Em 13 de outubro, o Jornal Opção publicou uma entrevista com Aava Santiago (PSDB) em que a vereadora afirmou: “Em Goiânia, qualquer roda de samba que você faça na calçada vai ter abordagem hostil. Qualquer ação cultural terá hostilidade da Agência Municipal do Meio Ambiente (Amma) ou Guarda Civil Metropolitana (GCM).” 

Não foi sempre assim. Aava, que é jovem, se lembra de um tempo em que o Centro da capital era movimentado pelo jazz no Cine Goiânia Ouro e chorinho no Grande Hotel. Desde a pandemia de Covid-19, entretanto, muitos locais públicos e privados destinados a manter programas culturais semanais nunca reabriram. Mesmo os centros culturais que permanecem ativos têm baixa frequência — o Goiânia Ouro hoje programação mensal e o último chorinho no Grande Hotel aconteceu em abril. Para formar plateia, é necessário frequência.

O ímpeto é colocar a culpa pela morte cultural do Centro de Goiânia na falta de financiamento do poder público — mas a situação é mais complexa. Em todo o mundo, a forma dos mais jovens consumirem cultura mudou (especialmente música ao vivo). Dados do Google revelam o padrão de consumo das diferentes gerações: os mais jovens são mais dispostos a frequentar grandes eventos de música; mas estão muito menos dispostos a gastar dinheiro em ingressos para eventos menores. 

A explicação é óbvia: hoje, a música é gratuita. Diferentemente das gerações anteriores, aqueles que nasceram nos últimos 30 anos não precisaram comprar LPs, CDs, DVDs — eles conseguem ter acesso a toda música que quiserem ouvir pelo preço de uma assinatura de serviço de streaming. Isso não significa que os jovens não gostem de música; muito pelo contrário: o segmento sempre foi, e permanece sendo, o maior consumidor de música e mostras culturais. O argumento da indisposição em comprar ingressos cotidianamente apenas reforça a necessidade de oferecer atividades culturais públicas ou a preços muito baixos.

Porem, a isso, somam-se outros fatores que podem, sim, ser abordados pelo poder público. O principal fator que afasta os frequentadores do Centro de Goiânia é a sensação de insegurança. A Capital é hoje uma cidade muito mais segura do que já foi no passado, mas a má iluminação de ruas desertas e até mesmo a presença do viaturas policiais podem comunicar ao o frequentador do Centro a ideia de perigo. É a isso que a vereadora Aava Santiago se refere quando afirma que há uma distorção do direito à cidade pela juventude.

Aparentemente, Goiânia sugere que nos espaços públicos se deve fazer silêncio sob pena de ‘abordagem hostil’, e que eventos culturais são reservados à esfera privada. Aí, há ainda outra sugestão: a de que os mais ricos têm mais garantidos seu direito ao entretenimento, e a perda da comunhão característica da cultura. Se você, leitor, já frequentou o Choro do Grande Hotel, se lembra de que a qualidade musical era suficiente para unir na Avenida Goiás gente de todas as classes e idades.

O plano diretor vigente em Goiânia, aprovado em 2022, trouxe diretrizes para garantir a requalificação do Centro, com fortalecimento da verticalização da região. O adensamento da região pode ser benéfico, ao povoar o bairro e extinguir a sensação de abandono, mas a execução pode ser catastrófica se o próximo prefeito não tomar escolhas conscientes para implementar o plano sem descaracterizar o setor ou resistir a interesses privados.