A Polícia Civil de Goiás (PC-GO) instaurou um inquérito para investigar os crimes de desmatamento, utilização de fogo e drenos na bacia do Rio Araguaia, na região de Nova Crixás. Estima-se que existam mais de 20 quilômetros de drenos com o objetivo de secar as Áreas de Preservação Permanente (APP), veredas, lagos e lagoas naturais. A investigação foi deflagrada nesta segunda-feira, 20, por meio da Delegacia Estadual de Repressão a Crimes Contra o Meio Ambiente (Dema).

Titular da Dema, o delegado Luziano de Carvalho disse ao Jornal Opção que este é um dos piores crimes ambientais que ocorrem na bacia do Araguaia. “Quando se fala em desmatamento, estamos falando dos piores crimes ambientais que existem nesse país, nesse planeta”. A implantação destes drenos compromete e altera todo o ecossistema – como os lagos naturais que são verdadeiros berçários para peixes – além de diminuir a vazão de afluentes e o volume do Rio Araguaia.

A investigação busca identificar os possíveis autores dos crimes ambientais, mas o proprietário da fazenda ainda não foi ouvido pela Polícia. Destruir ou danificar floresta considerada de preservação permanente, ou utilizá-la com infringência das normas de proteção, é crime ambiental com pena de um a três de reclusão, além de multa.

Desmatamento extenso

A área desmatada equivale a 1.000 alqueires de terra, isto é, 4.840 hectares. Em termos comparativos, os 48,4 Km² desmatados correspondem a cerca de 7.067 campos de futebol. Um campo de futebol padrão tem cerca de 0,68 hectares.

“O desmatamento é o ponto inicial. Em seguida, vem a utilização do fogo. São construídas leiras, nas quais o fogo é iniciado. Para agravar a situação, ocorrem as construções de drenos. Utiliza-se uma escavadeira para criar valetas, cavas e canais, visando ao escoamento e à drenagem da água”, explica o delegado Luziano. Essas ações comprometem as lagoas e lagos naturais da região, uma vez que se trata de uma vereda (área de planície sujeita a inundação): um ecossistema úmido que representa verdadeiros oásis no Cerrado.

Refúgio da fauna

Essas áreas são férteis e servem como local de descanso, refúgio e reprodução para a fauna terrestre e aquática. Na região, é comum avistar dezenas de pirarucus nos canais, além de jaguares e jacarés de grande porte. Trata-se, portanto, de um reservatório natural de água, capaz de armazenar a água da chuva. Luziano de Carvalho explica que o reservatório funciona como uma Cidade Esponja, conceito almejado por países desenvolvidos.

“Ali, encontramos uma vereda que atua como uma esponja, liberando lentamente a água que acumula e alimentando as nascentes que por sua vez abastecem o lençol freático, recarregam os aquíferos e formam os riachos”, destaca Luziano Severino.

Além da presença de lagos e lagoas naturais, essa área possui nascentes e córregos, sendo que um deles, conhecido como Sangraduzim, nasce a pouco mais de dez quilômetros do local. Portanto, essas lagoas e lagos são verdadeiros berçários para a vida selvagem.

O Jornal Opção questionou a Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad) sobre quais as ações para combater o desmatamento e a contaminação do Rio Araguaia. Ainda não houve retorno.

Contaminação da água

Nas últimas décadas, o Rio Araguaia enfrentou uma considerável redução em sua vazão, impactando diretamente os quatro estados que atravessa: Pará, Mato Grosso, Tocantins e Goiás. Conhecido por seu ciclo sazonal, o rio experimenta seis meses de seca e seis meses de cheia, um padrão característico de sua dinâmica fluvial.

Dois estudos recentes destacaram a preocupante situação: um conduzido pela Universidade de Brasília (UNB) abordou o volume de água do rio Araguaia, enquanto outro, realizado pela Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), revelou que, ao longo de 40 anos, o rio perdeu 40% de sua vazão. Além disso, a pesquisa da UFMT identificou a presença de contaminação ambiental por agrotóxicos, com a detecção de pesticidas no ambiente aquático, agravando ainda mais a situação ambiental do rio.

O Ministério do Meio Ambiente constatou, por meio do plano de ação para prevenção e controle do desmatamento e das queimadas no cerrado, uma redução na vazão dos rios monitorados. Além disso, propôs um pacto com os governadores dos estados do cerrado, visando combater o desmatamento e promover a implementação de ações conjuntas de preservação ambiental.

Diferentemente da Amazônia, onde o Código Florestal protege 80% da área com cobertura vegetal nativa em propriedades privadas, no Cerrado a proteção é de 20%. No Cerrado dentro da Amazônia Legal, é de 35%. Estima-se que cerca da metade do desmatamento no bioma é autorizado pelos Estados“, disse o Ministério do Meio Ambiente em nota.

Sobre a contaminação da água a Semad disse não ter informações. Segundo a pasta, os dados sobre a água no Rio Araguaia é somente com a Superintendência de Vigilância em Saúde de Goiás. A Superintendência, no entanto, disse que monitora da captação e tratamento da água para frente, enquanto a Semad deve fiscalizar a água de rios e mananciais.