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Pela primeira vez na história, as Conferências Católicas do Sul Global – que reúnem bispos da África, Ásia, América Latina e Caribe – divulgaram nesta terça-feira, 1º, uma declaração conjunta exigindo dos líderes mundiais ações mais concretas e ambiciosas diante da crise climática. O documento foi apresentado em coletiva de imprensa no Vaticano e aponta a necessidade urgente de implementação efetiva do Acordo de Paris, além de cobrar metas mais ambiciosas nas Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs) e uma transição energética socialmente justa.

Representando cerca de 821 milhões de fiéis, segundo dados do Escritório Central de Estatística da Igreja do Vaticano, os três blocos continentais da Igreja Católica reforçaram o papel da instituição como voz ativa no debate ambiental global. A iniciativa marca uma pressão inédita e coordenada da hierarquia católica do Sul Global sobre os governos e a comunidade internacional, às vésperas da COP30, que será realizada no Brasil em 2025.

Entre os signatários do documento estão figuras de peso da Igreja, como os cardeais Jaime Spengler (Brasil), Fridolin Ambongo (Congo) e Filipe Neri Ferrão (Índia), além da teóloga Emilce Cuda, representando o Vaticano. A elaboração da declaração foi feita de forma coletiva por conferências e conselhos episcopais continentais, reforçando o caráter global e pastoral do apelo.

O documento denuncia retrocessos por parte de diversos governos em compromissos firmados nas COPs anteriores e responsabiliza diretamente os países desenvolvidos e grandes corporações pela intensificação da crise ecológica. Entre as ações anunciadas está a criação do “Observatório Eclesial de Justiça Climática”, que funcionará por meio da Conferência Eclesial da Amazônia e será responsável por monitorar a implementação das metas climáticas nos países do Sul Global e denunciar o não cumprimento dos acordos.

“A Igreja do Sul Global eleva seu clamor por justiça climática e cuidado com a nossa Casa Comum. Com coragem, oferece seu testemunho profético. Este texto reúne doutrina socioambiental e experiências práticas em diálogo com a ciência”, afirmou Dom Vicente de Paula Ferreira, presidente da Comissão Especial de Ecologia Integral e Mineração da CNBB.

Além de criticar o recuo das metas ambientais, o documento também repudia o avanço de falsas soluções ligadas ao chamado “capitalismo verde”, a financeirização da natureza e os impactos negativos de grandes projetos de mineração e energia que afetam comunidades vulneráveis. Para os bispos, o atual modelo de desenvolvimento global beneficia uma minoria e condena milhões à miséria, perpetuando desigualdades sociais e ecológicas.

O lançamento do manifesto ocorre em um momento simbólico, que marca os dez anos do Acordo de Paris e também da encíclica Laudato Si’, do Papa Francisco, um dos principais marcos da doutrina católica sobre a ecologia integral.

Para Lorna Gold, diretora-executiva do Movimento Laudato Si’, a mobilização da Igreja do Sul Global representa uma liderança moral diante da inércia de muitos governos. “Enquanto muitos Estados recuam em suas metas climáticas, a Igreja Católica se posiciona por soluções reais e justas para a crise. O Sul Global está mostrando ao Norte o que é liderança verdadeira”, afirmou.

Com esse posicionamento, a Igreja Católica reforça seu papel de guardiã da justiça social e ecológica, comprometida em não silenciar diante da degradação ambiental e das violações de direitos humanos. O novo observatório e a mobilização coletiva são um passo estratégico no caminho rumo à COP30, onde a expectativa é de que a voz do Sul Global esteja mais forte do que nunca.