O retorno de Dunga e a crônica da morte anunciada do futebol brasileiro
22 julho 2014 às 12h50
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Se os entes de concreto exalassem uma espécie de “cheiro moral”, o prédio da CBF teria uma fragrância híbrida, entre as de mofo e esgoto a céu aberto
Dunga de volta à seleção. Torci até o momento final para ser uma pegadinha, mas não era. E é a prova definitiva de o futebol brasileiro está mesmo morrendo. Como a seleção brasileira. Hoje existe o futebol da CBF, que leva à existência de uma seleção da CBF — motivo que levou muito amante do esporte e do próprio País a torcer contra ou ficar neutro, por entender que quem estava de amarelo não representava uma Nação e seus valores, mas uma entidade privada e lucrativa.
A Confederação Brasileira de Futebol não tem o mínimo interesse em fazer algo pelo futebol em si, como prática esportivo-cultural. Para quem manda por lá, tudo é negócio e nada mais. E assim, de vexames menores a um 7 a 1 em Copa, vão destruindo a imagem mítica construída de Leônidas a Neymar, passando por Pelé, Garrincha, Rivelino, Zico, Romário, Ronaldo e tantos outros. Como são dirigentes sem escrúpulos e ávidos por negócios imediatistas, não têm nenhum pudor em condenar à morte lenta a galinha dos ovos de ouro. Eles não estarão mais lá quando tudo acabar de fato.
Dunga não é o culpado principal por estar lá, obviamente. Ele é apenas um treinador comum, gritador e que cai bem na figura de “inocente útil”. Talvez ele tenha a culpa de ter aceitado o convite, apenas, sem conter a vaidade e, assim, abrir espaço a outro que tivesse aptidão ao cargo. Mas isso não adiantaria muita coisa: não é preciso ter aptidão ao cargo — o que é provado pelo retorno de Dunga —, mas sim, aptidão, ao jogo arcaico da CBF. Por isso é que desde 2001, só passaram gente de “confiança” dos manda-chuvas (Luiz Felipe Scolari, Carlos Alberto Parreira, Dunga, se alternando).
Se os entes de concreto exalassem uma espécie de “cheiro moral”, o prédio da CBF teria uma fragrância híbrida, entre as de mofo e esgoto a céu aberto. É uma casa de escândalos, de decadência moral e de pensamentos totalmente ultrapassados. Não dá para a maioria dos seres com alguma ética positiva ficarem lá por muito tempo. Se alguns treinadores ficaram, foi por subserviência a interesses escusos.
Boa parte dos torcedores sonhou agora com a vinda de um técnico estrangeiro, já que nossos profissionais teimam em não se reciclar. Doce ilusão. Mas, imaginem um Pep Guardiola deixando o campeoníssimo Bayern de Munique, da profissionalíssima Bundesliga (o Campeonato Alemão), para cuidar da patética seleção da caquética CBF. Imaginem José Mourinho, outro estrangeiro tão citado. Ou mesmo um argentino, como José Pékerman ou Jorge Sampaoli, que respectivamente treinaram Colômbia e Chile na Copa do Mundo.
É preciso mesmo que seja um brasileiro para ser contratado pela CBF. Mas isso não basta: precisa ser um brasileiro conivente com todos os desmandos que lá imperam.