Juscelino Goulart de Oliveira

Especial para o Jornal Opção

João Fidelis Serafim di Marques, de 63 anos, é aposentado. Como tal, levanta-se cedo, passeia com os cachorros e toma café da manhã. Depois de cuidar do pomar e da horta, decide fazer o almoço. É a parte que lhe cabe na rotina da casa: preparar o arroz para a família (porque o arroz feito pela funcionária, um grude insosso, não lhe apetece os sentidos).

João-Fi começa assim: corta uma cenoura (em pedacinhos), um terço de uma cebola, cinco cabeças de alho, quatro pimentas de cheiro (aquelas verdinhas) e folhas de manjericão. Em seguida, pega uma panela e coloca óleo. Quando o óleo está quente coloca umas quatro cabeças de alho. Agora eis a dúvida; João-Fi lava ou não o arroz? Seguindo recomendação de sua mulher, a professora Eduarda Josephina di Lima, não lava. Mas sempre fica preocupado: e as impurezas do arroz — mesmo do limpíssimo Arroz Cristal (produzido no Sul do país, por sinal)? Ah, sim, Eduarda-Fina sempre reclama de que é necessário colocar um pouco mais de sal. Como se sal fizesse tão bem assim à saúde.

O que fazer? João-Fi leu a reportagem “Lavar o arroz antes de cozinhá-lo é correto? O que é verdade ou mito”, de “O Globo” (terça-feira, 3), gostou e enviou para a redação do Jornal Opção, solicitando uma opinião “abalizada” (como se, na redação, trabalhasse algum “arrozólogo”).

“O Globo” começa informando que, de fato, os brasileiros têm o hábito de lavar o arroz antes de levá-lo ao fogo. O método é assim: lava, deixa escorrer e, logo depois, coloca direto na panela, com o óleo já bem quente.

Porém, aquilo que os avós nos ensinaram pode não ser tão positivo. “O Globo” diz que há “um ônus: a perda de pequenas quantidades de nutrientes importantes no dia a dia”.

A nutricionista Karina Cordeiro, doutoranda pela USP em Nutrição e Saúde Pública, pontua, em entrevista ao jornal carioca: “Antigamente, era muito comum ver as pessoas lavarem os grãos de arroz antes do preparo (cocção), muitas vezes porque os grãos eram comprados ainda com resíduos de plantação ou pedras e cascas. No entanto, atualmente, os grãos comprados em supermercados e atacados são pesados e embalados isentos desses possíveis resíduos, sem a necessidade de seleção e lavagem do grão cru. Igualmente, não é necessário que este arroz após o cozimento seja lavado ou drenado, pois assim haverá grande perda de compostos, como minerais e vitaminas hidrossolúveis”.

João-Fi diz que, ao ler a opinião da quase-doutora Karina Cordeiro, radicalizou e não vai mais lavar o arroz que faz todos os dias, exceto aos domingos, quando prefere comer fora, por exemplo no Restaurante Sabor e Sossego, nas proximidades do Campus da UFG (a comida é muito boa, mas demora mais de uma hora e meia para chegar ao prato, costuma reclamar o bardo Sinésio Homero das Nascentes). Pensando bem: se o arroz é posto no fogo, com óleo e água quentes, de alguma maneira está limpo e nem as micro impurezas podem fazer mal.

Karina Cordeiro acrescenta, na síntese de “O Globo”, “que, com a lavagem do arroz, é possível uma pequena perda de compostos hidrossolúveis, como minerais (potássio, magnésio, ferro e fósforo) e algumas vitaminas (B1, B2, B3 e B6) que estejam na parte mais externa do grão. Se o arroz for deixado de molho, esta perda pode ser maior”.

 Vale ouvir outra opinião da especialista, no resumo de “O Globo”: “A lavagem não representa um problema caso se dê por um curto período antes da cocção, embora seja desnecessária. Já no caso do arroz integral, especialmente aquele comprado à granel, a prática pode ajudar a conservar do alimento”.

João-Fi diz que não gosta de arroz empapado. Para o mestre-cuca, um amador exigente, o arroz precisa ficar soltinho — nada de “todo mundo junto” (arroz da UNE, digamos, de alguns restaurantes universitários). Leia mais: “Karina explica que não há alteração do valor energético do arroz quando lavado cru. Após a cocção, por outro lado, é possível que haja perda, considerando que pequena parte do amido do grão está disperso na água de cozimento. A situação se agrava em caso de cozimento prolongado (o conhecido arroz empapado)”.

Karina Cordeiro enfatiza: “É importante que o cozimento de qualquer tipo de arroz seja realizado em quantidade de água suficiente somente para cobrir os grãos, sendo adicionada um pouco mais se houver necessidade para finalizar o preparo, sempre utilizando a panela parcialmente tampada (ou completamente tampada se a panela for própria para preparo de arroz) e, ao final da cocção, tampando completamente a panela, deixando que a umidade permaneça dentro do recipiente e seja absorvida pelo grão cozido”. João-Fi admite, porém, que exagera na água. Mesmo assim, ressalva, o arroz fica soltinho e saboroso. O que é mais importante.

O pó branco do arroz faz mal? Karina Cordeiro diz que não faz mal algum. “Exceto se a pessoa que entrar em contato com o pó apresentar algum processo alérgico a componentes do arroz. Karina ressalta que alimentos secos, como o arroz cru, não são um bom veículo de bactérias se mantidos em ambientes secos (recipientes e áreas sem umidade ou com baixa umidade). Neste caso, havendo contato com água ou outros líquidos, o arroz deve ser imediatamente preparado e nunca armazenado novamente, pois poderá haver crescimento de microrganismos deteriorantes ou patogênicos, especialmente fungos, que são completamente eliminados com a cocção adequada e a manipulação de utensílios limpos.”

Karina Cordeiro faz um alerta, que, por sinal, João-Fi segue à risca: “Não se deve armazenar arroz cru umedecido, tampouco consumir arroz mantido a temperatura ambiente e sem proteção (tampa ou vedação) após uma hora de exposição. E oferece uma sugestão: ‘Preparar o arroz junto a outros vegetais, como tubérculos, raízes e leguminosas, para aumentar o aporte nutritivo da preparação’”.

João-Fi, adicto do que diz a nutricionista, aplaude: “Viva. O meu arroz é gostoso e cheiroso”. Ele avisa que às vezes coloca até jiló. João-Fi, pelo que se vê, pode até não ser um grand chef, mas, ao menos, é (muito) vaidoso. Seu ego é freudiano.

Juscelino Goulart de Oliveira quase foi chef de cozinha. Desistiu ao saber que, se sabia fritar ovo, não sabia cozinhar arroz direito. É um mestre-churrasqueiro.