No fim do mês passado, o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) aprovou uma resolução que fará com que pessoas que consultem na internet salários de procuradores e promotores de Justiça sejam obrigadas a se identificar. A medida, que cria um obstáculo à transparência e um possível constrangimento a quem fizer a consulta, foi uma sugestão da Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR) e acabou sendo acatada por unanimidade pelos conselheiros.

O CNMP é responsável por fiscalizar a administração, as finanças e a conduta disciplinar do Ministério Público, uma instituição independente e permanente do estado. A decisão do Conselho vai contra o princípio constitucional da publicidade e as leis de Acesso à Informação (12.527/2011) e do Governo Digital (14.129/2021).

Essas leis exigem que as informações públicas nos portais de transparência permitam acesso automatizado por sistemas externos, o que não será mais possível para o Ministério Público após essa decisão.

“Causa profunda consternação que o conselho tenha colocado os interesses corporativos dos membros do Ministério Público acima do princípio da publicidade que rege a administração pública, disposto na Constituição Federal, e ignorado a demanda da sociedade por transparência e accountability da instituição”, disse a Transparência Brasil em seu blog.

A necessidade de identificação prévia para acessar informações sobre remunerações mostrou-se prejudicial ao controle social. Em 2012, o Senado Federal implementou essa medida, resultando em um incidente no qual uma servidora confrontou e ofendeu um cidadão que havia consultado sua remuneração. Diante da reação negativa, o Senado revogou a exigência. A servidora, processada por danos morais, foi condenada a indenizar o cidadão.

Por mais de uma vez, a Transparência Brasil e o Fórum de Direito de Acesso a Informações Públicas alertaram o CNMP, enquanto instituição, e cada um dos conselheiros a respeito de tais violações. Em agosto de 2022, solicitaram, por meio de uma carta, a retirada do trecho. O pedido foi reiterado em ofícios e memoriais enviados aos membros do colegiado ao longo de todo o ano de 2023.

As remunerações de promotores e procuradores são parte significativa da despesa dos Ministérios Públicos: o DadosJusBr mostra que, só em 2023 (até outubro), o Ministério Público da União pagou ao menos R$ 957 milhões em salários e R$ 273 milhões em benefícios (valores brutos) a seus membros. O MPU abrange o Ministério Público Federal (MPF), Ministério Público do Trabalho (MPT), Ministério Público Militar (MPM) e o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MP-DFT).

A reportagem entrou em contato com o Ministério Público de Goiás (MPGO) pedindo posicionamento e aguarda retorno.