Quanto mais mexer, menor a chance de ser votada no Congresso
13 dezembro 2014 às 11h10
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Historiador Marco Antônio Villa afirma que financiamento público de campanha é para “enganar trouxa”, porque o PT tem formas próprias de se financiar, como o petrolão
Cezar Santos
Há mais de uma década a reforma política está em tramitação na Câmara dos Deputados. Dezenas de propostas sobre pontos específicos, como voto proporcional, majoritário, lista fechada, lista aberta, fidelidade partidária e coligações são discutidos. Entre os pontos mais polêmicos, está o financiamento público de campanha.
A expectativa é que o segundo mandato de Dilma Rousseff seja marcado pelo “desenroscar” dessa pauta, que ela disse ser uma de suas prioridades. “A primeira e mais importante deve ser a reforma política. Meu compromisso, como ficou claro durante toda a campanha, é deflagrar esta reforma, que é a responsabilidade constitucional do Congresso, e que deve mobilizar a sociedade por meio de um plebiscito”, afirmou em seu discurso de vitória da reeleição.
Mas há quem não acredite na realização desse compromisso, principalmente, pelas dificuldades políticas devido ao clima negativo da corrupção que virou verdadeira epidemia no governo federal. O historiador Marco Antonio Villa, um dos mais ácidos críticos dos governos petistas, afirma que, apesar da importância da reforma política, dificilmente o Congresso vai tratar desse tema em 2015. Isso porque, entre outras coisas, o petrolão chegando ao Supremo Tribunal Federal (STF), esse tema tão complexo não entraria na agenda do Congresso. “Vai ser um salve-se quem puder quando o petrolão chegar lá (risos) no Congresso.”
Segundo o historiador — que integra a bancada de comentaristas do melhor telejornal da TV aberta brasileira, o Jornal da Cultura —, a discussão sobre reforma política nesse momento, quando o País passar por uma grave crise política, só serve para distrair a atenção, desviar o interesse daqueles que acompanham a cena política brasileira. Para ele, trata-se de mais uma jogada casuística da presidente Dilma, já que as denúncias de corrupção na Petrobrás vão se avolumando, e ela joga o tema de reforma política no ar, e aí se começa a falar em constituinte exclusiva para tratar de determinados pontos da Constituição, etc.
Marco Antonio Villa também duvida do resultado de uma reforma política que fosse realizada nas atuais circunstâncias. Segundo ele, quanto mais propostas sejam apresentadas, mais difícil será o debate efetivo e a consequente votação. “O fundamental é mexer o mínimo possível. Quanto mais extenso for o alcance da reforma política, menor a possibilidade de ela ser votada. Quanto mais propostas sejam apresentadas, mais o jogo fica embaralhado, o que torna menor a oportunidade de qualquer tipo de reforma.”
Villa lembra que 2015 será um ano de estagnação econômica, em que deveremos crescer no máximo 0,5%, variando de zero a meio. Ele afirma que com a crise advinda do petrolão e seus desdobramentos, é difícil caminhar num projeto de reforma política, que atinge diretamente os partidos e diversos interesses corporativos e de negócios patrocinados por bancadas e por parlamentares. “Isso (votação) dificilmente ocorrerá.”
Cláusula de barreira
Mesmo cético com o desenlace da reforma política, o historiador Marco Antonio Villa não se furta a comentar o tema. Ele diz, por exemplo, que a cláusula de barreira seria uma verdadeira revolução. Os partidos teriam de ter um mínimo de votos em todo o País, dividido por número “x” de Estados, talvez em um terço das unidades da Federação, etc. “Se, por exemplo, o quociente mínimo nacional fosse 3%, puxa vida, diminuiria o excesso de siglas. No ano que vem, teremos 28 partidos representados no Congresso, o que é muito. Com a cláusula de barreira, se derrubaria seis ou sete partidos. Isso seria uma revolução.”
A depuração partidária, diz Villa, por um lado daria recursos do fundo partidário só a quem tem representação no Congresso, o que acaba com os partidos de aluguel que proliferam no País, a cada dois anos, a cada eleição. Por outro lado, começaria a dar unidade política e ideológica aos partidos, que com o passar das eleições passariam a ter cara, ideias. Isso é essencial para a democracia, diz.
