Candidaturas coletivas: o que prevê a Justiça Eleitoral
02 novembro 2020 às 15h52

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Fenômeno no Brasil, a legislação eleitoral não contempla essa proposta, mas também não tem como vetar, segundo advogado eleitoral

Já ouviu falar em candidatura coletiva? Essa nova configuração proposta para atuar em cargos legislativos já tem alguns grupos eleitos no Brasil, nos estados de Goiás (em Alto Paraíso), em Minas Gerais, São Paulo e Pernambuco.
A proposta, que foi iniciada no país em 1999, pelo estudante de sociologia da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), Marco Fonseca da Costa, apontou para a possibilidade de ocupar na Câmara Municipal o cargo denominado covereador, em que uma pessoa indica seu nome para o mandato, mas divide as responsabilidades, obrigações, decisões e, até mesmo salário, com um grupo de pessoas.
Mas, como esclareceu o advogado eleitoral Julio Meirelles, não existe qualquer previsão legal sobre os mandatos coletivos no Tribunal Superior Eleitoral. E, exatamente por essa mesma razão, não há qualquer tipo de proibição desta maneira de se apresentar politicamente.

“Não existe qualquer previsão sobre candidaturas coletivas, mas nada impede que as pessoas se organizem, apontem um deles, um filiado ao partido político, preencha as condições de elegibilidade, que não tenha contra si nenhuma causa de inelegibilidade para que possa concorrer e, depois, por conta em risco e mera liberalidade dele próprio, dividir as decisões, as posições de parlamentar”, explicou ao Jornal Opção.
“Quando voto em um coletivo, a pessoa que assume é aquela que está registrada. A Justiça Eleitoral não registra uma candidatura coletiva. Ela registra um filiado de um partido. Aquele filiado é que combina, faz um acordo coletivo com outras pessoas”, conta.
Participação popular
A experiência política curiosa já foi testada na Suécia por um coletivo eleito em 2002, mas que funcionava bem diferente do que é proposto no Brasil. Lá, os cidadãos se registravam on-line, debatiam e votavam a proposta. O resultado era representado por Parisa Molagholi, uma estudante de 19 anos à época, em plenário. Ela chegou a ser reeleita em 2006.
O Estado de Goiás também foi pioneiro desse novo estilo de gestão. Em 2016, na cidade de Alto Paraíso, cinco pessoas do grupo encabeçado pelo advogado Jão Yuji, de 31 anos, também “lançaram” a tal democracia participativa.
Para Julio, a ideia de ser um parlamentar por si própria já é participativa, tendo em vista que o eleito representa toda uma comunidade. “Aquele que se coloca à disposição, coloca seu nome na disputa do pleito, ele deve representar uma coletividade. Agora, a decisão é do parlamentar. A coletividade já é o conjunto de parlamentares. Os parlamentares decidem de forma coletiva”, pontuou.
Regras
No entanto, o TRE-PR esclareceu que, apesar de não haver nenhuma disposição acerca do tema, o órgão exige, sim, que regras sejam cumpridas. “As regras sobre os nomes de urna, para as eleições 2020, estão previstas na Resolução 23.609-19, do TSE. Em seu Artigo 25, a Resolução determina que o nome, para constar da urna eletrônica, terá no máximo 30 caracteres, incluindo-se o espaço entre os nomes, podendo ser o prenome, sobrenome, cognome, nome abreviado, apelido ou nome pelo qual o candidato é mais conhecido, desde que não se estabeleça dúvida quanto a sua identidade, não atente contra o pudor e não seja ridículo ou irreverente.”
Apenas a pessoa que tem sua foto na urna também é diplomada e pode apresentar a decisão de voto em plenário. Com a determinação por apenas um registro formal de nome, a candidata Cíntia Dias, da MandatA Coletiva Agora É Que São Elas, conta que tiveram de escolher uma pessoa para representar o grupo na hora do registro.

“Cumprimos todas as burocracias do TRE que aceita essa forma de propor, mas precisamos registrar um CPF, que foi o meu. A única exigência que de fato nos travou foi escolher o nome de apenas uma pessoa antes do nome MandatA Coletiva Agora É Que São Elas. Cumprimos colocando Cíntia Mandata Agora É Que São Elas”, relatou.
Apesar disso, Cíntia já antecipa que, caso eleitas, não será ela a única responsável pelo mandato. “Estamos cumprindo essa tarefa junto aos movimentos sociais e pretendemos estar na Câmara Municipal desta forma, compartilhando nosso poder. Seremos quatro pessoas atuando como co-vereadoras. Vamos dividir salários, responsabilidades, vamos atuar em coletivo”, explicou.
“Além de nós, existe um comitê organizacional de 36 pessoas, que inclui a Universidade Federal, movimentos sociais, movimento negro, movimento feminista e tudo que nos compõe como princípio de atuação”, explica.
Em Goiânia
O grupo é representado pelo Partido Socialismo e Liberdade (Psol), que também é responsável pela outra candidatura coletiva disponível neste pleito em Goiânia, a Mandata Coletiva Motirô, composta por Alessandra Minadakis, Joana Porto e Nina Soldera.

“Ter outras candidaturas coletivas é importante, porque esse deve ser o formato. Quanto mais pessoas estiverem no poder compartilhando as decisões, dividindo as tarefas e repartindo coletivamente os projetos, popularidade e intenções com a comunidade, mais participativo esse parlamento vai ser”, acrescentou Cíntia.
“Por esse viés vamos atuar na Câmara. Que tenham outras candidaturas coletivas. Nesse contexto de retrocesso e fascista, ter candidaturas coletivas e feministas é o maior ganho que o PSOL pode apresentar”, concluiu.