Na região Metropolitana de Goiânia, formada por 20 municípios, a possibilidade de uma gestão integrada se torna cada vez mais necessária diante dos desafios comuns que afetam as cidades. A medida foi ventilada pelo prefeito eleito da Capital, Sandro Mabel (UB), logo após vencer o pleito, mas a estratégia já vinha sendo levantada desde as eleições. Com uma vitória consolidada dos prefeitos da base do governador Ronaldo Caiado (UB) no entorno de Goiânia, essa possibilidade fica cada vez mais clara, e é defendida pela maioria dos gestores dessa região.

Mais que uma possibilidade, a criação de uma região integrada entre municípios metropolitanos é permitido pela Constituição federal de 1988. O Art. 25 , § 3º, estabelece a possibilidade de criação de Regiões Metropolitanas e prevê a gestão integrada de funções públicas de interesse comum entre os municípios.

A RMG, como muitas outras regiões metropolitanas do país, cresceu de forma desordenada. A expansão urbana não foi acompanhada por um planejamento adequado, e o crescimento acelerado trouxe uma série de problemas para os municípios ao redor de Goiânia. A falta de estrutura para atender a essa população crescente tem sobrecarregado o sistema de transporte, gerado déficit habitacional e dificultado a gestão de resíduos sólidos. Problemas ambientais também se intensificam com o desmatamento e a poluição de recursos hídricos, como o rio Meia Ponte, que abastece boa parte da região.

Diante desses desafios, a gestão integrada surge como uma alternativa promissora, mas complexa. Embora exista um consenso sobre a necessidade de coordenação, questões como interesses políticos divergentes, divisão de responsabilidades e limitações orçamentárias são alguns dos entraves que dificultam a implementação de uma governança conjunta eficaz.

Prefeitos da região, como Marden Júnior (UB), de Trindade, Fernando Pellozo (UB), de Senador Canedo e Leandro Vilela (MDB), de Aparecida de Goiânia, apontam a importância de uma atuação coordenada entre as cidades limítrofes e a capital para lidar com questões que vão desde a saúde até o transporte coletivo. Ambos acreditam que a cooperação pode resolver problemas históricos e oferecer melhores serviços à população metropolitana.

Saúde unificada é o maior desafio

A saúde e a educação também se apresentam como áreas onde a gestão integrada pode proporcionar resultados positivos. Atualmente, Trindade, por exemplo, atende um número significativo de moradores de Goiânia em suas Unidades de Pronto Atendimento (UPA). “Para se ter uma ideia, 43% dos nossos atendimentos na UPA de urgência e emergência em Trindade são de moradores de Goiânia. Precisamos de fato estar integrados para resolver esses problemas juntos,” diz Marden Júnior. Ele também menciona que essa cooperação poderia beneficiar a educação, pois muitas crianças que residem na fronteira entre Trindade e Goiânia enfrentam dificuldades para acessar creches e escolas próximas às suas casas devido aos limites municipais.

Prefeito de Trindade, Marden Júnior | Foto: Leo Iran / Jornal Opção

O prefeito acredita que uma gestão compartilhada de saúde e educação traria melhorias significativas para toda a população da RMG. “Se a gente conseguir implementar políticas públicas metropolitanas relacionadas à saúde e educação, como já existe no transporte coletivo, eu não tenho dúvidas de que seria uma solução para muitos problemas enfrentados há anos,” destaca.

A resolução dos problemas da Capital, segundo Pellozo, pode aliviar os serviços nos municípios que fazem divisa com Goiânia. “Goiânia precisa voltar a brilhar e a ter serviço de saúde e de transporte que não sobrecarreguem os outros municípios. Com relação a essa deficiência, o município de Senador Canedo atende quase 50% de moradores de Goiânia”, pontua.

Mobilidade Urbana

A mobilidade é um dos setores que mais sofrem com a falta de integração. Para muitos cidadãos que moram em Aparecida de Goiânia, Senador Canedo, Trindade e outras cidades da região, o deslocamento diário até Goiânia é uma realidade desgastante. Para Leandro Vilela, uma das prioridades será o desvio da BR-153, que liga as cidades e necessita de melhorias para facilitar o trânsito e reduzir os impactos na vida dos moradores.

