Pastores podem ter embolsado indenização dos moradores do Morro da Serrinha

04 outubro 2023 às 12h39


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De acordo com o Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJGO), a Comissão de Soluções Fundiárias encerrou, na última sexta-feira, 29, os trabalhos na área do Morro do Serrinha, em Goiânia, com o acordo para a desocupação pacífica da área, pela maioria dos ocupantes. Com início na segunda-feira, 2, a desocupação deve seguir até sexta-feira, 6, data final para que os moradores retirem todos os pertences do local.
Ocorre que a história é bem mais complexa que isso e envolve interesses imobiliários e pessoais dos envolvidos. Com o setor do jornalismo tradicional em baixa, Júnior Câmara, proprietário do Grupo Jaime Câmara (GJC), firmou parceria milionária com uma construtora e embarcou no mercado de apartamentos de luxo em Goiânia. Além do estacionamento da empresa, que já teria virado prédio da construtora, parte do espaço do Grupo também foi vendida.
Agora, de acordo com os moradores do local, a empresa desejaria construir no Morro do Serrinha. O impasse, no entanto, teria sido retirar as cerca de 40 pessoas que residem no local, além dos grupos religiosos. Apesar da empresa ter oferecido alguns lotes para as tendas religiosas, os moradores denunciam não ter sido contemplados pelo acordo. Em contato com o Jornal Opção, a empresa negou interesse na área (que é pública e de preservação) e também não confirmou compra de estacionamento do grupo GJC.
A entidade religiosa Tenda Primeiro é Deus se comprometeu a iniciar a retirada do local e ganhou lote da Associação das Empresas do Mercado Imobiliário de Goiás (Ademi). A pastora Elizabeth Pereira Silva recebeu um lote de aproximadamente 2 mil m² no Residencial Lira de Santana, em Goiânia. Segundo o desembargador Anderson Máximo, foram destinados 5 lotes para os religiosos durante o acordo judicial.
Os ocupantes do Morro, no entanto, que residem há quase 10 anos no local, informaram ao Jornal Opção que em nenhum momento foram informados do acordo e não receberam nenhuma proposta. Procurada pela reportagem, a pastora Elizabeth disse que não iria se manifestar sobre o assunto.
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Já a tenda Instituição Grupo Resgaste Almas para Cristo (Igrac) não aceitou o acordo, segundo o TJGO. Aqueles que não aceitaram a proposta foram inscritos no Cadastro Único para que tivessem acesso aos benefícios ofertados pelo governo federal para pessoas em situação de vulnerabilidade social, como o Bolsa Família e programas voltados para emprego, saúde e documentação pessoal.
O Jornal Opção foi até o Centro de Referência de Assistência Social (Cras) da Vila Redenção, que tem acompanhado a desocupação do Morro do Serrinha e tentado garantir alguns direitos para os moradores do local. Residindo em situação de vulnerabilidade, cerca de 40 pessoas tiveram seus nomes cadastrados em auxílios, mas nenhum foi beneficiado, segundo a assistência social do Cras.
No local, residem idosos, mulheres e até animais em situação de vulnerabilidade. Durante o acordo, eles receberam 5 lotes de 360 m² em Aparecida de Goiânia. Para além disso, existem os oportunistas que sabendo das indenizações declaram residir no local, chegando lá depois das negociações. “Por decisão do ministro Barroso, temos trabalhado no congelamento da ocupação. Eu tento trabalhar dentro do tribunal para que a gente, assim que receba uma demanda na Comissão [Comissão de Soluções Fundiárias], a gente dê uma cooperação com os municípios para evitar justamente o inflar da ocupação”, explicou Anderson Máximo.
Segundo o TJGO, boa parte dos ocupantes da área já deixaram o local e agora estão alojados em imóveis oferecidos pela Ademi, distribuídos nos cinco lotes e regularizados. Mas agora existem cerca de 30 pessoas ainda residem no local em lonas e barracas e denunciam não terem sido informados do acordo por nenhuma das tendas.
Segundo os ocupantes, a Tenda Igrac não aceitou a proposta porque o pastor responsável também tem uma casa no fim do morro. Com o acordo, ele também teria que desocupar o local. A reportagem procurou o pastor, mas não conseguiu retorno. O espaço segue aberto.


Acordo da Tenda Primeiro é Deus com a Justiça
Na reunião realizada com a presença de representantes do Estado, do Ministério Público, Defensoria Pública, que participou de todas as inspeções e tratativas, em colaboração com o TJGO; procuradoria-Geral do Estado, órgãos do governo estadual, Polícia Militar, Associação das Empresas do Mercado Imobiliário de Goiás (Ademi) e dos religiosos que ocupam a área, foi deliberado que a Ademi se comprometeria a comprar a área na saída para Inhumas – já indicada e aceita pela Tenda Primeiro é Deus -, com concessão do direito real de uso ou comodato por no mínimo três anos, com o compromisso de doação definitiva, caso consiga aprovar as ODC’s e TDC’s relativas à doação.
Além disso, a associação se comprometeu a realizar na área, de imediato, a instalação de cerca, bomba d’água, energização, banheiros químicos e ainda uma campanha de arrecadação de material de construção para melhoramento do local. Também ficou acordado que a Ademi providenciará o necessário à realização da mudança da Tenda Primeiro é Deus para o novo local, sem qualquer ônus da mudança para a Tenda. Caso seja necessário, o Estado de Goiás conseguirá um local para guardar os bens da Tenda Primeiro é Deus, bem como providenciar o transporte desses materiais.
Além do juiz Eduardo Tavares dos Reis, participaram da reunião Márcio Lopes Toledo e Juliano Barros, promotores de Justiça; Gustavo Alves de Jesus, defensor Público do Estado de Goiás; Fabiana Baptista Bastos Lopes, procuradora do Estado de Goiás; Uilliam dos Santos Cardoso; procurador do Estado de Goiás; Rogério Bernardes Carneiro, subsecretário de Logística e Patrimônio (SEAD); Frederico Pires Coriolano; superintendente Central de Patrimônio Imobiliário (SEAD); Walter de Paula, advogado dos pastores da Tenda Primeiro é Deus; Felipe Melazzo, presidente da Ademi-Go; tenente-coronel Monteiro, da PMGO; major Antônio, da PMGO; João Batista, pastor representante da Tenda Primeiro é Deus; Elizateth Pereira Silva, pastora da Tenda Primeiro é Deus; Sines e pastor representante da Tenda Primeiro é Deus, além do advogado Sebastião Ferreira Leite e outros participantes presentes na área do Morro da Serrinha.

