Apesar da fama de outsider, Gustavo Gayer tem linhagem política e à esquerda
08 março 2022 às 07h50
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Youtuber é filho da ex-deputada e ex-vereadora Conceição Gayer, irmão do ex-Tesoureiro do PR e foi cunhado de Luana Ribeiro, deputada estadual pelo Tocantins, filha do ex-senador João Ribeiro
De todas as famas do controverso professor de inglês, youtuber e ativista digital Gustavo Gayer (DC), a mais inadequada é de outsider [indivíduo que não pertence a um grupo determinado]. Apesar de discursos antipolítica, anti-Brasília e antissistema ungirem as pretensões políticas dele, a ideia de que Gustavo está fora do “sistema” é mera retórica. Filho da ex-vereadora e ex-deputada Conceição Gayer (MDB | PDT | PDC), um das fundadoras do Centro de Valorização da Mulher (Cevam) e, ao lado de Consuelo Nasser, considerada uma das pioneiras do feminismo em Goiás; ele também foi cunhado da deputada estadual pelo Tocantins, Luana Ribeiro (PSDB), que está no quarto mandato e, por sinal, é filha do ex-senador João Ribeiro (PDS | PFL | PL). Além disso, o professor é irmão de Frederico Gayer (PL-TO), policial nomeado pelo Governo de Goiás sem concurso, chefe de gabinete da própria mulher na Assembleia do Tocantins e Tesoureiro do PR em 2010, ano em que o então sogro era presidente estadual do partido. Frederico, inclusive, foi condenado por homicídio.
Esquerdista, a mãe de Gustavo Gayer militou contra a ditadura militar, foi presidente da Fundação Estadual para o Bem-Estar do Menor (Febem) e, cumulativamente, secretária para Assuntos Extraordinários no governado de Iris Rezende (MDB). Ela também foi presidente do Conselho Municipal da Condição Feminina, criado a partir de uma propositura dela, quando vereadora, sancionada pelo então prefeito Nion Albernaz (PSDB) e que deu origem a primeira Delegacia Especial de Polícia de Defesa da Mulher; secretária-geral do Diretório Regional do PMDB-Mulher; vice-Presidente da Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (Apae-Goiás) e, entre outros, diretora do Clube Social Feminino.
Nascida em Caiapônia, a trajetória política de Conceição Gayer começou em Jataí como membro do Grêmio Estudantil Nestório Ribeiro e fundadora da Ala Moça do PSD. Professora na Escola Municipal de Vila Redenção antes de se formar em Direito Pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC-GO), ela foi nomeada titular da Delegacia de Menores em 1979. O cargo, que ocupou até 1981, e a atuação no grupo feminista Eva de Novo, que tinha como principais pautas a disponibilização de creches, o aproveitamento da mulher no primeiro escalão do governo e nos cargos de chefia da administração pública, a igualdade salarial e modificações de livros didáticos, lhe deram projeção para buscar um cargo eletivo.
Filiada ao PMDB, Conceição foi a vereadora por Goiânia mais votada à época, com mais de 10 mil votos. Número tão expressivo – até mesmo para os dias de hoje – que fez com que ela fosse a primeira mulher a presidir a sessão solene de inauguração de uma legislatura 1983-1987. Mesmo com potencial para pleitear a Câmara dos Deputados, em Brasília, Conceição concorreu ao parlamento goianiense porque, na época, o PSD e PMDB não abriram representação feminina nas disputas para Senado, deputados federal e estadual.
Mais tarde, no entanto, depois de deixar o PDT de Leonel Brizola, um dos maiores símbolos da esquerda brasileira e defensor ferrenho do trabalhismo, Conceição foi eleita deputada estadual pelo PDC para a 11ª legislatura da Assembleia Legislativa em Goiás (Alego), de 1987-1991. Ela, aliás, quebrou um jejum de 20 anos sem eleições de deputadas estaduais por Goiás. Na Alego, Conceição Gayer foi líder da bancada do PDC e titular da Comissão de Justiça e Defesa da Sociedade. Ela integrou a bancada de oposição, ajudou a formular a Constituição estadual, defendeu enfrentamento da violência, a participação da mulher na gestão pública e a valorização dos servidores.
Além disso, Conceição Gayer é autora de projetos como o que assegurava ao servidor estadual o direito à gratificação natalina, o que garantia acréscimos salariais de 10% a 30% em caso de atrasos nos pagamentos por parte do Estado e o que tornava facultativo o Ensino Religioso nas escolas. Vítima de infarto, Conceição faleceu em Goiânia em dezembro de 2006. Gustavo, no entanto, minimiza a trajetória da mãe.
Pretenso candidato ao Congresso Nacional no pleito de outubro deste ano, ele já disse em entrevista que Conceição era de esquerda como efeito de um processo de doutrinação que existiria à época. Ele próprio, que hoje se posiciona em um lugar diametralmente oposto ao que esteve a Conceição durante toda a vida pública, também foi esquerdista durante a adolescência e alega que se tornou conservador em razão do amadurecimento.
