Aos 80 anos, escritor mineiro já leu mais de 900 obras

Com os seus óculos simples e singelos, José Maria Alves (80), rotineiramente, chega a mais um destino do mundo literário. A poltrona, posicionada em sua sala de estar, tem sido o seu canto ideal para embarcar nas aventuras literárias. Ao longo da vida, o escritor mineiro pôde viajar pelo mundo inteiro por meio das palavras. Desde sua infância, a paixão pela leitura já era algo que se manifestava com tamanha intensidade. Nessa jornada, foram palavras doces, cortantes, ácidas, sábias, doloridas e, muitas vezes, inquietantes. “Minha mãe já dizia: ‘meu filho, quem lê viaja’. Isso despertava em mim o interesse pela leitura”, enfatiza. José viajou e muito: foram tantas idas e vindas nos vagões das entrelinhas que um dia decidiu ter os seus próprios passageiros. Desde então, passou a se dedicar aos seus escritos. Para ele, “a arte transcende a palavra”, e foi nesse “transcender” que  a busca infinita pelas viagens poéticas se tornou cada vez mais frequente em seu cotidiano.

Nascido em 1940, na cidade de Tiros, interior de Minas Gerais, o escritor José Maria Alves, a cada dia, completa destinos literários ainda mais enriquecedores e carregados de sabedoria. Dessas viagens, os seus companheiros preferidos têm sido Fiódor Dostoiévski (1821-1881), John Steinbeck (1902-1968), Guimarães Rosa (1908-1967) e Gabriel García Márquez (1927-2014). Autor do livro “O Relógio”, publicado em 2007, o escritor mineiro, ao longo da vida, já leu mais de 900 livros. De “Grande Sertão Veredas”, de Guimarães, a “Crime e Castigo”, de Dostoiévski. Entre diversas obras literárias, já são quase “Cem Anos de Solidão” que se desdobram incessantemente em “A Terceira Margem do Rio”. E, entre um palavra e outra, José foi construindo a sua jornada. 

Em 2015, o escritor mineiro resolveu eternizar parte de suas vivências com o poema “Brumas Esvoaçantes”. Entre uma metáfora e outra, José Maria traz uma reflexão ímpar sobre as sensações frutos das despedidas de grandes amores. As figuras de linguagens, trabalhadas pelo eu lírico, propicia ao leitor versos carregados de leveza, nostalgia e pura emoção. Em julho deste ano, a arte presente nas entrelinhas de “Brumas Esvoaçantes” ganhou corpo, rosto e alma com o projeto “Poesia em Cena”. Para o escritor, a literatura proporciona conhecimento e congraçamento a humanidade. “Ler é viajar, é conhecer, é sentir, é ser. É estar mesmo não estando lá. É ser parte de um tempo não vivido. É ser dono de uma história jamais protagonizada pela nossa imaginação. Ler é arte, e ela é o que complementa a vida”, enfatiza. 

Ao longo de sua jornada, os diversos livros presentes em sua estante foram os responsáveis por levá-lo as incríveis viagens literárias. Nesse itinerário de poesias, conhecimento, sabedoria e encontros peculiares com personagens clássicos da literatura mundial foram as melhores conquistas alcançadas por esse leitor que, sem dúvida, já deixa um legado muito importante para as futuras gerações. As leituras foram realizadas com tanta veemência que, em determinado momento da vida, José Maria decidiu criar os seus próprios personagens e exteriorizar a sua arte nas imensas entrelinhas de seus poemas. “Espero que alguma coisa do que eu tenho escrito seja, ainda que de maneira bastante restrita, ao menos um lampejo para alguém”, enfatiza.

Poesia em Cena

Idealizado pelo dramaturgo e diretor de teatro Danilo Alencar, o projeto “Poesia em Cena”, criado em julho deste ano, tem o intuito de dar visibilidade aos escritores regionais, além de valorizar a cultura local. “Dar vida ao poema “Brumas Esvoaçantes” é, sem dúvida, exteriorizar o que há dentro de cada um de nós. Assistir ao resultado desse trabalho é muito gratificante. É incrível imaginar que algo tão maravilhoso pôde ser eternizado”, enfatiza Danilo. 

Já para o artista Pablo Garcia, ator que criou a obra audiovisual baseada no poema, dar vida as entrelinhas e metáforas exteriorizadas por José Maria foi um grande desafio. “Como transformar em imagens palavras tão profundas sobre a saudade e a dor da partida? Me esbarrei em uma palavra que não cabia na minha boca e foi justamente essa palavra que me fez ter toda a ideia de um palhaço, o circo da vida”. Pablo explica que a concepção do vídeo foi trabalhada a partir das nuances vivenciadas a partir das relações humanas.  

“Falar sobre metáforas e entrelinhas é tão complexo porque um poema é uma porta onde leva cada um de nós para estradas diferentes. Acredito que quando um artista publica sua obra, ela não pertence mais a ele, ela é da vida, de todos, do campo das ideias”, destaca. O ator ainda explica que para a produção da obra audiovisual foi necessária uma porção de sensibilidade aliada a entrega interior de todo artista. “Meu trabalho como Filmmaker e ator foi simplesmente de entrar na porta que José Maria e Danilo me abriram, e mostrar o quero lá dentro. O resto é poesia”, enfatiza.

Sobre o autor

Graduado em História pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC GO), José Maria Alves é autor do livro “O Relógio” e dos contos (citar). Em 2005, ganhou o prêmio em terceiro lugar do concurso ARTE — Criatividade com o Povo Afro-brasileiro, realizado pelo SESI, com o conto “A Viagem”. No mesmo ano, o conto também recebeu premiação na Semana Afro-brasileira, realizada pela PUC Goiás.

Em 2007, o escritor teve o seu livro de contos “O Relógio” publicado pela “Coleção Goiânia em Prosa e Verso”. O projeto, idealizado pela Secretaria Municipal de Cultura (Secult), em parceria com a Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC GO) e Editora Kelps, tem o intuito de dar visibilidade aos escritores ingressantes da carreira literária.  José Maria também possui pós-graduação em História Cultural, pela Universidade Federal de Goiás (UFG), e em Docência pela Faculdade Evangélica de Rubiataba (FACER). Atualmente, José Maria é membro da Academia de Letras, Artes e Ciências dos Lions Clube Internacional — ALAC, leitor assíduo e escritor nas horas vagas.