Produtor cultural explica como é o processo de aprovação em um edital, captação de recursos junto a empresas e prestação de contas 

Contratações de shows milionários por prefeituras de municípios pequenos geraram novamente polêmica nas redes sociais. Além disso, artistas e prefeitos se tornaram alvos do Ministério Público acerca do correto uso de dinheiro público. Nesse contexto, voltaram a ser discutidos também o uso de recursos do erário via leis de incentivo a Cultural. Mas, quais são as diferenças entre as duas?  

A primeira, em uma consulta rápida em contratos disponibilizados por prefeituras nos portais de transparência, desobriga, logo de início, licitação, pregão ou qualquer seleção, destacando ser algo classificado como de inelegibilidade (estabelecido no art. 24, da Lei 8.666/93). Isto é, no caso concreto, o poder público aplica essa legislação, dentre muitos casos, em tragédias, crise sanitária (como houve com a Covid-19) e para aquisição de produtos ou produções exclusivas, quando uma única empresa é detentora da patente. Assim, são utilizadas para a contratação de artistas. 

Já para se concorrer a uma lei de incentivo, seja do Governo Federal, estaduais ou municipais, é aberto edital para seleção. Nesse caso, segundo o produtor cultural  Gutto Lemes, as maiores dificuldades são as comprovações curriculares de artistas, acerca do histórico cultural e a inadimplência de prestação de contas anterior.

Após a superação dessa etapa, vem a captação de recursos junto às empresas, que abatem os valores em impostos. Para receber o aporte, é necessário já ter aberto uma conta bancária exclusiva para o projeto. Lemes destaca que a lei Federal, por implicar grandes valores, é mais difícil para ser feita a captação de dinheiro, pois os prazos de liberação depende de cada empresa, quando vão fazer a dedução tributária. A título de comparação, contratos sem exigência de licitação com prefeituras, exemplo de Aparecida de Goiânia, informaram que os artistas receberam o cachê dias antes de realizar o show.

Jornal Opção: Há quanto tempo você atua como produtor cultural e como define essa área? 

Gutto Lemes: Desde o 1° Goiânia Art Déco Festival em 2018, que me considero um produtor cultural, mas, antes disso, já organizava exposições, audiências, seminários entre outros eventos culturais. A produção cultural é extensa: organizar contratos, orçamentos, fornecedores, planejar e acionar artistas, equipes técnicas, logística de (alimentação, transportes, equipamentos, hospedagens etc), pesquisar locais para os eventos, obter licenças junto aos órgãos competentes e acompanhar tudo de perto. Nem sempre somos valorizados como deveríamos!

Jornal Opção: Na sua opinião, há lisura nessas seleções de projetos para receber o incentivo?

Gutto Lemes: Difícil garantir 100% de lisura em tudo que envolve as leis de incentivo desde a inscrição até o resultado final. Com aprovação pelo Senado das novas leis de incentivo Aldir Blanc e Paulo Gustavo, que foram vetadas pelo atual presidente Jair Bolsonaro, com a estimativa de injetar no mercado cultural o montante de R$ 7 bilhões ( para Estados e Municípios) e se essas mesmas leis forem sancionadas pelo presidente no futuro seria necessário antes de tudo profissionalizar com cursos técnicos correlatos a produção cultural e pessoas (efetivo) aptas para atuar desde a fase de inscrição até a prestação de contas. O que acontece hoje em dia são funcionários de secretarias de cultura dos Estados e Municípios sem nenhum conhecimento prévio sobre a área cultural. Isso sem dúvida gera desconfiança entre artistas, produtores culturais em relação à lisura nas seleções de projetos a serem aprovados. Com todas as dificuldades ainda temos uma certa lisura através dos acompanhamentos e prestações de contas.

Jornal Opção: Há dificuldades para aprovação de projetos de um edital de incentivo à cultura? 

Gutto Lemes: As maiores dificuldades são as participações culturais ou histórico do artista que comprove seu currículo artístico e domiciliar. Outro impedimento é a inadimplência em relação à prestação de contas anterior. Projetos  criativos e originais serão bem pontuados. Grandes eventos como festivais, por exemplo com mais de duas edições, têm grandes possibilidades de serem contemplados. Se o projeto onde está sendo realizado der grande visibilidade local à cultura, identidade, ou personalidade que irá promover a nível regional, nacional e internacional também terá grande êxito.

Jornal Opção: Como é feita a captação de recursos, após ser aprovado na seleção? 

Gutto Lemes: A captação de recursos é feita diretamente com as empresas após a aprovação do projeto e liberação para captar. É necessário abrir uma conta bancária especialmente para executar o projeto. A lei Federal que implica em grandes valores se torna mais difícil na hora da captação e os prazos de liberação das verbas depende de cada empresa que irá fazer a dedução de seus impostos.

Jornal Opção: Em relação à prestação de contas, caso um projeto não apresente toda a documentação comprobatória dos gastos, quais as penalidades?

Gutto Lemes: Se o proponente não prestar as contas mediante edital das leis ele automaticamente ficará inadimplente e não poderá participar de outro edital. O proponente ainda terá o nome sujo nas esferas municipal, estadual e federal da qual fez a inscrição.