“Nós somos amigos e fomos colegas de bancada no Congresso. E juntos vamos atuar para trazer benefícios para as duas cidades junto ao governo federal, por meio das bancadas parlamentares. Tenho certeza de que essa parceria será crucial para atender às demandas dos moradores das duas cidades e da região metropolitana”, comentou Vilela.

Leandro Vilela | Foto: Guilherme Alves/ Jornal Opção

“Precisamos melhorar a mobilidade em pontos de gargalos no trânsito entre as duas cidades. Por isso vamos trabalhar para trazer os viadutos necessários para a BR-153, no Jardim Bela Vista, melhorando o fluxo e facilitando a vida do condutor que muitas vezes passa horas dentro do carro”, sublinha Mabel

Transporte Coletivo

O atual modelo de gestão do transporte coletivo se mostra eficiênte para manter o preço da passagem, mas o desafio ainda é garantir maior qualidade para o usuário e a redução do tempo de espera e das viagens. O governo estadual anunciou a troca da frota dos ônibus do Eixo Anhanguera por modelos elétricos e híbridos. Essa ação influenciará em duas áreas: mobilidade e meio ambiente, tendo em vista que esses veículos são mais “verdes”.

A Rede Metropolitana de Transporte Coletivo (RMTC) recebe, mensalmente, mais de R$ 30 milhões para garantir que o preço da passagem se mantenha no mesmo patar de 2019. Somente o Estado de Goiás  repassa mais de R$ 12,4 milhões por mês para a manutenção do sistema. A tarifa do transporte coletivo (sistema único, incluindo o Eixo Anhanguera) custa R$ 4,30 para o usuário e o valor do subsídio corresponde a R$ 3,2882.

O Governo de Goiás e a Prefeitura de Goiânia contribuem mensalmente com um montante de recursos correspondente a 41,2% cada. A Prefeitura de Aparecida de Goiânia possui a cota parte de 9.4% no rateio e o município de Senador Canedo desembolsa 4,81% do total de recursos atualmente.

O subsídio ao transporte coletivo foi instituído pelo Governo de Goiás em 2020 como forma de auxílio emergencial à população durante o período de pandemia da Covid-19, por meio de Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) firmado com o Ministério Público. No final de 2021, foi publicada a Lei Complementar 169, que reestruturou a Rede Metropolitana de Transporte Coletivo e regulamentou o pagamento do subsídio.

Saneamento e meio ambiente

Outro ponto crucial para a gestão integrada na RMG é o saneamento. A falta de coleta e tratamento de esgoto em muitas cidades ao redor de Goiânia representa um risco para a saúde pública e para o meio ambiente. Além disso, o descarte inadequado de resíduos sólidos é um problema recorrente, com lixões a céu aberto que prejudicam o solo e os mananciais da região.

Uma solução integrada de saneamento e resíduos sólidos na RMG exigiria a criação de uma agência de regulação ambiental metropolitana, que poderia coordenar projetos de coleta seletiva, reciclagem e aterros sanitários. O tratamento de esgoto poderia ser gerido por meio de parcerias público-privadas (PPPs), aproveitando a expertise do setor privado para otimizar os serviços. Tal abordagem também incluiria a gestão dos recursos hídricos de maneira compartilhada, com regulamentação para a preservação de nascentes e rios, especialmente o Meia Ponte.

Força do grupo político

Para Marden Júnior, o atual cenário político facilita essa integração, já que muitos dos prefeitos da RMG pertencem ao mesmo grupo político. “Nós estamos num momento ímpar, politicamente unidos e administrativamente preparados para resolver os problemas juntos. Compartilhamos os mesmos desafios; às vezes a intensidade muda, mas todos vivemos e enfrentamos questões semelhantes. Eu não tenho dúvidas de que vamos encontrar soluções em conjunto,” explica o prefeito de Trindade.

Com a liderança do governador Ronaldo Caiado, que segundo Marden está empenhado em promover uma atuação coordenada entre os municípios, há uma expectativa positiva de que a integração se torne realidade nos próximos anos. “Agora, vamos colocar em prática esse plano de trabalho para resolver os problemas comuns que temos,” conclui o prefeito.

