Na terra do sertanejo, rapper BNegão toca “para tirar a galera do sufoco”

14 agosto 2014 às 14h29

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Ex-companheiro de Marcelo D2 no Planet Hemp vem à capital para discotecar na Diablo Pub, na noite desta quinta-feira

O músico carioca Bernardo Santos, o BNegão, chega a Goiânia nesta quinta-feira (14/8) para discotecar suas preferências musicais no BNegão Bota Som, na Região Central de Goiânia. Por telefone, o Jornal Opção Online conversou com o artista sobre o projeto, que já rodou o Brasil (e é cotado para ir ao exterior), a produção do novo disco do Seletores de Frequência, política, como é tocar na capital do gospel e do sertanejo e a legalização da maconha.
O cantor atua como uma emissora de rádio: toca e fala sobre produções e novos álbuns que estão acontecendo e o agradam, mas sofrem com a falta de espaço nos meios tradicionais. Ao longo da apresentação — que será iniciada a partir das 3h — BNegão vai conversando com o público.
O lance é manter a pista movimentada: pensar e dançar ao som de clássicos e músicas que rodam fora do eixo, ou que ainda não foram lançadas no circuito. A discotecagem vai durar cerca de 1h30. Artistas como Sacal, Russo Passapusso, Anelis Assumpção, Dona Odete e muito punk rock estão no setlist. Como critério, escolheu canções que o influencioaram lírica e musicalmente.
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Questionado sobre como é tocar músicas alternativas na capital do sertanejo e do gospel, o rapper disse que é importante se apresentar em qualquer lugar. “Você dá a opção, sacou? Se só tem esse tipo de som e você chega com outra coisa, sempre tem gente sufocada e esmagada com aquilo. É treta”, contextualizou. Ele disse que nasceu ouvindo música sertaneja de raiz, mas lamenta que a nomenclatura esteja servindo para definir os atuais nomes dessa classe musical. Para o carioca, é mais fácil vê-los como “representantes do country brasileiro”. “Me amarro em Pena Branca e Xavantinho, e Rolando Boldrin. Mas [as pessoas] nem consideram mais isso, parece ser coisa de velho”, relembrou.
Falando da capital como sendo um local pródigo para ter “mulheres maravilhosas”, BNegão disse que sua passagem será rápida por conta da agenda de shows (veja abaixo). Mas essa não é a primeira vez que o artista vem a Goiânia. E, pelo jeito, não será a última, pois tem várias amizades na cidade. Inclusive foi informado sobre o pequi, fruto que não experimentou com dedicação, até o momento.
“Queria ir mais do que vou aí, na verdade. Então, vou de novo”, relatou, complementando que o que mais o atrai na capital de Goiás é a “galera gente boa que cola junto nos shows”. Em junho, o cantor passou por aqui com um projeto paralelo, o BNegão Trio, lançando o CD “Pronto como um macaco para ser lançado ao espaço”, no Martim Cererê. É um dos espaços que ele mais gosta de fazer shows no Brasil.
Novo disco
O artista informou à reportagem que seu principal projeto, o BNegão e os Seletores de Frequência, no qual é vocal, já trabalha em um disco exclusivamente instrumental, para ser lançado neste ano. “Estamos tocando direto e fazendo a pré-produção. Metendo broca”, brincou.
O grupo tocou no Mimo de 2013, festival dedicado ao gênero e que passa por diferentes estados do País. O evento os influenciou na decisão de fazer o novo projeto. “Sempre tocamos músicas instrumentais. Normalmente, a galera do rap gosta de falar demais. Eu gosto de ouvir a vera, também. Acho importante para valorizar os Seletores, pois acham que a banda me acompanha, mas na verdade sou vocalista”, explicou.

