Superfaturamento, conluio, serviços fantasmas, jogos de planilhas, participação de empresas coligadas e alterações contratuais. Esses são alguns dos tipos mais comuns de fraudes em licitações. Aliado a isso, todo processo ainda enfrenta falta de preparo de agentes públicos e órgãos de controle, se somando ao emaranhado de leis.

Quando um agente público não obedece ao princípio da igualdade entre os demais participantes, não dá a devida publicidade ao certame ou dispensa a licitação sem o devido amparo legal, está incorrendo em ato de improbidade administrativa (o funcionário público) e maculando o processo licitatório.

Por outro lado, quando a administração precisa de determinado produto, mas existem poucas empresas que o oferecem, ela pode ser compelida a “se contentar” com o menor preço, mesmo que o produto adquirido não seja exatamente o buscado. Ou pior, determinada empresa ganha, mas não consegue cumprir com o acordado e os processos começam a ganhar adendos.

Um exemplo recente disso é o caso do edital da Prefeitura de Goiânia da licitação para radares não-intrusivos, que são aqueles mais modernos e que não necessitam cortar o asfalto para serem colocados. Desde o ano passado essa compra está emperrada pela dificuldade de equalizar: o que se deseja comprar e o que a legislação determina.

No Portal da Transparência da Prefeitura consta (pelo menos) três impugnações de empresas interessadas nesse contrato. Depois de idas e vindas entre prefeitura e órgãos de controle, há uns dez dias o município de Goiânia adiou novamente essa mesma licitação – cujo edital mudou tanto que até suprimiu os detalhes modernos dos radares desejados inicialmente. Atualmente a equipe jurídica do governo municipal reavalia o texto e analisa os pedidos de impugnação apresentados. Espera-se que novo edital seja lançado em abril.

Para a presidente da comissão de Direito Administrativo da Ordem dos Advogados do Brasil – seção Goiás (OAB-GO), conselheira seccional, especialista em licitações e contratos administrativos, Camila Diniz, a nova lei de licitações (Lei 14.133/21), em vigor desde 1º de abril de 2021, implementou mudanças profundas no processo de licitação e tem tudo para tornar a contratação de bens e serviços mais eficiente.

Ela explica que a legislação é um instrumento importante no combate às fraudes por trazer novos processos e etapas a serem seguidas, dando atenção especial à fase de planejamento da licitação. Assim, seguindo o que manda a lei, a possibilidade de erro, fraude ou benefícios a terceiros diminui substancialmente. “A fase preparatória é a mais importante da licitação. Tenho que saber o que vou comprar. E a Lei 14.133 obriga que a administração pública faça o planejamento correto”, explicou.

Ainda sobre o tema, tem novidade chegando em abril: as leis anteriores que tratavam sobre a questão – Lei nº 8.666/93, Lei nº 10.520/00 (Lei do Pregão) e Lei nº 12.492/11 (Regime Diferenciado de Contratação) – serão revogadas no fim da próxima semana, no dia 1º de abril de 2023. Na prática, isso deve mudar a rotina de órgãos públicos em seus procedimentos licitatórios.

Entenda como funciona

A licitação é um procedimento formal necessário – uma obrigação legal – para que qualquer administração pública contrate serviços ou adquira produtos. A lei que trata do tema – e que ainda está em vigor até o fim do mês – completaria 30 anos neste ano.

A Lei 8.666 é de junho de 93 e, para a especialista, muita coisa mudou nesse período e os novos tempos pedem uma lei que garanta um processo menos engessado, mais objetivo e transparente. “A sociedade evolui e a lei foi ficando desatualizada com o tempo e trazendo problemas pra quem trabalha com isso”, explicou a advogada.

A ideia é que as modificações na lei de licitações traga mais agilidade para a compra e contratação de bens e serviços pelos governos. E a boa notícia, na visão da conselheira é que ela deve diminuir custos operacionais ao adotar, como regra, o meio eletrônico. “Licitações presenciais serão uma exceção”, afirmou a especialista.

Segundo ela, o novo texto extinguiu as modalidades carta convite e tomada de preços – elas só podem ser usados até o fim do mês de março – e inseriu um novo modelo de licitação: diálogo competitivo. Em linhas gerais, o novo tipo de modalidade diálogo competitivo vai ser usado quando a Administração fizer licitações de bens ou serviços de uso comum, mas que não podem ser encontrado com facilidade em muitos fornecedores.

“A modalidade diálogo competitivo é usada quando um produto ou serviço é muito técnico, específico, e que com poucos fornecedores disponíveis”, detalhou Camila. Um exemplo de quando poderá ser feito esse tipo de licitação é para a compra de certos tipos de medicamentos, quando não existir a oferta deles em muitos laboratórios. A ideia, portanto, é garantir a demanda e a oferta do produto sem interrupções.

E, com as mudanças, a advogada pontua que é fundamental a capacitação dos servidores públicos, principalmente de municípios pequenos, para que não haja erros nem fraudes que possam comprometer o funcionamento da máquina pública. “Os servidores não têm incentivo para se capacitarem, especialmente nos municípios menores. Não adianta só a lei ser boa, precisa ter conhecimento sobre ela para que a aplicação seja feita corretamente”, avaliou.