Quem Rian Johnson pensa que é para transformar Luke Skywalker em um covarde ignorante que odeia ler?
Ademir Luiz
Especial para o Jornal Opção


Alerta o ditado popular que “a emenda pode sair pior do que o soneto”. No caso do filme “Star Wars – Episódio IX: Ascensão Skywalker” o soneto era tão terrivelmente ruim, leia-se o malfadado “Episódio VIII: Os Últimos Jedi”, que a emenda fez o que pôde e entre mortos e feridos (literalmente) salvaram-se quase todos. Este é o primeiro filme da história de Hollywood que tem como principal missão consertar as bobagens do capítulo anterior. Resultado: a última parte da terceira trilogia da saga Star Wars não me ofendeu, o que, em tempos de “Interestelar”, “Blade Runner 2049” e “Batman versus Superman”, já é muito. Contudo, está longe de ser perfeito. O fato de tratar-se de uma trilogia que descartou a parte do meio, que precisa sempre ser o elo mais forte da corrente, como ensinou “Poderoso Chefão – parte II” e o próprio “O Império Contra-ataca”, prejudica muito o resultado final do conjunto.
Faltou nesta empreitada cinematográfica a presença de um produtor forte que tivesse uma visão global do projeto. J. J. Abrams dirigiu o mediano “Episódio VII: O Despertar da Força” e deixou, em parceria com o roteirista Lawrence Kasdan, um esboço de roteiro para ser desenvolvido pelo cineasta que fosse continuar o trabalho de onde ele parou. Havia pelo menos uma direção para ser tomada. Por alguém motivo inexplicável, Rian Johnson resolveu ignorar tudo e, com a irresponsável anuência dos executivos dos Estúdios Disney, foi para o lado oposto. Saiu o respeito ao cânone de Star Wars de J. J. e entrou a ânsia por subverter expectativas de Johnson. Para o novo diretor, tudo o que imaginávamos que era Star Wars deveria ser desconstruído. Escreveu um novo roteiro em um final de semana e já partiu para pré-produção do “Episódio VIII”. Esse problema de egos inflados interferiu criativamente no produto cultural resultante. O longa-metragem desagradou muita gente, agradou alguns e dividiu a base de fãs. A guerra deixou de ser nas estrelas e passou a ser na internet. Cada um defendendo seu ponto de vista de forma intransigente e violenta. Eu mesmo fui um dos militantes da cruzada contra o herético Rian Johnson. Quem ele pensa que é para transformar Luke Skywalker em um covarde ignorante que odeia ler?


Seja como for, a Disney bateu o martelo e deu vitória para J. J. Originalmente, cada filme da trilogia seria dirigido por um cineasta diferente, mas J. J. Abrams foi reconvocado para arrumar a casa e reconciliar os fãs. Fez o que pôde. Mas dava para fazer melhor? Tenho certeza que sim. Como o filme que analiso nesta resenha foi feito para consertar outro, dou-me a liberdade de consertá-lo também. Segue nove sugestões (é o Episódio IX, afinal!) que fariam do encerramento da saga da família Skywalker o épico que os fãs mereciam ver, mas não viram.

Como produzir e dirigir um filme melhor

1 – Para além da personagem bidimensional
Rey é uma protagonista potencialmente interessante, mas foi apenas apresentada no Episódio VII e não foi desenvolvida no Episódio VIII. Seu arco dramático no Episódio IX foi uma correria, mas, prestando atenção, Rey se desenvolveu pouco. Continua, inclusive visualmente, a mesma. Nem troca de roupa. Só para comparar, Luke Skywalker em cada capítulo da Sagrada Trilogia teve sua evolução psicológica evidenciada pelas mudanças visuais. Passou de fazendeiro de umidade no Episódio IV para piloto da Aliança Rebelde no Episódio V até se tornar um cavaleiro jedi vestido de preto no Episódio VI. Deveriam ter feito algo semelhante com Rey. Imagino que uma reunião de meia hora com a presença dos responsáveis pelos departamentos de figurino e maquiagem resolveria isso. Não fizeram e Rey se cristalizou como uma personagem bidimensional.
2 – Darth Maul deveria ser o vilão
A volta do Imperador Palpatine foi uma má opção. Sabemos que isso aconteceu em função da morte precipitada do Supremo Líder Snoke em “Os Últimos Jedi”. Mas reviver Palpatine retira o peso dramático dos acontecimentos da Sagrada Trilogia. Tudo foi em vão. Uma boa solução seria colocar Darth Maul como vilão. Sabemos que ele sobreviveu ao duelo com Obi-Wan Kenobi no Episódio I, considerando sua aparição em “Solo”. Seria interessante que Darth Maul, que sempre foi um agente que atuou nas sombras, reaparecesse para confrontar Kylo Ren e ocupar o posto de Supremo Líder da Primeira Ordem. Mas Rey deixaria de ser neta de Palpatine? Sim, essa foi uma ideia improvisada e descartável. Devido as más decisões de Rian Johnson jamais saberemos qual era o plano original para sua origem. Lamentável.


