Dia da visibilidade trans: Goiás é líder nacional em número de cirurgias de redesignação sexual

29 janeiro 2025 às 14h17

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Nesta quarta-feira, dia 29 de janeiro, comemora-se o dia da visibilidade trans. A data serve como celebração das conquistas e também como reforço do compromisso na luta pela garantia dos direitos das pessoas transexuais. Nesse espírito, o estado de Goiás se coloca como vanguarda em todo o país, se tornando o estado a realizar o maior número de cirurgias de redesignação sexual pela rede pública. De dezembro de 2023 até outubro de 2024, foram 26 procedimentos realizados pela equipe do Hospital Estadual Alberto Rassi (HGG).
Na unidade de saúde do governo estadual, existe o Serviço de Identidade de Gênero, Transexualidade e Desvios da Diferenciação Sexual, o Ambulatório TX do HGG. Uma equipe multidisciplinar garante tratamento hormonal, psicológico, fonoaudiológico, e cirúrgico, além do acompanhamentos regulares, para toda a população transexual do estado de Goiás.
Nesta quarta-feira, 29, a equipe da Secretaria de Estado de Saúde (SES-GO) anunciou um novo serviço, essencial para o processo de transição, que será oferecido pelo ambulatório TX: a dispensa de medicamentos para hormonioterapia.
Quem vive na pele
Gabriel de Almeida Dias, de 27 anos, é um dos pacientes do HGG. Ele conta que, após três ou quatro meses de espera pelo encaminhamento, sua primeira consulta no ambulatório aconteceu em dezembro de 2022. Gabriel explica que é necessário que a gente tenha um acompanhamento psicológico e psiquiátrico de no mínimo 2 anos antes de entrar na fila de espera para a cirurgia de redesignação sexual.
“Ano passado eu terminei esses dois anos e hoje eu já estou aguardando a minha primeira cirurgia”, compartilhou Gabriel ao Jornal Opção.
Quando fala dos preconceitos e estigmas que pessoas transexuais normalmente sofrem, Gabriel elogia a equipe do HGG: “aqui a gente tem espaço para sermos nós mesmos”. Das consultas com ginecologista, passando pelos acompanhamentos com psicólogos e psiquiatras, até os tratamentos com endocrinologistas: “todos os profissionais sempre com muito respeito e muito carinho”.
Para ele, que contou com apoio da família, o processo foi mais simples do que imaginava: “Levei um encaminhamento, o encaminhamento saiu. Eu pego o transporte da prefeitura e venho para cá [HGG] nas minhas consultas”. Suas consultas acontecem, no mínimo, uma vez por mês, mas a depender da demanda do paciente, podem acontecer de 15 em 15 dias ou semanalmente. “Tudo foi muito tranquilo. Parece irreal, mas realmente foi”, finalizou.

Ambulatório TX
Ao Jornal Opção, o médico coordenador do serviço transexualizador do HGG, João Lino, explica que, para ter acesso aos tratamentos, é preciso conseguir encaminhamento em qualquer unidade de saúde pública no estado. Os tratamentos ambulatoriais para hormonização, os procedimentos cirúrgicos, atendimentos de fonoaudiologia e acompanhamento psicológico e psiquiátrico são realizados a partir do momento que o paciente é encaminhado para o ambulatório TX.
Quando fala do futuro do projeto, o coordenador destaca aprimoramentos já em andamento, como a incorporação de centros de acompanhamento ambulatorial para hormonização em cidades do interior. Itumbiara e Senador Canedo já contam com o serviço, mas agora ele chega a Pirenópolis, Formosa, São Luís de Montes Belos e Goianésia. “A população transexual aqui dentro do Estado vai ter uma rede de atendimento que não encontra fácil em outras partes do país”, celebrou Lino.
Pensando em desafios, o médico destaca três pontos: olhar para população transexual com menos de 18 anos, investimento na capacitação das equipes médicas de todo o país (a fim de descentralizar o atendimento), e incorporação de técnicas cirúrgicas ainda não ofertadas pelo SUS.
Lino destacou a necessidade de ampliação do atendimento a pessoas trans, tanto no tratamento ambulatorial de hormonização quanto na oferta de procedimentos cirúrgicos. Segundo ele, a dispensação de medicação será incorporada ao serviço, assim como a readequação fonoaudiológica e novos procedimentos. “A gente precisa incorporar algumas técnicas cirúrgicas que aqui não temos recursos humanos para realizar”, afirmou. Ele explicou que algumas modalidades, como a técnica de retalho intestinal para redesignação sexual, não são contempladas pela portaria do SUS, o que impede a habilitação dos hospitais pelo Ministério da Saúde.
João Lino também enfatizou a necessidade de capacitação de profissionais para ampliar o acesso a esses serviços. “Precisamos encontrar alguém que conheça a técnica para formar a equipe”, disse. Além disso, ele ressaltou a importância de começar a olhar para a população transexual de crianças e adolescentes, garantindo atendimento especializado desde cedo. Para o médico, a oferta desse tipo de serviço no SUS ainda é muito restrita, e é fundamental expandir a formação de profissionais para que outras unidades possam oferecer assistência qualificada a essa população.
O secretário adjunto da Secretaria de Estado da Saúde de Goiás (SES-GO), Sérgio Vencio, destacou a importância da manutenção e ampliação do programa TX no Hospital Estadual Dr. Alberto Rassi (HGG), voltado para o atendimento de pessoas trans e travestis. Ele ressaltou que o serviço, iniciado em 1999 pela professora Mariluza Terra, já realizou mais de 15.500 consultas e reduziu a fila de espera para 280 pacientes. “Vocês conseguiram um nível de excelência aqui muito interessante, principalmente para que o serviço continue”, afirmou. O secretário também enfatizou a necessidade de incluir novas terapias no tratamento, como a reabilitação vocal e a harmonioterapia, para garantir um atendimento completo à população atendida.

Vencio ainda chamou a atenção para os desafios enfrentados pelo programa, incluindo a crescente dificuldade no acesso à testosterona devido à comercialização irregular e ao aumento dos preços. “Será que mês que vem eu vou conseguir comprar o meu remédio? Isso é uma coisa terrível, porque o seu corpo não produz aquele hormônio”, alertou. Ele também ressaltou a vulnerabilidade da população trans no Brasil, que lidera há 16 anos o ranking mundial de assassinatos desse grupo. Para ele, é fundamental que a sociedade se mobilize para que o programa TX seja tratado como uma política de Estado, independentemente de mudanças de governo. “Nós estamos falando de ciência, estamos falando de vidas”, concluiu.