Ainda fazem parte do grupo Pedro Selector (trompete e voz), Fábio Kalunga (baixo), Robson Riva (bateria e voz) e Fabiano Moreno (guitarra e voz). “Enxugando Gelo”, de 2003, e “Sintoniza Lá”, de 2012, são os dois álbuns da banda. O último ganhou o Video Music Brasil (VMB) há dois anos, na categoria Melhor Disco do ano.
Foi o próprio BNegão quem produziu o disco de 11 faixas, que combinam o conceito de black music universal junto a uma explosiva mistura sonora, com ritmos jamaicanos, africanos e brasileiros. Tudo isso se funde ao rap, ao funk de 1970 e ao hardcore, resultando em um conjunto vigoroso de som. A maior parte das composições e dos arranjos são dele, em parceria com os outros integrantes.
Nos 11 anos de diferença entre os lançamentos, o que mais evoluiu esteticamente no som dos Seletores de Frequência foi a batida africana, que ficou mais acelerada. Isso se deu após a entrada do Robson Riva em 2006. “Fez toda a diferença e contribuiu bastante”, analisou.
Ex-integrante do Planet Hemp, o artista multiversátil afirmou que os motivos que o levaram a tocar na polêmica banda da década de 1990 são os mesmos que o levaram a tocar no Seletores de Frequência. BNegão dividiu palco com Marcelo D2, Black Alien, Rafael Crespo, Daniel Ganjaman e outros, como Pedro Garcia, que atualmente toca com ele. “Gostar de rap, rock, hardcore, dancehall e várias coisas que me levaram a tocar no Planet Hemp, me influenciou no Seletores. E isso continua comigo, eu já tinha antes.”
Como diz a primeira estrofe da canção Alteração (Éa!), de Sintoniza Lá, o importante é manter a espinha ereta e a cabeça no lugar, na medida do possível, na sintonia certa.
O que nunca sai da playlist? O próprio Sacal e BaianaSystem, grupo antes liderado por Russo Passapusso. Semanalmente, escuta Ramones, Dorival Caymmi e João Gilberto. “São paradas que eu ouço loucamente.” BNegão volta a citar Anelis Assumpção, filha de Itamar Assumpção, que lançou “Amigos Imaginários” recentemente.
Toques
Ao longo das 23 faixas produzidas, BNegão e Os Seletores de Frequência repassam vários “toques” para o ouvinte, inclusive no campo político. BNegão não concorda com o processo de escolha eleitoral, principalmente com o voto obrigatório. “É preciso ver o que está acontecendo. Não sou a favor de um cara chegar e falar ‘votem ou não votem’… Essa parada eu acho triste, na verdade”, reclamou, emendando uma extensa risada.
Na opinião dele, é preciso pensar e analisar mais em época de muitas informações na internet. Essas atitudes ficaram perdidas no passado, na análise do cantor. “O tipo de música que a gente faz é justamente para tentar aprofundar o debate”, alertou.
Legalização
“Legalize Já” foi um dos hits de “Usuário”, primeiro e mais polêmico álbum do Planet Hemp, lançado em março de 1995. O videoclipe sofreu censuras e um dos motes das músicas era a legalização da maconha, questões econômico-sociais e a atuação da polícia. Após show em Brasília, em 1997, os integrantes da banda ficaram presos por quatro dias acusados de apologia às drogas. Além da detenção, o juiz Vilmar José Barreto Pinheiro proibiu shows e a venda de ingressos, fitas e CDs da banda no Distrito Federal.
Para BNegão, as discussões a respeito do entorpecente evoluíram. “Antes, era impensável. Era só fazer a música e já era preso. Agora, a parada está sendo discutida na esfera política e de maneira mais profunda. Não só no Brasil”, comentou, apontando o caso do Uruguai. Lá, o presidente José Mujica assinou decreto legalizando a produção, a comercialização e a distribuição da droga, tornando-se o único país na América Latina a autorizar o negócio.
A questão, de acordo com o artista, está mais forte do que nunca e saiu do plano do “eu vou fumar” ou “eu quero fumar”. A conversa é profunda e vai do âmbito social, econômico, político, de segurança pública ao da saúde. Agora, para o rapper, as pessoas perceberam que é um assunto importante, caiu a ficha. “Não é a coisa do maluco que quer fumar, do maconheiro maluco apenas. Vai além disso.”
O compositor destacou alguns casos em que a Justiça autorizou a utilização do canabidiol, substância derivada da maconha. Em março passado, o juiz Bruno César Bandeira Apolinário, da 3ª Vara Federal do Distrito Federal permitiu que uma mãe importasse um remédio com o derivado. A venda do medicamento não é permitida no Brasil, e era importado ilegalmente por Katiele Fischer para tratar crises convulsivas da filha, de 5 anos. A decisão veio menos de uma semana após o lançamento de uma campanha na internet que ajudou a divulgar o caso.
“Vejo meu filho caindo, tenho vários remédios e não posso usar, por exemplo. As doses reduzem muito os ataques epiléticos, o que beneficia a coordenação motora da criança”, exemplificou BNegão.
Na última segunda-feira (11), o senador Cristovam Buarque (PDT-DF) garantiu que não vai recomendar o arquivamento da sugestão popular que prevê a legalização da planta em terras brasileiras. O texto propõe a regulamentação do uso recreativo, medicinal e industrial da cannabis sativa, e está em discussão na Comissão de Direitos Humanos (CDH) do Senado.
Serviço: BNegão Bota Som @ Festa Move Your Feet
Local: Diablo Pub – Rua 91, nº 632, Setor Sul
Horário: 22h
Ingressos: R$ 25 (sujeito à alteração para R$ 30, dependendo da lotação da casa)
Agenda de shows:
– 21/8 – BNegão Trio – Festa Beat Crew – Clash Club (São Paulo/SP)
– 23/8 – BNegão & Seletores de Frequência – Taguatinga/DF
– 24/8 – BNegão & Seletores de Frequência – Riacho Fundo/DF