E no caso daquele candidato que recebe votos suficientes, mas o partido não alcança a cláusula de barreira? Nesse caso, o candidato ingressaria numa federação. Ou seja, haveria uma federação no Congresso, de deputados eleitos por partidos que não conseguiram o quórum mínimo, de forma que eles não perderiam o mandato, respeitando a vontade do eleitor. E haveria um processo de transição por algumas eleições, até a fixação definitiva da cláusula de barreira.
Marco Antonio Villa lembra que, por incrível que pareça, a cláusula de barreira chegou a passar no Congresso e foi derrubada no Supremo Tribunal Federal (STF), porque era necessário um quórum constitucional no Congresso, para uma proposta de emenda constitucional (PEC), porque havia alterações na Constituição que tinham de ser discutidas. “O Supremo acabou agindo corretamente, porque o processo aprovado pelo Congresso Nacional foi defeituoso.”
Outras medidas, como mudança de voto, voto distrital, distritão, distrital misto ou proporcional, dificilmente serão adotadas no Brasil, acredita Villa. Também o voto facultativo, que tem sido muito discutido atualmente, dificilmente passará. “A verdade é que entre umas e outras, essas medidas não serão aprovadas.”
“PT fez atalho no financiamento de campanha e criou o petrolão para si”
O historiador Marco Antonio Villa tece duras críticas à proposta do financiamento exclusivamente público de campanha, medida que está em julgamento no Supremo, e que tem sido vendida como se fosse uma panaceia, um remédio capaz de resolver todos os problemas do nosso sistema político-eleitoral. “É outro grave equívoco, porque o PT já tem uma maneira própria de financiamento, que é o petrolão. Isso ficou provado. Enquanto estava todo mundo discutindo formas de financiamento de campanha, o PT fez um atalho e criou o petrolão.”
Segundo o acadêmico, o desvio de dinheiro em contratos firmados pela Petrobrás com empresas se revelou uma forma de financiamento exclusiva para o PT, com um restinho de migalhas para o PMDB e o PP. “Mas o grosso do roubo vai mesmo para o PT, isso já foi confessado pelos delatores do esquema de roubalheira na Petrobrás. O senhor Mendonça Neto já disse que entregava ao Vaccari Neto, tesoureiro do PT, que mandava os representantes Tigrão, Melancia e Eucalipto para receber (as propinas). Veja que chegamos ao ponto de Tigrão, Melancia e Eucalipto se transformarem em referência para o País. A república petista enxovalhou nosso País.”
Marco Antonio Villa se refere ao executivo Augusto Ribeiro de Mendonça Neto, da empresa Toyo Setal (envolvida no escândalo da Petrobrás), que firmou acordo de delação premiada e disse em depoimento à Justiça que parte da propina recolhida pelo suposto esquema criminoso na estatal foi repassada para o caixa do PT, por meio de doações oficiais, entre 2008 e 2011. Segundo Mendonça, os repasses começaram após uma reunião entre o empresário e o tesoureiro do PT, João Vaccari Neto, na sede do partido em São Paulo. Em acordo, teria sido estabelecido o valor de R$ 4 milhões em doações no período de três anos. Tigrão, Melancia e Eucalipto seriam intermediários nesse esquema.
“Portanto, financiamento público de campanha é uma falácia, é para enganar trouxas. É uma jogada, porque o PT tem outros meios de financiamento, como sindicatos. Eles arrumam mecanismos… a lei para o PT não serve para nada, ele ignora a lei. O PT tem um projeto criminoso de poder, usando a expressão do ministro do Supremo Celso Mello dita no julgamento do mensalão, e não está nem aí para a lei, para a Constituição, pouco se importa com isso”, afirma Villa.
Segundo o historiador, o que o PT quer é se manter ad aeternum no poder. Ele observa que o partido está, infelizmente, obtendo êxito até agora. Ele diz que vai chegar um momento em que “a casa cai, é sempre assim”. Villa diz que muitos acham que na história as coisas duram para sempre. Exemplifica com Hitler, na Alemanha, que imaginou o Reich de mil anos, mas só durou 12. “No Brasil, em 1940, quando do Estado Novo de Getúlio Vargas, imaginou-se que não ia acabar nunca, mas acabou cinco anos depois. Agora também, com o PT, logo vai haver uma virada e aí, depois, vai se ver o mal que isso fez ao País, o mal que significou a corrupção, a República carcomida.”