3 – Retirada de arcos dramáticos inúteis
Retirar arcos dramáticos inúteis como a falsa morte de Chewbacca, a desnecessária perda de memória de C-3PO e a procura pelo GPS espacial. O filme ficaria menor, mais ágil e mais eficiente.
4 – Lando Calrissian poderia ter achado sabre
Um dos mistérios apresentados em “O Despertar da Força” era o motivo do sabre de luz de Luke Skywalker, perdido no duelo com Darth Vader na Cidade das Nuvens, estar com Maz Kanata, a dona do boteco espacial. Acho que seria cômico se o inveterado jogador Lando Calrissian, que foi coordenador da Cidade das Nuvens, tivesse encontrado o sabre e, em suas viagens pela galáxia, acabasse apostando-o e perdendo para Maz Kanata. Daria mais sentido a presença de Lando no filme.


5 – Kilo não deveria ter visão de Han Solo
Kylo Ren não deveria ter uma visão do falecido Han Solo. Na tradição de Star Wars se aparece um morto esse morto é um “fantasma da Força”, e, portanto, um jedi que se tornou parte da Força. Han Solo não era jedi. Mesmo que seja sugerido que se trata das memórias de Kylo Ren e não de uma aparição mística, esse tipo de cena causa confusão desnecessária e deve ser evitado.
6 – Fantasma da Força não interfere no mundo físico
A própria Rey deveria ter retirado a nave Asa X do mar, e não Luke Skywalker. Fantasmas da Força não podem interferir no mundo físico. Se existia essa habilidade, deveria ter sido usada antes. Muitos problemas poderiam ter sido evitados.
7 – Finn deveria ser líder e inspiração
O personagem mais mal aproveitado da trilogia foi Finn. A ideia de ele ser um stormtrooper é ótima, mas nunca foi aproveitada para fortalecer seu arco dramático. Ao longo de três filmes, Finn foi transformado em um Cirilo espacial perseguindo uma Maria Joaquina jedi. Um desrespeito. Mas tenho a solução perfeita para esse caso: na batalha final contra a frota de cruzadores espaciais do Império, Finn poderia pedir para abrir todas as linhas de comunicação com as naves inimigas. Faria um discurso sobre liberdade e livre arbítrio que inspiraria um motim dos stormtroopers, que se voltariam contra seus superiores e lutariam ao lado da Resistência. Finalmente, Finn se tornaria um líder e uma inspiração. Da forma como ficou, Finn só ajudou a matar outros infelizes que, como ele, foram sequestrados e escravizados pela Primeira Ordem.


8 – Poe Dameron deveria morrido em batalha
O piloto Poe Dameron, que prometia ser um grande personagem, mas acabou sendo apenas um Han Solo genérico, poderia ter morrido na batalha final. Esse sacrifício daria sensação real de perigo à sequência e promoveria Poe Dameron como um mártir da Resistência. Sobrevivendo, não passou de um galã latino de terceira categoria.
9 – Fora a comédia romântica!
Tire o beijo entre Kylo Ren (Ben Solo) e Rey. Star Wars não é comédia romântica.
Poderia listar muitas outras coisas, mas, por hoje, é só, pessoal.
O futuro de Star Wars
Mas qual será o futuro de Star Wars? Sei que existem muitos planos na Disney, tanto para o cinema quanto para a TV, além de outras mídias. O que eu acho?
Acho que, infelizmente, a terceira trilogia não conseguiu fortalecer o interesse pela saga Star Wars. Mais do que nunca, Star Wars tornou-se um produto anacrônico, datado. A verdade é que a Sagrada Trilogia entrou para a história do cinema, a controversa trilogia prequel teve sua importância, mas os novos filmes são apenas fast food cinematográficos. Produzidos industrialmente, consumidos preguiçosamente e totalmente esquecíveis. A Força perdeu a força.
Ademir Luiz é presidente da União Brasileira de Escritores de Goiás (UBE-GO) e professor da Universidade Estadual de Goiás (UEG). É colaborador do Jornal Opção.