Aids no cotidiano de um jovem goiano: “É para o resto da vida”
18 julho 2014 às 13h23
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O Jornal Opção Online acompanhou o dia de um jovem goiano portador do vírus HIV. O depoimento de P.M.C. é emocionante e alerta sobre os riscos de sexo sem segurança
P.M.C. só lembra que é “positivo” quando caminha até a geladeira para pegar um copo de suco para tomar a medicação. “Sempre odiei remédios”, diz, mas é obrigado a tomar rigorosamente quatro comprimidos todas as noites, “para o resto da vida, sem folgas”. Os quatro: Ritonavir, Atazanavir e dois Biovir – conhecidos como coquetéis, que surgiram na década de 1980, e que servem para impedir a multiplicação do vírus da imunodeficiência humana, o HIV, no organismo.
Este mês o jovem completa exatamente um ano na nova rotina. P.M.C. tem hoje 21 anos, contraiu o vírus há dois. “Quando recebi o diagnóstico da minha sorologia positiva vivi um pesadelo, não estava pronto para lidar com a notícia. Para quem contar? Como seria minha vida? Iria morrer?”, disse, relembrando da época.
Atualmente cursa o quinto período da faculdade de Direito em uma universidade de Goiânia. “Com o passar dos dias fui aceitando a ideia”, afirma. Depois do pesadelo, P.M.C. se diz bem, feliz, de um viver mais leve que antes. “Meu dia-a-dia é comum, estudo, trabalho e nem sempre me lembro que tenho o vírus”.
Após o período sombrio, casou-se. O companheiro também é soropositivo, adquiriu o vírus em um relacionamento anterior. “Por confiança ele deixou de usar preservativo”, contou. Atualmente os dois usam camisinha durante suas relações sexuais.
A cada dois meses P.M.C. sai de sua casa no Setor Vila Brasília, em Aparecida de Goiânia, e segue para o Centro de Referência em Diagnóstico e Terapêutica, localizado na Av. Contorno, no Setor Norte Ferroviário, em Goiânia. No centro, é atendido por um médico. O Jornal Opção Online acompanhou uma consulta do jovem com o médico infectologista Vicente Porfirio Pessoa.
No consultório o especialista confessou à reportagem que tem atendido muitos jovens. “Aumentou o número de jovens com o vírus, principalmente homoafetivos, entre 20 e 28 anos”, disse. Na próxima consulta, P.M.C. deverá fazer exames para conferir a carga viral e o seu perfil bioquímico completo. “Não deve passar da próxima e não se esqueça de trazer o caderno [onde o jovem anota as datas de todos os exames realizados]; pode trazer o jornalista, mas traga o caderno também”, brincou Vicente Porfirio.
O tratamento e centro de referência em Goiás
Após consulta, o jovem P.M.C. voltou para casa com medicamentos que usará pelos próximos dois meses. “As testagens, os aconselhamentos e o tratamento de pessoas com alguma Doença Sexualmente Transmissível (DST) são feitos por nós de forma gratuita”, disse à reportagem a coordenadora técnica do Centro de Referência em Diagnóstico e Terapêutica, Juliana Monteiro Machado.
O centro trabalha com demandas espontâneas. “Fazemos campanhas, como por exemplo, o Fique Sabendo [do governo federal], que incentiva o teste rápido do HIV”, salientou a coordenadora.
No mês passado a unidade de saúde atendeu 354 pessoas que precisaram da especialidade médica em infectologia. Além de registrar 60 casos de DST’s, como Condiloma, Herpes, Úlceras Genitais e Hepatites B.
Em junho foram confirmados e notificados 22 novos casos de HIV na unidade, 15 em homens e 7 em mulheres. O centro de referência fez ainda mais de 760 aconselhamentos sobre os riscos do sexo sem preservativo.
A reportagem encontrou o Centro de Testagem e Aconselhamento (CTA) da unidade praticamente vazio. Uma mulher, que não quis se identificar, afirmou que o seu teste rápido de HIV não demorou mais que trinta minutos para ser concluído. “Passei por um aconselhamento com um assistente social antes de realizar o teste, e um depois que o resultado ficou pronto. Deu negativo”, comentou com alívio.
Aids no Brasil e no Estado
Dados divulgados nesta quarta-feira (16/7) pela Unaids, programa da Organização das Nações Unidas (Onu) voltada para HIV/Aids, afirma que o número de novas pessoas infectadas pelo vírus cresceu 11% no Brasil entre 2005 e 2013.
Itumbiara, cidade a 206 km da capital, contabilizou quase 100 casos da doença nos últimos 18 meses. Segundo dados do Núcleo de Atenção Básica à Saúde (Nabs), em 2013 foram notificados 63 casos, sendo que seis dos pacientes tinham menos de 20 anos. Em contrapartida, nos seis primeiros meses deste ano, 29 pessoas contraíram o vírus HIV, das quais três ainda não chegaram aos 20 anos. Das pessoas infectadas no planeta, 2% moram no Brasil. Em 2013 o país reunia 47% da quantidade de infectados e dos novos casos na América Latina.
A Unaids diz em documento que nos últimos 30 anos, a epidemia do HIV já matou mais de 35 milhões de pessoas. “Ao mesmo tempo, a resposta à epidemia gerou um movimento global, que transformou a forma de se abordar questões de saúde e de desenvolvimento. O Brasil é um país que se destaca no cenário internacional por sua resposta à Aids, tanto pelas ações realizadas em âmbito nacional”, salienta a Onu.
Procure uma unidade de saúde
Qualquer pessoa que quiser fazer o teste rápido ou esclarecer dúvidas pode procurar o Centro de Referência em Diagnóstico e Terapêutica, que funciona de segunda a sexta-feira, das 7h às 18h.
“Ser portador do vírus HIV ainda causa desconforto e certo preconceito, assim como outras enfermidades, como hanseníase e tuberculose. Quanto mais rápido descobrir que é portador do vírus HIV, melhor será o tratamento”, frisou Juliana Monteiro.
P.M.C. tem levado uma vida tranquila, inclusive faz parte de uma rede de jovens que aconselha novos portadores da doença, além de discutir em palestras o uso do preservativo.
Já a jovem que fez o teste rápido, relatou que a partir de agora sempre usará preservativo – a forma mais segura e barata de se proteger de qualquer doença na hora do prazer.