Na UFG, 45,7% dos estudantes de Medicina e 31,7% de Direito são pobres
29 maio 2022 às 08h08
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Índice de acadêmicos vulneráveis chega a 44,3% nos 10 cursos mais concorridos. No geral, 75,5% dos estudantes são pobres, taxa acima da média nacional
Nos últimos dias, o meio acadêmico público brasileiro se vê ameaçado com a possibilidade de aprovação da Proposta e Emenda à Constituição (PEC) 206, que estipula o pagamento de mensalidades em universidades públicas. Em Goiás, segundo a V Pesquisa do Perfil Socioeconômico e Cultural dos Estudantes de Graduação, realizada em 2018 com os estudantes da Universidade Federal de Goiás (UFG), foi constatado que até mesmo entre os 10 cursos mais concorridos da instituição, quase 50% dos discentes se mantém na faculdade com bolsas estudantis que só podem ser destinadas àqueles que tem renda familiar bruta per capita menor que meio salário mínimo. É importante ressaltar que essa pesquisa foi realizada antes da pandemia da Covid-19. Após o coronavírus, a realidade social de brasileiros piorou com a perda de emprego e aumento da inflação.
O curso de Medicina, o mais concorrido da UFG possui 45,7% dos estudantes atendidos pela Assistência Estudantil. Direito abrange 31,7%; Odontologia, 68,1%; Psicologia, 29,5%; Arquitetura e Urbanismo, 53,6%; Engenharias: Civil, 44,3%; Mecânica, 68,5%; Veterinária, 41%; Ciências da Computação, 37,7% e Agronomia 46,9%. No total, 42,83% desses estudantes recebem algum auxílio da instituição e sobrevivem com uma renda familiar bruta per capita de até meio salário mínimo.
Segundo a reitora da UFG, professora Angelita Lima, a proposta quebra o princípio da gratuidade do ensino público e também o da universalidade, visto que a instituição possui o tripé de ensino, pesquisa e extensão. “Ela exclui essa universalidade, essa condição, e mais, ignora que a maior parte da produção científica, do conhecimento feita no Brasil, é produzida nas universidades públicas. Então isso interfere profundamente nesse sistema de universidades”, disse ao Jornal Opção.
Os defensores da proposta pautam o debate sob o argumento de que “só paga quem pode”, como o próprio relator da proposta afirma. Com quase 75% dos estudantes oriundos de famílias que sobrevivem com até 1,5 salário mínimo, a reitora pontua que, caso aprovada a PEC, isso produziria uma segregação nas instituições. “Estudantes que estão sendo apontados como que podem pagar, são filhos da classe média, são trabalhadores. Em geral, a classe média será profundamente afetada por isso, e os riscos que podem pagar de fato, não estudam nas escolas brasileiras, eles estudam nas escolas estrangeiras”.
A dificuldade financeira se faz presente também ao ápice da vida estudantil, sendo o principal motivo para que os discentes pensem em trancar o curso. Segundo o levantamento, os principais motivos para o abandono acadêmico são: trabalho, saúde, insatisfação com o curso e financeiro, o qual também está veiculado ao primeiro, haja vista que a realidade é vivida na tentativa de conciliar os estudos e emprego.
Essa dificuldade de conciliação de trabalho e estudo é vivida por quase 15% dos estudantes da universidade. Outros 30% afirmam que as dificuldades financeiras refletem também no desempenho acadêmico. Em sua maioria, a UFG é composta por estudantes oriundos de escolas públicos, representando um total de 63,10%.
Políticos goianos vão contra a proposta
Alguns políticos goianos já se posicionaram contra a PEC 206, como é o caso do senador Jorge Kajuru (Podemos). Segundo o parlamentar, a proposta pode ser resumida em “estupidez”. “A única coisa que o governo Bolsonaro não quer no Brasil é uma universidade pública. Isso é demais. Isso merece vaia em um Maracanã lotado”.
Deputados federais da base bolsonarista, como Dr. Zacharias Calil (União Brasil) e João Campos (Republicanos) também são contrários a PEC. “Sou fruto do ensino e do serviço público. Jamais apoiaria um projeto que prevê esse tipo de cobrança de algo que é consagrado em nosso país. Universidade pública gratuita é direito e não vamos deixar isso acabar”, afirma o deputado Calil.
Para o deputado João Campos, a triagem promovida pela própria universidade para definir quem tem condições de pagar é insegura. “Estabelecer que a própria instituição fará triagem para saber qual é o aluno que em razão de sua condição econômica deve pagar a mensalidade na universidade pública é algo muito inseguro e isso vai terminar fazendo com que todos paguem. Até em função do orçamento das universidades estarem muito defasado, há uma carência muito grande em recursos nas universidades públicas”, justifica.