos que não possuam relação com o seu exercício. “A compreensão anterior, que assegurava o foro privativo mesmo após o afastamento do cargo, era mais fiel ao objetivo de preservar a capacidade de decisão do seu ocupante. Essa orientação deve ser resgatada”, destacou.

“A prerrogativa de foro para julgamento de crimes praticados no cargo e em razão das funções subsiste mesmo após o afastamento do cargo, ainda que o inquérito ou a ação penal sejam iniciados depois de cessado seu exercício”, concluiu. Em seu voto, o ministro Gilmar Mendes também disse que o foro é uma prerrogativa do cargo e não um privilégio pessoal.

Ressaltou ainda que, justamente por isso, deve permanecer mesmo com o fim do mandato.“A saída do cargo não ofusca as razões que fomentaram a outorga de competência originária aos Tribunais. O que ocorre é justamente o contrário. É nesse instante que adversários do ex-titular da posição política possuem mais condições de exercer influências em seu desfavor, e a prerrogativa de foro se torna mais necessária para evitar perseguições e maledicências”, afirmou.

Na avaliação do ministro, acompanhada por seus colegas, essa justificativa é ainda mais adequada no contexto atual. “Numa sociedade altamente polarizada, marcada pela radicalização dos grupos políticos e pelo revanchismo de parte a parte, a prerrogativa de foro se torna ainda mais fundamental para a estabilidade das instituições democráticas”, afirmou.

Ao acompanhar o voto de Gilmar Mendes, o ministro Cristiano Zanin disse ser necessário reforçar “que as prerrogativas instituídas em benefício das instituições públicas se consolidaram por imposição constitucional, e não por capricho de um ou outro aplicador da lei que, por deliberação autônoma e volitiva, optou por assimilar jurisdições especiais”.

“A perpetuação da jurisdição para o julgamento de crimes praticados no exercício do cargo e vinculados às funções desempenhadas estabiliza o foro próprio e previne manipulações e manobras passíveis de acontecer por ato voluntário do agente público”, afirmou Zanin.

O ministro Flávio Dino acompanhou o voto de Gilmar Mendes e o complementou estabelecendo que “a prerrogativa de foro para julgamento de crimes praticados no cargo e em razão das funções subsiste mesmo após o afastamento do cargo, ainda que o inquérito ou a ação penal sejam iniciados depois de cessado seu exercício”.

Dino também acrescentou a tese de que “em qualquer hipótese de foro por prerrogativa de função, não haverá alteração de competência com a investidura em outro cargo público, ou a sua perda, prevalecendo o foro cabível no momento da instauração da investigação pelo Tribunal competente”.

Ao antecipar seu voto após o pedido de vista de Barroso, o ministro Alexandre de Moraes afirmou que depois de quase sete anos da definição das regras do foro pelo STF não foi possível constatar resultado prático pretendido, “não se verificando uma maior celeridade nos processos e julgamentos dos feitos declinados pelo Supremo Tribunal Federal às outras instâncias”.

“Outra importante questão é exatamente a tratada nos presentes autos, ou seja, a necessidade de manutenção da prerrogativa de foro nas hipóteses da infração penal ter sido praticada no exercício do mandato e em razão de suas funções, mesmo após o término dos mandatos”, afirmou.“Dessa forma, acompanho o Min. Gilmar Mendes no sentido de estabelecer um critério focado na natureza do fato criminoso, e não em elementos que podem ser manobrados pelo acusado (permanência no cargo)”, concluiu Moraes.