“Toda essa questão orçamentaria tem um fundo político e prevê mais liberdade ao governo”, diz a economista Greice Guerra

Presidente da República, Jair Bolsonaro (sem partido). | Foto: Alan Santos

Assunto polêmico que divide opiniões, a questão do Orçamento do governo federal para 2021 passou por mudanças desde a última segunda-feira, 19, data em que a Câmara dos Deputados realizou um acordo de flexibilização orçamentária com o governo e aprovou o projeto de lei que destrava a edição de medidas econômicas contra a pandemia da Covid-19. O Orçamento 2021 ainda não foi sancionado pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido), que tem até a próxima quinta-feira, 22, para fazê-lo.

A partir do acordo, que foi realizado a partir de alteração na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), passa a ser bancado com crédito extraordinário cerca de R$20 milhões para enfrentamento da Covid, R$10 bilhões para renovação do Benefício Emergencial e mais R$5 bilhões para o Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (PRONAMPE).

Isso, porque tanto o PRONAMPE, que dá acesso a linha de crédito às micro, pequenas e médias empresas, que foram amplamente atingidas pela pandemia, quanto o Benefício Emergencial de Preservação do Emprego e da Renda (Bem), foram retirados do teto de gastos do Orçamento. O Bem é um programa destinado a trabalhadores que formalizaram acordo com seus patrões, de suspensão do contrato de trabalho, no início da pandemia. Com ele, o Governo ficaria responsável por assumir parcela dos salários a serem pagos.

Por ficarem fora do Orçamento obrigatório previsto, apesar da expectativa ser a liberação de recurso extraordinário, a repercussão dessas mudanças é negativa no setor econômico, segundo a economista e analista de mercado, Greice Guerra. Isso, porque a previsão, é que a partir da sanção do novo Orçamento, o acesso ao crédito, por parte das empresas, ficará mais complexo.  

“Na opinião do mercado, esses programas não deveriam ter ficado de fora da discussão desse orçamento, já que com a maior dificuldade das empresas em conseguir crédito, o desemprego tende a aumentar, as empresas tendem a fechar, haverá menor circulação de dinheiro e maior retração das atividades econômicas e do Produto Interno Bruto (PIB)”, esclarece a economista.

Crime de responsabilidade fiscal?

Antes da alteração na LDO, realizada em acordo com o Palácio do Planalto com objetivo de liberar despesas fora do teto de gastos, a posição técnica da pasta econômica do Governo Federal era de veto ao Orçamento 2021. A partir da exclusão dessas despesas, entretanto, o Ministério da Economia analisou que o presidente possui a fórmula legal para sancionar o Orçamento 2021 sem correr risco de cometer crime de responsabilidade fiscal.

Para Greice, a própria aprovação do texto é considerada uma faca de dois gumes, uma vez que trará consequências positivas e negativas. “É o famoso ideal e o possível. Esse orçamento está longe de ser o ideal, mas foi o que foi possível de se fazer. As alterações foram necessárias, mas o impacto negativo será alto, uma vez que irá atingir o setor produtivo, pequenas empresas, trabalhadores que fizeram acordos com seus padrões; pessoas que tanto precisam desse crédito”, diz.

Greice acredita que essas alterações foram ocorreram especialmente para a preservação do presidente, sendo a forma que o ministro da Economia, Paulo Guedes, encontrou para que a responsabilidade fiscal fosse mantida e evitasse, até mesmo, um impeachment do chefe de Estado.

Consequências no mercado e investidores

De acordo com Greice, que é analista de mercado, as consequências negativas já se iniciaram antes mesmo da sanção de Bolsonaro ao Orçamento, que deve ocorrer até a próxima quinta-feira, 22. Isso, porque com a má recepção da notícia pelo mercado, a própria Bolsa de Valores caminhou em queda, na última terça-feira, 20.

Após a aprovação da lei que autoriza a abertura do crédito extraordinário, a Ibovespa recuou 0,72%, a 120.062 pontos. “Essa queda ocorreu porque como o orçamento que afeta o setor produtivo, atinge também e o mercado e, por consequência, o investidor, que recebe essa notícia com cautela e muita ressalva”, explica. O ponto positivo que se é possível enxergar até o momento, para a economista, foi o simples destrave e andamento do Orçamento “que já vinha emperrado desde o fim de 2020”.

“Toda essa questão orçamentaria também tem um fundo político, e como a economia e a política andam juntas, muitas vezes é difícil separá-las. Esse orçamento prevê mais liberdade ao governo. Se o governo quiser gastar, muitas vezes ele não vai pedir a validação do congresso para isso, então é aquela coisa: por um lado, livrou o presidente do crime de responsabilidade fiscal, mas mais uma vez onerou o setor produtivo”, concluiu a economista.