Os ministros da primeira turma do STF estabeleceram critério do uso de algemas em menores de idade.  Cristiano Zanin, Alexandre de Moraes, Flávio Dino e Luiz Fux, acataram a recomendação da relatora, ministra Cármen Lúcia, para que o Ministério Público avalie a necessidade de algemar um menor após a sua apreensão.

Além disso, sugeriu-se que o menor seja encaminhado para uma entidade especializada ou, na falta desta, para uma delegacia separada dos adultos, e que a decisão sobre o uso de algemas seja submetida ao Conselho Tutelar para consulta.

O grupo de juízes também decidiu que os documentos devem ser enviados ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para que sejam tomadas medidas e estabelecidas normas para a implementação dos critérios.

Caso analisado

A queixa examinada no STF foi protocolada pela defesa de uma menor de idade em relação à conduta de um magistrado da Vara Única de Sapucaia, no Rio de Janeiro.

Conforme alegado na ação, durante uma audiência de apresentação, o juiz optou por manter a adolescente algemada. A jovem estava sendo acusada de um ato infracional similar ao tráfico de drogas, pois foi encontrada com 272 pinos contendo substância branca em pó e sete tabletes de erva seca durante uma abordagem em um ônibus.

A defesa argumenta que houve uma violação à Súmula 11, a qual permite o uso de algemas apenas em situações excepcionais. Desta forma, foi solicitada uma medida liminar para proibir o juiz de ordenar o uso de algemas em futuras audiências, além de requerer a anulação da audiência de apresentação

Quando usar

A ministra Cármen Lúcia, na função de relatora, destacou que o emprego de algemas representa uma medida séria, devendo ser utilizada de forma excepcional e com justificativas adequadas.

No caso específico, o juiz responsável justificou a manutenção das algemas, alegando a “diferenciada compleição física e a preservação da própria integridade” da menor. O magistrado afirmou que a adolescente apresentou comportamento agressivo tanto na delegacia quanto durante a audiência.

A ministra reconheceu que, de acordo com a súmula 11, a utilização de algemas foi devidamente justificada. Entretanto, a ministra Cármen Lúcia destacou que são frequentes as queixas recebidas pelo STF quanto ao emprego de algemas em menores.

Ela sugeriu que a turma estabelecesse diretrizes específicas para tais circunstâncias e propôs encaminhar o caso ao CNJ para a definição de procedimentos mais detalhados.

Situações específicas:

a) Após a apreensão do menor e caso não haja justificativa para sua liberação imediata, ele deve ser encaminhado ao representante do Ministério Público competente, conforme estabelecido no artigo 175 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). O representante do MP deverá avaliar e se pronunciar sobre a necessidade de uso de algemas, se esta questão tiver sido levantada pela autoridade policial que conduziu a diligência.

b) Conforme o parágrafo 1º do artigo 175 do ECA, se não for possível apresentar o menor imediatamente ao MP, ele deve ser encaminhado a uma entidade de atendimento especializado, que terá o prazo de 24 horas para apresentá-lo ao representante do MP.

c) Nas localidades onde não houver entidade de atendimento especializado disponível para receber o menor apreendido, ele deve aguardar a apresentação ao representante do MP em uma delegacia especializada ou, na falta desta, em uma área separada das destinadas a adultos, por um período não superior a 24 horas.

d) Após a apresentação do menor ao representante do MP, este emitirá parecer sobre a necessidade de uso de algemas. Essa questão será então submetida à autoridade judiciária, que deverá se manifestar de maneira fundamentada durante a audiência de apresentação do menor.

e) O caso será encaminhado ao Conselho Tutelar para que este emita sua opinião sobre as providências relatadas pela autoridade policial, para que o Ministério Público possa tomar sua decisão final.

f) A conclusão deste julgamento será encaminhada ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para que adote as medidas necessárias, inclusive a elaboração de normativas infralegais para a execução das decisões.

O Ministro Flávio Dino concordou com o entendimento da relatora, porém ressaltou a necessidade de um filtro para evitar abusos por parte dos magistrados ao justificar a utilização de algemas, com base em sua experiência na atuação em tribunais criminais.

Ele observou que se “arrogância” fosse motivo para algemar, alguns magistrados deveriam algemar a si mesmos. Em seguida, enfatizou que o uso de algemas representa um símbolo de submissão e inferioridade. A Ministra Cármen Lúcia acrescentou que é um sinal de “medievalismo”, pois atualmente não se prende nem animais.

Ao concluir, a turma decidiu de forma unânime rejeitar a reclamação, seguindo as medidas estipuladas no parecer da relatora, e ordenou que fosse enviado ofício às autoridades mencionadas no voto.

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