Historicamente em lados opostos, faculdades e iniciativa privada começam a se aproximar
04 março 2017 às 10h16
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Parque tecnológico da Universidade Federal de Goiás começa construção da segunda etapa e parte para a expansão da capacidade de desenvolver conhecimento voltado ao setor produtivo goiano
Augusto Diniz
“Ter uma indústria nacional forte e competitiva é estratégico para o País.” Essa importância destacada pelo ex-reitor da Universidade Federal de Goiás (UFG) e ex-secretário de Ciência e Tecnologia para Inclusão Social do governo federal, o doutor em Agronomia Edward Madureira, mostra o momento que vive o Brasil na mudança da relação da pesquisa acadêmica com o setor produtivo nacional.
Quando, em 2004, a Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), ligada ao Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovação e Comunicações (MCTIC), abriu edital para analisar projetos de instalação de parques tecnológicos no Brasil, a UFG começou o processo que deu origem, em dezembro de 2013, ao Centro Regional para o Desenvolvimento Tecnológico e Inovação (CRTI). “Esse distanciamento que é atribuído às universidades da sociedade tem várias razões, entre políticas e ideológicas, mas tem razões históricas que a gente não pode desconsiderar. O Brasil tem uma universidade muito recente que se intitula assim, com esse formato, a mais antiga é a Universidade de São Paulo (USP), que tem 83 anos.”
O CRTI é o primeiro passo da implantação de um parque tecnológico em uma área ao lado do campus Samambaia da UFG, em Goiânia, com área de 17,9 hectares. Com atuação no desenvolvimento de conhecimento tecnológico para ser aplicados nas áreas de infraestrutura, indústria farmacêutica, biotecnologia, alimentos e energias renováveis, está em construção o segundo prédio do espaço, onde funcionará a sede administrativa do parque tecnológico.
“Essa aproximação entre universidade e iniciativa privada é fato. Hoje as empresas já procuram a UFG para atender demandas de pesquisa específica às atuações de suas indústrias”, declara Edward. Se a USP, como instituição nesse formato, tem apenas 83 anos e é a mais antiga do Brasil, a Federal de Goiás tem apenas 56 anos. Apesar de sua Faculdade de Direito ter 118 anos de existência, como universidade a UFG tem menos da metade da história do curso.
Aproximação
Ao contrário de partes da América Latina, que tem universidades mais antigas, e com uma indústria distanciada do meio acadêmico, já há um trabalho conjunto da UFG, ao lado da Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC-GO), Instituto Federal Goiano (IF Goiano), Universidade Estadual de Goiás (UEG), Instituto Federal de Goiás (IFG) e UniEvangélica com instituições privadas. Entre os parceiros do CRTI estão a Federação das Indústrias do Estado de Goiás (Fieg), Finep, a Superintendência de Ciência e Tecnologia da Secretaria de Estado de Desenvolvimento Econômico, Científico e Tecnológico e Agricultura, Pecuária e Irrigação (SED), Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Goiás (Fapeg) e Federação de Agricultura e Pecuária de Goiás (Faeg).
Todos eles fazem parte do conselho gestor do que será o parque tecnológico da UFG. Na lista de empresas das indústrias alimentícia, farmacêutica e de mineração que já buscaram o CRTI para realizar pesquisas tecnológicas estão a JBS, Neo Química, Cargill e AngloAmerican. Para sair do papel foram aplicados R$ 20 milhões na estrutura física, que podem chegar a cerca de R$ 30 milhões quando incluídos equipamentos e laboratórios. Esses recursos vieram de emendas parlamentares da bancada goiana no Congresso, orçamento da UFG, governo federal, Finep e Fapeg.
O Parque Tecnológico Samambaia é descrito por Edward como o ambiente ideal para o favorecimento da inovação de tecnologia. “Enquanto o Brasil se situa entre os principais produtores de conhecimento do mundo, nós estamos muito atrás na produção de patentes.” Com conceito de espaço multiusuário e multi-institucional, a iniciativa surgiu com o avanço da legislação e o novo marco legal do setor de ciência e tecnologia no Brasil.
Romper barreira
A aproximação entre a iniciativa privada, governos e a pesquisa acadêmica, estabelecido como a tripla hélice para dar sustentação aos parques tecnológicos, é considerada a forma ideal para romper a barreira cultural e histórica entre universidades e indústrias. Enquanto o governo participa com a parte de infraestrutura, o setor privado encaminha a demanda de sua área de atuação e a universidade gera o conhecimento necessário. “Não é um espaço para realização de análise de rotina, são pesquisas destinadas a atender demandas que não utilizavam a estrutura das universidades.”
Havia um convênio firmado com o ex-prefeito Paulo Garcia (PT) para viabilizar a infraesturura urbana, de ruas, rede de água e esgoto e iluminação, do parque tecnológico, que está em discussão com a nova administração municipal. O projeto inclui inicialmente a construção do Centro de Inovação Tecnológica e Empreendedorismo para o Estado de Goiás (Citego), o prédio destinado à área de biotecnologia (com nome inicial de CT Infra), outro para a Fundação de Apoio à Pesquisa da UFG (Funape), a sede e um centro de convivência.
Fora a construção dos prédios previstos até o momento, há a previsão de que outros centros de pesquisa da UFG sejam construídos no parque tecnológico, além das empresas que se interessarem em instalar suas sedes no local. O processo de seleção da iniciativa privada passará por edital público. A escolha das empresas que se instalarão no parque, inclusive, deve levar em consideração a atividade exercida, como as voltadas para o desenvolvimento tecnológico e de pesquisa. Outros fatores, como a sustentabilidade da atividade empresarial e a produção de lixo serão observados.
“Há muitos conjuntos de professores que estão submetendo projetos para desenvolver centros naquelas cinco áreas aqui dentro, mas nós não sabemos em que velocidade isso virá”, explica Edward. Parte da estrutura já existente da UFG, como a incubadora de empresas, na Praça Universitária, também será instalada no parque tecnológico, além do fortalecimento desse trabalho com o prédio do Citego. De acordo com o ex-reitor da UFG, essa unidade será a responsável por criar o ambiente de inovação e empreendedorismo.
Laboratório aberto
Além do trabalho de pesquisa tecnológica voltado para a demanda das cinco áreas estabelecidas para a atuação do parque tecnológico, a parceria com outras instituições, órgãos, iniciativa privada e governos prevê a instalação de um laboratório aberto. O modelo no qual a UFG se espelha para essa experiência é o Fab Lab desenvolvido na Massachusetts Institute of Technology (MIT), em Cambridge, nos Estados Unidos.
A proposta aplicada pela MIT e gerenciada pelo Center for Bits and Atoms da instituição norte-americana inclui a disponibilização de impressoras 3D, fresadoras, tornos e todos os equipamentos necessários para incentivar o desenvolvimento propostas inovadoras. “Você é da comunidade e tem uma ideia, projeto ou solução tecnológica? Você vai ter livre acesso para desenvolver o seu projeto aqui dentro. O Citego vai ter mais espaço para empresas incubadas.”
O foco em construção de centros de excelência na pesquisa em áreas específicas para as cinco vocações identificadas na formatação do projeto do parque tecnológico — informática, indústria farmacêutica, alimentícia, biotecnologia e energias renováveis — é a aposta da UFG e das instituições parceiras no crescimento da aproximação entre universidade e iniciativa privada. Todo o projeto tem incentivo e apoio da Pró-Reitoria de Pesquisa e Inovação da instituição.
Benefícios fiscais
Em dezembro de 2013, quando o CRTI foi inaugurado, o governo estadual anunciou que incentivos fiscais seriam concedidos por meio do Programa Goiano de Parques Tecnológicos (PGTec). “Portanto, qualquer empresa da área de tecnologia de ponta que vir para este local terá 98% de desconto no ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços)”, disse o governador Marconi Perillo (PSDB) na solenidade.