A Primeira Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) decidiu que uma gravação de ligação telefônica feita por uma ex-empregada, sem o consentimento do ex-empregador, pode ser utilizada como prova. O caso envolveu uma vendedora que usou essa gravação para buscar indenização por danos pós-contratuais contra uma empresa de Cuiabá (MT). Na gravação, o ex-empregador fornecia informações negativas sobre a trabalhadora a uma pessoa supostamente interessada em contratá-la.

A decisão está alinhada com o entendimento do TST sobre a validade de provas obtidas em gravações realizadas sem o conhecimento do outro interlocutor.

O caso

A vendedora, que trabalhou na empresa de 2017 a 2019, relatou que, após sua demissão, participou de várias entrevistas e processos seletivos que pareciam promissores. No entanto, mesmo sendo qualificada, não era selecionada para nenhuma vaga. Depois de várias recusas, inclusive em situações em que a contratação parecia certa, ela começou a suspeitar que o ex-empregador estava repassando referências negativas sobre ela.

Para comprovar suas suspeitas, pediu a conhecidos que entrassem em contato com a empresa solicitando referências. Segundo seu relato, as informações fornecidas eram falsas e prejudiciais à sua reputação, comprometendo sua reinserção no mercado de trabalho.

Validade da prova e jurisprudência

O advogado trabalhista Cassiano Peliz destacou que a jurisprudência atual, tanto no TST quanto no Supremo Tribunal Federal (STF), reconhece a legalidade de gravações feitas por um dos interlocutores sem o consentimento do outro, conforme a tese do Tema 237 de repercussão geral do STF.

Cassiano Peliz: “Esse tipo de prova é especialmente relevante em casos de assédio moral ou sexual” l Foto: Arquivo pessoal

“Esse tipo de prova é especialmente relevante em casos de assédio moral ou sexual, pois muitas vezes a gravação é a única forma de o trabalhador comprovar os abusos sofridos. Orientamos trabalhadores que enfrentam essas situações a utilizarem esse recurso”, afirmou Peliz. Ele também mencionou um caso notório envolvendo o ex-presidente da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), Rogério Caboclo, que foi denunciado por assédio sexual com base em gravações.

Segundo o advogado, o assédio moral tende a ser mais facilmente comprovado, pois envolve práticas como rigor excessivo, exposição vexatória do trabalhador ou imposição de metas inalcançáveis. Já no caso de assédio sexual, o agressor costuma evitar deixar rastros, tornando as gravações ainda mais importantes como prova.

Decisão judicial

Em primeira instância, o pedido de indenização da vendedora foi negado, decisão que foi mantida pelo Tribunal Regional do Trabalho da 23ª Região (MT). O TRT considerou a prova ilícita, alegando que a gravação havia sido obtida por meio de simulação e sem o consentimento do interlocutor.

No entanto, ao recorrer ao TST, a trabalhadora argumentou que a comprovação dos fatos não dependia exclusivamente da gravação, já que o sócio proprietário, em depoimento, confirmou o diálogo e admitiu que havia feito comentários negativos sobre ela devido ao desempenho durante o contrato.

Posição do TST

O ministro Hugo Scheuermann, relator do recurso no TST, destacou que o entendimento prevalecente é de que gravações feitas por um dos interlocutores sem o conhecimento do outro são lícitas, mesmo que quem gravou não esteja diretamente envolvido na relação contratual.

Com o reconhecimento da licitude da gravação, a Primeira Turma determinou o retorno do processo à Vara do Trabalho, para que o julgamento dos pedidos da vendedora prossiga.

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