Após morte de mais de 200 cavalos, Justiça autoriza retomada das atividades de fábrica de rações

09 julho 2025 às 16h55

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A Justiça Federal em Itumbiara autorizou, de forma parcial, a retomada das atividades da empresa Nutrattà Nutrição Animal Ltda., especializada na produção de rações. A decisão, assinada pelo juiz federal Francisco Vieira Neto, permite a fabricação e comercialização de todos os produtos da empresa, exceto os destinados à alimentação de equinos, que seguem suspensos por determinação do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa).
A medida cautelar que paralisou integralmente a operação da fábrica foi aplicada em 4 de junho, após relatos de morte de mais de 200 cavalos em diversos estados brasileiros, supostamente ligados ao consumo de rações da linha Foragge Horse, produzida pela empresa. No entanto, o magistrado considerou desproporcional a suspensão total das atividades, especialmente diante da ausência de provas técnicas que relacionem as outras linhas de produção ao surto sanitário.
De acordo com a decisão, a empresa reconheceu, durante fiscalização, a possível presença de monensina – substância tóxica para equinos – em produtos destinados a esses animais. No entanto, apresentou laudos técnicos que atestam a conformidade das rações para bovinos e outros ruminantes. O juiz destacou ainda os prejuízos econômicos e sociais provocados pela paralisação total da empresa, que emprega 66 trabalhadores de forma direta.
“Pelo princípio da eficiência e da viabilidade econômica, e sem prejuízo do controle fiscalizatório do órgão de produção animal, torna-se imperioso acolher o pleito liminar”, afirmou o juiz Francisco Vieira Neto na decisão.
O magistrado também reconheceu falhas sanitárias e administrativas constatadas durante as fiscalizações, como higiene precária nas instalações e falhas nos programas de autocontrole e de recolhimento de produtos. Contudo, ponderou que tais irregularidades não atingem, no momento, a totalidade dos produtos fabricados pela empresa.
O advogado da empresa, Diego Menezes Vilela, afirmou que a decisão representa uma vitória para o setor agroindustrial. “Evita-se um prejuízo irreparável à empresa, que atua regularmente no mercado e emprega dezenas de trabalhadores na região”, afirmou.
A liminar determina que o Mapa autorize a retomada imediata das atividades da empresa referentes aos produtos que não sejam destinados a equinos. A suspensão para essa linha específica, no entanto, permanece em vigor até que as irregularidades sejam sanadas.
Mais de 200 animais morreram
A paralisação das atividades da Nutrattà Nutrição Animal Ltda. teve origem em uma grave crise sanitária iniciada no final de maio deste ano, quando o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) começou a receber relatos de mortes de equinos em diferentes estados. Até o momento, são 222 cavalos mortos após a ingestão das reações produzidas pela empresa.
As primeiras notificações surgiram no interior de São Paulo, mas logo se espalharam por estados como Rio de Janeiro, Minas Gerais, Alagoas e Goiás. Segundo o Mapa, todos os animais afetados haviam consumido produtos da linha equina da Nutrattà, como as rações Foragge Horse, Foragge Horse Energy, Foragge Horse AHS e Nutramix NMX. Em todos os casos, animais que não ingeriram os produtos, ainda que no mesmo ambiente, não apresentaram sintomas.
O Mapa, então, determinou a suspensão cautelar da comercialização das rações para equinos produzidas a partir de março. No entanto, diante de falhas operacionais constatadas durante fiscalização, como higiene precária, ineficiência no controle de qualidade e risco de contaminação cruzada, a pasta ampliou a medida e impôs, em 4 de junho, a suspensão total das atividades da empresa.
Durante a investigação, a própria empresa admitiu à fiscalização a possibilidade de que os produtos equinos tenham sido contaminados com monensina — substância comum em rações para ruminantes, mas letal para cavalos. Mesmo assim, a empresa alegou que a suspensão integral foi desproporcional, já que não havia indícios de problemas nas rações destinadas a outras espécies.
Entidades lamentam perdas
A ABCCMM (Associação Brasileira dos Criadores do Cavalo Mangalarga Marchador) afirmou, em nota, que tem recebido relatos de perdas significativas entre seus associados e classificou o impacto como “incalculável, não apenas do ponto de vista econômico, mas também genético e emocional para criadores, funcionários e familiares”.
A entidade recomendou a suspensão imediata do uso da ração suspeita e orientou que os criadores notifiquem o Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa), os conselhos regionais de medicina veterinária e os serviços estaduais de defesa sanitária animal. A associação também oficiou o Ministério Público, pedindo rigor na apuração e responsabilização dos envolvidos.
O CRMV-SP (Conselho Regional de Medicina Veterinária de São Paulo) alertou que intoxicações desse tipo podem provocar desde degeneração hepática reversível até necrose irreversível das células do fígado, com consequências como insuficiência hepática aguda ou crônica. Segundo o órgão, os sintomas surgem rapidamente, incluindo sinais neurológicos como icterícia, cólicas, falta de coordenação motora, espasmos musculares, arritmias cardíacas, insuficiência renal, diarreia, perda de apetite e de peso. Em muitos casos, a evolução é rápida e fatal.
A origem da contaminação ainda é desconhecida, e a expectativa é de que os primeiros laudos laboratoriais sejam divulgados nos próximos dias. A ração suspeita foi distribuída em diferentes regiões do país, o que aumenta a preocupação entre criadores e autoridades sanitárias.
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