No entanto, coincidentemente ou não, Gustavo tornou-se um dos representantes do conservadorismo durante a onda que varreu o Brasil em 2018, com a eleição do presidente Jair Bolsonaro (PL) e a guinada do país à direita, movimento que favoreceu candidaturas de novatos e outsiders. Gustavo, inclusive, surfou nela para disputar, ao lado de Alexandre Magalhães (DC), a Prefeitura de Goiânia nas últimas eleições. Na época, ele ficou em quarto lugar, com 45.928 ou 7,62% dos votos válidos. Já em 2022, deve tentar novamente galgar um cargo público na Câmara dos Deputados ou no Senado Federal.
Na onda das polêmicas
Dono do canal Papo Conservador, no Youtube, Gayer ganhou projeção a partir de maio de 2020, durante um protesto de enfermeiras, em Brasília, pedindo melhores condições de trabalho em meio à pandemia do Coronavírus. Na época, ele foi acusado de agredir tais enfermeiras, mas negou o envolvimento e afirmou que havia criticado o protesto porque achava que era um movimento falso. Ele também esteve envolvido em outras polêmicas, que resultaram em queixa-crime por parte do governador Ronaldo Caiado (União Brasil) por delito contra a honra e em retratação pública conseguida judicialmente pelo prefeito Rogério Cruz (Republicanos) depois que ele divulgou notícias falsas sobre a prestação de serviço público na pandemia.
Na última eleição, em 2020, ele também teve que desmentir uma lista falsa que ele mesmo divulgou, na qual constataria a lista de possíveis secretários de Maguito Vilela (MDB), prefeito eleito por Goiânia, mas falecido em decorrência do Coronavírus. Além das acusações de fake news envolvendo Rogério Cruz e Maguito Vilela, Gustavo aparece no relatório do Google, apresentado à CPI da Covid, como o segundo youtuber que mais ganhou dinheiro no país com a difusão de informações falsas sobre a pandemia. De acordo com o documento, ele recebeu R$ 40,7 mil por 56 vídeos sobre o assunto. Recentemente, como antecipou o Jornal Opção, a justiça negou o restabelecimento da conta dele no Twitter, suspensa pela empresa após uma publicação. Considerado um dos principais bolsonaristas do país, ele integra a Frente Conservadora de Goiânia.
Mesmo se posicionando na ala conservadora e se dizendo contra a ideologia de gênero, Gustavo já disse que, na política, defenderia os direitos do homossexuais, pois, com pais separados, teria sido criado por um irmão gay, 10 anos mais velho do que ele. Conceição, no entanto, teve apenas três filhos, Renata, Gustavo e Frederico. Esse último, até 2015, foi formalmente casado com a deputada estadual pelo Tocantins Luana Ribeiro, com quem tem filhos. Em 2016, depois de 19 anos de tramitação judicial, Frederico foi condenado a 12 anos e seis meses de reclusão, em regime inicial fechado, por homicídio qualificado cometido por motivo fútil. Aos 22 anos, o irmão de Gustavo Gayer assassinou Herbert Resende na boate Draft, no Setor Oeste.
Segundo as investigações, o crime ocorreu no dia 5 de abril de 1997, por volta das 2h30, após um desentendimento provocado pela troca, por engano, das fichas consumo de Frederico e de Hebert. O equívoco foi cometido por um funcionário da boate. Na época, ele era policial em Goiás, mas ocupava o cargo sem concurso público, e, de acordo com o Ministério Público de Goiás (MP-GO), atirou em Herbert mesmo depois do problema ter sido resolvido. Testemunhas disseram que Frederico foi até o carro, pegou a arma e esperou a vítima sair da boate para alvejá-lo. Hebert ficou 24 dias internado após ter sido atingido na barriga. Ele morreu por choque séptico.
Frederico, que esteve foragido por sete meses após a condenação, está preso na Cadeia Pública de Bernardo Sayão, cidade situada a 337 quilômetros de Palmas. A família de Herbert chegou a pedir transferência de Frederico para Goiás. Envolvido com a política tocantinense durante o período de apuração do crime, Frederico trabalhou com o sogro João Ribeiro, um goiano nascido em Campo Alegre que foi deputado estadual por Goiás e, como um dos articuladores pela criação do Tocantins, também foi deputado federal e senador pelo Estado por dois mandatos consecutivos; chegando a ser tesoureiro do partido que ele presidia, e também com a própria mulher, da qual foi chefe de gabinete na Assembleia Legislativa do Tocantins. No Estado, aliás, comenta-se nos bastidores que, embora separados legalmente, Luana e Frederico ainda viveriam conjugalmente. A separação, seria apenas para minimizar os danos políticos à imagem da deputada, após a condenação do marido dela por homicídio.
* Com informações do Jornal Hora Extra e do jornalista Donny Silva