Instrumentos

Para que essas medidas sejam viáveis, é necessária a criação de uma estrutura administrativa com poder de decisão, como uma Agência Metropolitana de Goiânia, que seja responsável por coordenar os projetos e regulamentar as políticas públicas que afetem toda a região. A existência de um Plano de Desenvolvimento Urbano Integrado (PDUI) também é fundamental para orientar o crescimento dos municípios de forma harmônica, garantindo a preservação ambiental e o uso racional do solo.

A criação de um Fundo Metropolitano, alimentado por contribuições proporcionais dos municípios e do governo estadual, seria uma fonte de recursos essencial para financiar os projetos de interesse comum. Esse fundo garantiria a sustentabilidade financeira de projetos e evitariam a sobrecarga de um único município na execução de ações de longo prazo.

Exemplos de Regiões Metropolitanas com Gestão Integrada

  1. Grande São Paulo: A Região Metropolitana de São Paulo (RMSP) é uma das mais bem-sucedidas no país em termos de gestão integrada, devido à sua extensa área urbana e à interdependência entre os municípios. A Empresa Paulista de Planejamento Metropolitano (EMPLASA) coordena estudos e políticas públicas que afetam os 39 municípios da RMSP, sobretudo em áreas como mobilidade urbana e segurança pública.
  2. Região Metropolitana de Belo Horizonte: A Agência de Desenvolvimento da Região Metropolitana de Belo Horizonte (ARMBH) é responsável pela coordenação de ações entre os 34 municípios da região. Um exemplo significativo é a gestão integrada do transporte público, que facilita a mobilidade dos cidadãos entre as cidades da região.
  3. Grande Recife: A Região Metropolitana do Recife possui o Conselho de Desenvolvimento Metropolitano, que atua em áreas como habitação, meio ambiente e mobilidade. A Companhia de Trens Urbanos (CBTU) e o Consórcio Grande Recife gerenciam o sistema de transporte coletivo, interligando municípios da região.
  4. Região Metropolitana de Porto Alegre: O Conselho Metropolitano de Desenvolvimento da Grande Porto Alegre (METROPOA) promove a cooperação em áreas como segurança pública, desenvolvimento econômico e mobilidade. Um dos exemplos práticos é a articulação em torno de projetos de infraestrutura para rodovias e saneamento.
  5. Região Metropolitana do Vale do Rio Cuiabá (Mato Grosso): Em Mato Grosso, a Agência Metropolitana do Vale do Rio Cuiabá (AGEM) gerencia a cooperação entre municípios em áreas como saúde, educação, segurança pública e saneamento básico. O foco principal está no atendimento de demandas crescentes e na expansão de serviços essenciais.

Áreas Comuns de Gestão Compartilhada

  1. Mobilidade Urbana: A gestão integrada do transporte é uma das áreas mais comuns, pois cidadãos se deslocam diariamente entre municípios para trabalhar, estudar ou acessar serviços. Estruturas como consórcios e agências metropolitanas facilitam a criação de tarifas unificadas, integração de modais e o planejamento de rotas intermunicipais.
  2. Saneamento e Meio Ambiente: A questão do saneamento básico, especialmente o tratamento de água e esgoto, frequentemente exige soluções regionais. O manejo de resíduos sólidos e a proteção ambiental também são temas recorrentes, visto que rios e áreas de proteção ambiental costumam atravessar diversas cidades, exigindo normas e ações comuns para preservação e fiscalização.
  3. Segurança Pública: A colaboração intermunicipal pode resultar em programas conjuntos de patrulhamento e combate ao crime, além de compartilhar informações e dados para otimizar a atuação policial.
  4. Desenvolvimento Econômico e Planejamento Urbano: Municípios de regiões metropolitanas muitas vezes compartilham estratégias para atrair investimentos, desenvolver infraestrutura e melhorar o ambiente de negócios. Ações como isenção de impostos ou políticas para criação de polos industriais, por exemplo, podem ser coordenadas para beneficiar toda a região.
  5. Saúde e Educação: Serviços de saúde, como hospitais regionais, e programas educacionais também são integrados em alguns casos para oferecer um atendimento mais eficiente. O uso compartilhado de estruturas e recursos humanos facilita o atendimento de uma população que pode residir em uma cidade e acessar serviços em outra.

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