Com Lula enfraquecido, centro ensaia desembarque e articula por protagonismo nas eleições de 2026

05 julho 2025 às 21h00

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Partidos de centro já ensaiam e planejam um desembarque do atual governo, liderado por Luiz Inácio Lula da Silva (PT), até o final deste ano. Estes já articulam um cenário sem o petista nos holofotes das eleições de 2026. Muito marcado por embates com o Congresso Nacional, o governo Lula está enfraquecido e este pode ser o momento ideal para uma ascensão de poder do centro.
O deputado federal José Nelto (UB) reafirmou o desembarque do União Brasil e Progressistas desta gestão. Ao Jornal Opção, ele disse que a saída é natural e deve ocorrer até o final do ano. “O partido tem candidato, que é o governador Ronaldo Caiado (UB). Ele é o candidato. Se ele não for ele, será outro. Será o Tarcísio, será o Ratinho. Não é mais o atual presidente da República. Eu acho que ele já cumpriu um ciclo, do meu ponto de vista”, disse.
Ele ainda defendeu que os ministérios sejam entregues em nome da “governabilidade”. Juntos, União e PP têm três ministérios: Celso Sabino (União) lidera o Turismo, Frederico Siqueira Filho (União) na pasta das Comunicações, enquanto André Fufuca (PP) está com Esportes. “Nós temos que entregar os ministérios e ajudar na governabilidade do Brasil […]. Esse é o compromisso do partido, mas [o desembarque] já está claro”, disse.
Já segundo o deputado estadual George Morais, do Partido Democrático Trabalhista (PDT), disse que desde a última reunião, o partido tem priorizado certa independência do governo. Para ele, este é um sinal de afastamento, mas a possibilidade de desembarque deve ser pauta das próximas reuniões do partido, e que deve-se respeitar a “vontade da maioria”.
Para José Nelto, o país está ficando ingovernável, principalmente por conta do embate sobre o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), que estourou uma crise política entre o Executivo e o Legislativo. “A crise do IOF fez acelerar o descontentamento da bancada da União Brasil e do Partido Progressista com o governo. Isso é balela quando o governo fala que aumentar o IOF vai atingir os ricos. Conversa fiada. Quem paga o IOF é realmente quem usa o cartão de crédito. É a classe média. É o trabalhador”, disse ele.
Crise do IOF
Quanto ao aumento da taxação dos ricos, enquanto o Planalto defende uma justiça tributária, o Congresso não aceitou aumento algum de imposto sem que o governo revisasse os próprios gastos. Liderado pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), o governo tenta alterar as alíquotas do IOF para aumentar a arrecadação e cumprir a meta fiscal de 2025 e equilibrar o orçamento. No entanto, o Legislativo não concordou com o aumento de impostos e aprovou a derrubada de decretos do presidente Lula que aumentavam o imposto.
Por 383 votos a 98, o decreto que aumentaria o IOF foi revogado pelos deputados, o que representou uma grande derrota para o Governo Federal. Então, o Executivo recorreu ao Supremo Tribunal Federal (STF), em ação. A disputa fez com que o ministro Alexandre de Moraes marcasse uma audiência de conciliação entre as partes, agendada para 15 de julho, em Brasília.
Para a cientista política Letícia Mendes, esta crise foi apenas mais um catalisador dos problemas que Lula já enfrentava com o Congresso e sua crescente impopularidade – o petista lidera a rejeição entre os eleitores com 46%, segundo o DataFolha. Mencionando os problemas polêmicos e desgastantes com o PIX e o INSS, ela explica que com o enfraquecimento do governo, “os partidos já observam que não faz tanto sentido estar nesses espaços, ter sua imagem vinculada a esse apoio ao presidente Lula”.
José Nelto, deputado, defendeu que a crise com o Governo Federal começou no IOF e foi avisada para o governo. “Agora, temos que buscar alternativas. O país está ficando ingovernável. Até porque o que o judiciário está legislando, invadindo as prerrogativas constitucionais do poder legislativo. O poder legislativo está avançando também no executivo, querendo executar”, disse ele.
Para o cientista político Marcos Marinho, o mais grave é como o Centrão “vai continuar sempre tentando ‘extorquir’ o executivo”. Ele ainda afirma que Lula não está sabendo se defender e como recuperar o apoio da população. “[Lula] está sucumbindo a esse tipo de extorsão. O legislativo brasileiro hoje ele vive num processo de coação em relação ao executivo”, disse ele.
“O Centrão é completamente focado nos seus próprios interesses. Apesar de ser uma massa aparentemente amorfa, de vários partidos e várias lideranças, há uma demanda em comum de manutenção do espaço de poder que eles conquistaram. E esse espaço existe por conta do enfraquecimento do Executivo”, disse o cientista político Marcos Marinho.
Imagem deteriorada de Lula
Após anos de dicotomia política entre a esquerda e direita brasileira, em 2026, o presidente deve ser um representante do centro. Para Marcos Marinho, abandonar o governo Lula é apenas parte do projeto próprio do centro e representa um aceleramento na degradação da imagem do atual presidente, que já está balançada.
“Ao se afastarem dessa condição de participantes diretos, porque muitos partidos têm ministérios, eles vão simplesmente deixar a conta toda só para o Lula e para o PT”, afirma Marcos em entrevista ao Jornal Opção.
Desde o início da gestão, o governo não tem conseguido reforçar o legado histórico de Lula, segundo a cientista política Letícia Mendes. Para ela, parte do problema é a falta de mecanismos de comunicação. Isso afeta diretamente a imagem do governo e faz com que Lula perca força, tanto com a população, quanto dentro do Congresso Nacional. “É necessário que o governo tenha uma imagem robusta e consolidada para que consiga avançar com as políticas públicas que têm interesse”, afirmou ela.
“Como ele não consegue externar para a população que as responsabilidades também precisam ser compartilhadas, no fim, a responsabilidade é dele. O Lula que aceita essa condição de manter os cargos e os ministérios de partidos que estão indo contra ele, então é complicado. Eu entendo que é muito complicado hoje ver como é que o governo Lula pode se recuperar ao nível de chegar combativo e fortalecido para a disputa de 2026”, disse Marcos.
Presidente do centro
Quanto ao PDT, parte da legenda defende o desembarque e outra parte defende aproximação, pensando em 2026. Segundo Letícia, cientista política, ainda é cedo para os partidos defenderem essa posição que dependerá da influência dos líderes políticos em determinadas regiões (como o próprio Lula e o Nordeste), o que deve dar corpo às eleições regionais, e ainda das Federações. Tudo isso pleiteando as eleições de 2026.
Com a diversidade de legendas, é difícil que o centro se organize em um único nome para a presidência. Mesmo assim, o próximo presidente precisará de seu apoio para se viabilizar, diz Letícia. A cientista política acredita que os partidos do centro devem colocar candidatos no jogo de forma mais independente e, somente no segundo turno, devem se agrupar.
“No cenário nacional, principalmente de presidenciáveis, vai depender muito da popularidade do governo e da figura do presidente Lula. Mas o Centrão, historicamente, realmente tem esse perfil de se aliar a quem está melhor colocado ali no jogo político, e no momento, a gente sabe que a centro-direita está um pouco mais consolidada em relação a esse cenário”, afirmou Letícia.
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