Iris Rezende deve explicações à memória de Goiânia

20 agosto 2016 às 11h13

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1969, 1986 e 2016: anos que marcam a busca para entender o que aconteceu com um dos monumentos mais importantes da capital

Pedro Célio Alves Borges e Mauro Rubem
Especial para o Jornal Opção
O retorno de Iris Rezende às eleições parece a volta de quem não foi. Descontada a simulação da aposentadoria, a esperada surpresa cai na conta do pitoresco eleitoral. O importante é que, como candidato, ele poderá ajudar a esclarecer a demolição do Monumento ao Trabalhador. A data e a responsabilidade política no episódio continuam fugidias ao registro historiográfico.
Antes, afirmamos que as colunas foram ao chão em 1987, por ordem de Joaquim Roriz, então interventor na Prefeitura de Goiânia. Entretanto, duas entrevistas posteriores sugerem que 1986 pode ser a data correta. O ex-prefeito Daniel Antônio afirma que em sua posse no cargo, a 1º de janeiro de 1986, as obras da nova Rodoviária já estavam avançadas, afetando todo o entorno da Estação Ferroviária.
Mesmo com a memória do fato difusa e imprecisa, Daniel recorda-se que as obras ficaram na alçada exclusiva do governo estadual. Nem ele nem Roriz poderiam ter tido acesso aos níveis decisórios dos projetos e intervenções. O poder do governador Iris Rezende era ultracentralizado, quase onipresente no estado. Naquela obra, então, a de maior visibilidade do mandato, nem se fala. Após deslocar-se para o ministério no Governo Sarney, o poder de Iris assim prosseguiu.
No segundo depoimento, o engenheiro Julio Cesar lembra-se com nitidez que, quando assumiu o comando das obras da Rodoviária, em janeiro de 1987, o monumento já não existia mais. Até os escombros haviam sido retirados da praça. O reavivamento de sua memória, que lhe dá segurança nesta declaração, vem em razão do seu escritório de trabalho ter sido instalado no prédio da Estação Ferroviária, exatamente em frente ao local do monumento.
Por ironia, o nome de Iris vinha atrelado à destruição do Monumento desde 1969. À ocasião, competia ao prefeito da cidade, ele próprio, limpar o piche derramado pelo Comando de Caça aos Comunistas sobre a pintura. Mas Iris nada fez, escudado no temor de represálias da ditadura. Um cuidado que alguns entenderam e compartilharam. Porém, um grupo de artistas procurou Iris, pedindo a recuperação ou restauração da obra de arte. Entre eles, Amaury Menezes e Siron Franco, que hoje integram o Movimento pela Reconstrução do Monumento (Relato de Amaury em Audiência Pública, a 6 de abril de 2016). O prefeito desdenhou e manteve o silêncio. De nada valeu, pois no mesmo ano os militares cassaram os seus direitos políticos e o retiraram do cargo à força.
Em 1986, em outra faceta do obscurantismo, tratores ceifam da Praça do Trabalhador as colunas que serviam de testemunha do crime cometido na ditadura. Foi o golpe definitivo contra o monumento. A se confirmar esta data e o seu contexto político, a responsabilidade pela destruição do Monumento ao Trabalhador recai sobre Iris. Ouvi-lo constitui tarefa necessária perante a verdade e a história.
Como costumam pensar os democratas, as campanhas eleitorais propiciam esclarecimentos e debates sobre os atos dos homens públicos. A arte e a cultura, sindicalistas e pesquisadores, a memória de Goiânia, enfim, aguardam, agora, a palavra de Iris.
Pedro Célio Alves Borges, professor do Programa de Pós-Graduação em Sociologia – FCS, UFG
Mauro Rubem, presidente Regional da Central Única dos Trabalhadores-GO