Campos Neto critica estratégia econômica do governo Lula: ‘Quer igualdade sem reduzir pobreza’

06 julho 2025 às 08h52

COMPARTILHAR
O ex-presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, criticou a política econômica e social do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Em entrevista à Folha de S.Paulo publicada neste domingo, 6, Campos Neto afirmou que o atual governo tem uma “obsessão com igualdade” em vez de priorizar a redução da pobreza.
Segundo ele, essa postura “vende” a ideia de que o Estado é essencial para corrigir desigualdades, mesmo que isso prejudique a economia. “Como a igualdade não é um fenômeno natural, o governo se apresenta como indispensável para corrigir esse ‘erro’”, declarou o economista, que comandou o Banco Central de 2019 a 2024.
Campos Neto, 56 anos, finalizou sua quarentena de 6 meses após deixar o BC e assumiu, em 1º de julho de 2025, os cargos de vice-chairman e chefe global de políticas públicas do Nubank. Para Campos Neto, o modelo econômico atual — centrado em aumento de impostos, expansão de gastos sociais e transferência de renda — prejudica o crescimento sustentável do Brasil.
“O crescimento é feito com dívida e aumento da carga tributária sobre as empresas. Isso reduz o investimento privado, limita a oferta futura de bens e serviços, e gera inflação estrutural, juros altos e baixa produtividade”, analisou.
Ele defende que, no longo prazo, essa abordagem leva a um “Estado inchado, setor privado atrofiado e dívida pública insustentável”. Para Campos Neto, o atual governo usa uma retórica de divisão — “ricos contra pobres” — para justificar medidas fiscais, o que enfraquece a credibilidade econômica.
Bolsa Família e informalidade
O ex-presidente do BC também abordou os impactos do programa Bolsa Família, questionando sua eficácia e os possíveis efeitos sobre o mercado de trabalho formal: “Tem Estado com mais beneficiários do Bolsa Família do que trabalhadores com carteira assinada. Ninguém é contra o programa, mas precisamos discutir se ele está incentivando a informalidade.”
Segundo levantamento do Poder360, em 2024 havia 12 Estados brasileiros onde o número de beneficiários do Bolsa Família superava o total de empregos formais via CLT. Campos Neto também alertou para a evasão de empresários e capital brasileiro.
“O Brasil lidera a América Latina em número de milionários que se mudaram para outros países. Empresas estão listando ações no exterior e fechando capital no Brasil. O empresário precisa ser valorizado, não hostilizado.”
A principal preocupação de Campos Neto está na sustentabilidade da dívida pública brasileira, que ele classificou como uma das maiores entre países emergentes. Ele defende um “choque positivo de credibilidade fiscal”, com foco em ancoragem das expectativas e comunicação clara:
“Mesmo com arrecadação crescente, o Brasil não consegue gerar superavit. Estamos presos a um déficit nominal em torno de 8%, com a dívida crescendo de 3 a 5 pontos percentuais ao ano.”
Tributação e incentivos
Campos Neto afirmou concordar com a revisão de isenções tributárias, desde que haja equilíbrio. Ele apoia taxação de dividendos desde que haja redução do IRPJ, é a favor do fim de isenções em títulos de renda fixa se houver compensações, e critica a eliminação de incentivos para investimentos de longo prazo.
Apesar de críticas à política fiscal do governo Lula, Campos Neto elogiou a atuação técnica do atual presidente do BC, Gabriel Galípolo: “Está fazendo um trabalho irretocável. O problema está do lado fiscal, não do monetário.”
Sobre as críticas feitas por Lula e pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, Campos Neto foi direto: “É uma narrativa política infundada. Empobrece o debate. Precisamos de soluções estruturais.”
Questionado sobre uma possível participação na campanha presidencial de Tarcísio de Freitas (Republicanos), governador de São Paulo, Campos Neto negou: “Minha área de interesse é finanças e tecnologia. Estou no setor privado e não participarei de campanhas políticas.”
Leia também: