A imagem do ministro da Fazenda está fortemente cristalizada com a crise econômica e arrocho. Ex-presidente do BC vem sendo apontado como preferido do ex-presidente Lula para eventual substituição

Henrique Meirelles: No governo Lula ele exigiu e teve autonomia para tocar a política fiscal do país | Valter Campanato/Agência Brasil
Henrique Meirelles: No governo Lula ele exigiu e teve autonomia para tocar a política fiscal do país | Valter Campanato/Agência Brasil

Afonso Lopes

O mercado é absolutamente implacável, e quando começa a se mover em uma direção geralmente provoca o que se chama de efeito manada. E é exatamente isso o que está ocorrendo neste momento em relação à permanência ou não do ministro Joaquim Levy, da Fazenda. Na quinta-feira, 12, um boato dizendo que sua queda é questão de tempo, provocou reação positiva imediatamente em todos os setores sensíveis do mercado, como Bolsa de Valores e câmbio. O nome de Henrique Mei­relles, ex-presidente mundial do Banco de Boston e ex-presidente do Banco Central do Brasil durante o primeiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, é o único que aparece como provável substituto de Levy, e teria inclusive a preferência declarada de Lula para o cargo. Mas seria ele o melhor player para o jogo duríssimo que se trava para conter os efeitos mais perversos do ajuste fiscal?

A passagem de Meirelles pelo Banco Central foi coroada pelo êxito. Nos idos de 2002, durante a campanha eleitoral, era fortíssima a desconfiança de amplos setores do mercado de que eventual governo de Lula levaria o país a um radicalismo esquerdista absurdo. Ao ponto de o marqueteiro da campanha, e apontado como um dos principais responsáveis pela construção de imagem de um PT menos radical e um “Lulinha paz e amor”, o mago Duda Mendonça, ter escrito um conjunto de princípios que ficou conhecido como ”Carta ao Povo Brasileiro”, onde Lula assegurou que manteria os contratos e não quebraria a ordem natural da economia. Ao contrário, daria prosseguimento à política econômica do presidente Fernando Henrique e corrigiria os pontos negativos.

Inquietação

Ainda assim, e já no final da campanha, quando se esperava a confirmação da vitória de Lula também no segundo turno, a inquietação foi geral. Os preços começaram a subir e a inflação revelou seu lado oculto. Depois da vitória, Lula teria procurado soluções para a economia que criasse laços com a harmonia do mercado e, mais do que isso, pudesse gerar confiança na população, ávida, sim, por mudanças, mas sem pirotecnia esquerdista.

Não foi fácil chegar ao nome de Hen­rique Meirelles, recém-eleito de­pu­tado federal mais votado de Goiás nas eleições de 2002 pelo PSDB. Con­forme se especulou na época, o presidente bateu às portas de muitos economistas e profissionais do mercado, mas ninguém teria topado a empreitada. A desconfiança geral é de que o presidente do BC sob o governo de Lula seria mera figura de­corativa. Sem alternativas, Lula acatou setores que sugeriam Mei­relles. Ele topou, mas pediu certa autonomia para implantar uma política que julgasse eficaz na condução do BC. Lula pagou pra ver, e o casamento se revelou perfeito.

Quando desembarcou na presidência do Banco Central, Meirelles estabeleceu um duro controle da moeda, e apertou as taxas de juros para derrubar a inflação a marretadas. Havia naqueles dias um residual expressivo de inflação de demanda, registrada quando o consumo interno se transforma de solução em problema no eterno e necessário equilíbrio entre produção e abastecimento. Hoje, Levy usa a mesma arma para uma inflação de natureza diferente. Não há, e nem houve, excesso de consumo, mas desequilíbrio nas contas do governo. Se corrigido esse problema, a inflação recua naturalmente, desde que não aconteça um processo intenso de reindexação, o que por sinal já começou a ocorrer.

Joaquim Levy: o maior problema é a falta de independência
Joaquim Levy: o maior problema é a falta de independência

Independentemente de qualquer outra coisa, Meirelles seria, sim, o melhor nome para substituir Joaquim Levy no Ministério da Fazenda. Não apenas pelo bom desempenho que teve antes como presidente do Banco Central, mas por ter a confiança do mercado. Ele é melhor porque geraria uma expectativa positiva de mudança de rumos na condução da economia, que ultimamente só tem conseguido gerar notícias ruins. Meirelles representaria, portanto, uma injeção de ânimo.

Mesmo quando se faz uma comparação analítica com outras situações, ainda assim o ex-presidente do BC leva vantagem. Supondo que num grande acordo nacional, o ministro da Fazenda seja indicado pelo PSDB. O preferido de Aécio Neves, conforme ficou claro durante a campanha eleitoral, é Armínio Fraga. Seria seis por meia dúzia. Armínio deu declarações recentemente fazendo apenas uma crítica leve em relação às medidas adotadas por Levy até agora: prometeria, se fosse ele o ministro, um superávit menor desde o início. É claro que essa situação é absolutamente improvável. Nem o PT gostaria de ter como parceiro o PSDB nem os tucanos aceitariam embarcar como coadjuvantes no governo dos petistas. Vale essa comparação portanto apenas como livre exercício do raciocínio sobre a imagem que poderia ser gerada. Meirelles ganha em todas as situações.

Mas ele conseguiria consertar o estrago nas contas públicas? Provavelmente, a reação positiva do mercado em relação ao seu nome não foi desmotivada. Meirelles só toparia essa empreitada perigosa se tivesse plena autonomia para cuidar do dinheiro de uma ponta, a arrecadação, até a outra, os gastos. Levy teve plena poderes para abrir todas os pacotes de maldades que julgou necessário, mas nunca teve pleno controle como Meirelles exige. Ao contrário, o atual ministro vive uma eterna disputa por prestígio com o seu colega do Planejamento, Nelson Barbosa. Isso não poderia dar certo. E não deu. Meirelles, enfim, é a esperança e aposta de que ainda é possível corrigir o que está errado.