Que meio ambiente o quê? Eu quero o ambiente inteiro!

21 novembro 2015 às 13h18

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Prefeito de Palmas não aplica como deveria recursos advindo de compensação por danos ambientais causados pelo lago do Lajeado à capital

Dock Junior
Um dos instrumentos mais interessantes da democracia brasileira é, sem dúvidas, a Lei nº 12.527/2011 que recebeu o codinome de Lei de Acesso à Informação. Quase perfeita, caso fosse obedecida à risca pelas entidades citadas em seus artigos, seria um poderoso mecanismo de fiscalização a serviço do cidadão.
Todavia, como quase sempre ocorre, os órgãos governamentais não alimentam os portais da transparência como exigido pela norma, deixando-os ora sem as informações necessárias, ora com dados incompletos. Verdadeiramente curioso como isso se tornou rotina. E o pior: os entes públicos contam com a inércia e anuência da população e também dos órgãos fiscalizadores. Ficou fácil.
Exceto em anos eleitorais ou em finais de mandato – em que se torna necessário que a publicidade venha à tona – os portais vivem às moscas. A Lei 12.527/11 é praticamente letra morta durante o curso dos mandatos.
Um exemplo clássico é a Prefeitura de Palmas (TO), atualmente capitaneada por Carlos Amastha (PSB), “carinhosamente” apelidado de Carlos Amas-Taxa pelos eleitores da capital tocantinense. O portal desta prefeitura – como a maioria dos sites dessa natureza – é confuso e nada esclarecedor. Após um intensivo curso, talvez o contribuinte consiga entender o mecanismo de funcionamento da página na web. No entanto, o usuário “enxergará” apenas o que o gestor deseja. Os dados acerca da arrecadação, exemplificativamente, estão catalogados até 2015. Mérito? Não. obrigação, apenas. E os dados concernentes às despesas? Só foram inseridos até 2014! Já decorreram 11 meses de 2015 e não há informações concisas até o presente momento.

Pois bem. A incursão pelo site se deu exatamente no intuito de descobrir onde o município vem aplicando os recursos recebidos da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). Poucos sabem, mas a cidade de Palmas recebe daquela entidade, todos os meses, uma compensação financeira de recursos hídricos, provenientes dos danos ambientais causados pelo lago do Lajeado à capital. A Investco, gestora da usina, recolhe à Aneel, 6,75% do valor da energia produzida pela usina. Desse valor, 0,75% ficam com a Agência Nacional de Águas (ANA), e os 6% restantes são assim distribuídos: 10% para a União, 45% para o Estado do Tocantins e 45% para os municípios do Tocantins, ora impactados.
Entre janeiro e outubro de 2015, a cidade já foi contemplada com R$ 1.723.577,87. Desde o fechamento das comportas da usina e o consequente enchimento do lago, em 2002, já foram repassados à prefeitura palmense R$ 18.426.681,23. Um valor significativo, sem dúvida.
Resta claro que esta verba é fruto da compensação financeira a municípios atingidos por reservatórios de usinas hidroelétricas. Por raciocínio e critério lógico, pelo menos parte desse montante deveria ser aplicado no fortalecimento do sistema de gestão dos recursos hídricos e ambientais do município de Palmas. O poder discricionário acerca da utilização desse montante em outros setores não é uma ilegalidade explícita, entretanto, caracteriza-se como imoral e antiético ou mesmo um desvio de finalidade não aplicar, pelo menos parte, em projetos ambientais.
É intrigante. O prefeito anterior, Raul Filho (PR), destinava esses recursos à Secretaria de Ciência e Tecnologia, o que não era totalmente correto, contudo, mais compatível.
Já Amastha destinou as verbas recebidas a este título em 2015, pela Prefeitura de Palmas junto à Aneel, de acordo com Lei Orçamentária Anual (LOA) à Secretaria Municipal de Desenvolvimento Rural. O dinheiro foi utilizado na manutenção de estradas vicinais – R$ 1.500.000,00, aproximadamente 80% – e ainda na construção de uma fábrica de farinha, na implantação de unidades demonstrativas de técnicas aquícolas e na estrutura da feira de Taquaralto. Pasmem! Nem um só centavo aplicado na recuperação do meio-ambiente.
Presidido por Germana Pires Coriolano, o Conselho Municipal do Meio Ambiente (CMMA), que rege o Fundo Municipal do Meio Ambiente, previsto na Lei Municipal nº 1011/2001 – através do expediente nº 006 de 02/09/2014, recomendou expressamente ao prefeito – com base na Lei Federal no 8.001/1990, com modificações dadas pelas Leis no 9.433/1997, no 9.984 e no 9.993/00 ambas do ano 2000 – a destinação de pelo menos 50% do total das parcelas dos recursos financeiros provenientes das compensações ambientais para execução dos programas e ações de gestão ambiental do município de Palmas.
E qual foi a conduta do gestor? Até a presente data, ele e seus auxiliares não se dignaram sequer a responder a referida recomendação.
A título exemplificativo, o governo do Estado do Tocantins destina 30% dos recursos recebidos sob essa rubrica ao Fundo Estadual de Recursos Hídricos (Ferh). Aliás, ainda está vivo na memória a medida provisória assinada pelo ex-governador Sandoval Cardoso que extinguiu esse repasse. Depois de um quiprocó, o governador Marcelo Miranda e os deputados eleitos reverteram o equívoco, determinando que o repasse ao Fundo continuasse sendo realizado.
Nada mais justo. Como esses Fundos podem sobreviver sem tais verbas, que originalmente foram regulamentadas para proteger ou recuperar o meio ambiente? É plausível que esses recursos sejam reinvestidos em preservação das Áreas de Proteção Ambiental (APAs), na recuperação de nascentes, no combate a incêndios das matas ciliares e do Cerrado, em operação e manutenção da rede hidrometeorológica, aquisição de sensores de nível, umidade e de chuva, bem como em implementação das redes de qualidade de água.
É sabido que o homem está acabando com a vida na Terra. A degradação tem proporções dantescas e afeta diretamente a sociedade e a economia. Estima-se que a perda da biodiversidade custe ao mundo entre 2 trilhões e 5 trilhões de dólares ao ano. São necessárias regras e mais regras para não permitir que o ser humano acabe por inutilizar o próprio lugar onde vive.
As legislações, na sua maioria, já existem. Alguns iluminados visionários as criaram no afã de impedir o extermínio da raça humana na Terra. Cabe ao poder público executar as leis e fomentá-las de forma tal que possam produzir resultados práticos.
A Prefeitura de Palmas, infelizmente, transita na contramão da história. Há poucos dias, o prefeito alterou a destinação dos recursos doados pela Foz/Saneatins ao município. Antes direcionados para a cultura, hoje são gastos em custeio e pessoal. Ora, onde está a surpresa? Quem não está preocupado sequer em preservar o meio ambiente estaria comprometido com a cultura e o lazer, considerados por ele, por assim dizer, supérfluos?
É lamentável.