A cidade de Goiânia já foi referência nacional no basquete e berço de atletas que chegaram à seleção brasileira, mas hoje convive com o abandono de suas quadras poliesportivas públicas. Estruturas enferrujadas, tabelas quebradas, pisos rachados e falta de segurança transformam o que já foi um polo esportivo em um problema crônico que se arrasta há décadas. Uma situação herdada de gestões anteriores, que a Prefeitura reconhece e afirma estar elaborando um plano de revitalização dos espaços esportivos a partir do próximo ano

Nos anos 1970 a 1990, Goiânia viveu o auge do basquete, quando clubes, atletas e técnicos goianos conquistaram a Taça Brasil de 1973, o Campeonato Sul-Americano de Clubes de 1974 e o 3º lugar no Campeonato Mundial de Clubes, no mesmo ano — além do título do Campeonato Brasileiro de Seleções de 1976 conquistado pela Seleção Goiana. A prática do esporte se popularizou nas ruas. Praças como a Santos Dumont, conhecida como a “Praça do Avião” e considerada a “meca goianiense do basquete de rua”, tornaram-se pontos de encontro para atletas e chegaram a revelar jogadores que atuaram pela seleção brasileira e pelo Novo Basquete Brasil (NBB).

Por exemplo, o armador Leandro Moura, conhecido como “Lelê Moura”, que atuou pelo Minas Tênis Clube e pelo Mogi Basquete na NBB, contou ao Jornal Opção que sempre treinou naquela quadra antes de ingressar na elite do basquete brasileiro. “Já treinei e joguei bastante lá. Eu moro na região, então era a quadra que eu sempre usava. Desde jovem, com uns 16 anos, eu já treinava ali”, relatou o atleta.

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Tabela de basquete destruída na Praça Santos Dumont | Foto: Guilherme Alves/Jornal Opção

Mesmo quando deixou de morar em Goiânia e estava fora para disputar campeonatos, Moura conta que sempre frequentava a quadra durante as férias na capital. No entanto, ele relata que o cenário sempre foi precário. “Na real, sempre foi assim. Desde que me entendo por gente, a estrutura nunca foi boa. Na maioria das vezes, eram os próprios jogadores que se juntavam para arrumar alguma coisa”, destacou.

A mesma situação também foi denunciada por Homero Sousa, que é atleta, treinador e analista de basquete em Goiânia. Por meio das redes sociais, ele publicou um vídeo denunciando a situação do local e pedindo apoio às autoridades. Assim como Moura, ele também cresceu praticando o esporte na quadra poliesportiva da Praça Santos Dumont.

“Lá faz muito tempo que o poder público não age”, ressaltou Sousa, em contato com o Jornal Opção. “Não dá para treinar, nem jogar, está muito perigoso, em estado de urgência, porque virou um perigo com tantas coisas enferrujadas, pregos caindo e até a tabela se soltando. O chão tem buracos nos dois garrafões, justamente onde os jogadores mais frequentam, e isso pode causar lesões. O aro também está muito abaixo do regulamento. Pela regra, são 3,05 metros, mas lá está com 2,90 metros”, descreveu.

Além da quadra poliesportiva, o autor da denúncia também cita que a Praça do Avião também passa por outros problemas. “Depois que eu postei o vídeo, o pessoal comentou também que a pista de caminhada está bem deteriorada. Outros reclamaram de pessoas usando drogas nos banquinhos de xadrez”, contou o desportista.

Em entrevista para o Jornal Opção, o titular da Secretaria Municipal de Esportes (Semel), Luiz Alberto Bites, afirmou que a Praça do Avião está em um plano de reforma para as quadras poliesportivas e outros equipamentos públicos da Prefeitura de Goiânia. No entanto, devido à atual situação financeira do município, essas obras devem ficar apenas para o próximo ano. Porém, a expectativa é restaurar todos os espaços citados abandonados por gestões passadas.

“Essa deterioração não é recente, a gestão precisa lidar com quadras que enfrentam problemas acumulados há muitos anos. Precisamos montar um planejamento para que, ao longo do próximo ano, possamos programar a revitalização não só das quadras, mas também de diversos espaços que estão em condições ruins, como pistas de skate, campos de futebol e outras modalidades. Em toda Goiânia, os ambientes esportivos estão em situação precária”, relatou Bites sobre os problemas herdados de gestões anteriores.

Ao mesmo tempo, o secretário de Esportes ressaltou a importância da quadra para a cultura do basquete em Goiânia. “Vamos destinar recursos públicos para revitalizar totalmente a quadra e construir algumas quadras de areia na parte externa, formando um complexo esportivo melhor. A federação vai organizar campeonatos, e nós vamos apoiar, fomentando o esporte em geral”, afirmou.

O vídeo de Sousa repercutiu pelas redes sociais e gerou respostas de políticos. Por exemplo, a equipe do prefeito Sandro Mabel (UB) comentou solicitando mais informações a respeito do problema. Os vereadores Sanches da Federal (PP) e Thialu Guiotti (Avante) também demonstraram interesse em auxiliar na questão.

Rachaduras e irregularidades também geram preocupações entre as pessoas que utilizam a quadra | Foto: Guilherme Alves/Jornal Opção

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“Pombal” do Setor do Funcionários

Outra quadra poliesportiva tradicional do basquete de rua em Goiânia fica na Praça de Esportes do Setor dos Funcionários. Segundo Sousa, o local está em situação de abandono. Por ser coberta, a quadra acumula fezes de pombos que vivem no teto do espaço. Além disso, o ambiente é frequentemente ocupado por pessoas em situação de rua, o que por vezes gera conflitos com quem tenta utilizar a estrutura para a prática esportiva.

“A quadra do Setor dos Funcionários está abandonada”, frisou o esportista. “Tem tanto pombo que a gente começou a chamar de ‘pombal’. Pessoas em situação de rua também vão lá, às vezes ameaçam jogadores quando estão bêbados ou drogados. Depois da pandemia, ninguém mais está utilizando o espaço”, acrescentou. Praticantes da modalidade também lamentam que, por ser coberto, o local teria um grande potencial para prática esportiva.

Quadra de Esportes no Setor dos Funcionários coberta com fezes de pombos | Foto: Guilherme Alves/Jornal Opção

Daniel Braga é advogado e, ao mesmo tempo, se dedica ao basquete como praticante, árbitro e treinador. Ele conta ao Jornal Opção que local possui um problema com as tabelas hidráulicas oficiais que eram da Federação Goiana de Basquetebol (FGB), mas que foi sucateada ao longo do tempo. “Roubavam muitos itens de metal da tabela, ainda há a questão dos pombos que não instalaram uma tela para proteger a quadra”, contou.

Atualmente, há um imbróglio quanto à responsabilidade pela Praça de Esportes do Setor dos Funcionários, com parte do local sob a administração do município e outra parte sob a do governo estadual. Anteriormente, houve rumores de que o espaço poderia ser completamente municipalizado para revitalização durante a gestão Mabel, mas a situação não se concretizou no momento.

Sobre o espaço, Bites também informou que há uma parceria com a FGB e que futuramente será instalada uma tela no telhado. “Estamos em parceria com a federação, que conseguiu uma tela para ser colocada no telhado, evitando a entrada de pombos que sujam o local e podem transmitir doenças. A Prefeitura vai apoiar a instalação”, explicou.

Tabela de basquete hidráulica na Quadra de Esportes sofre com vandalismo | Foto: Guilherme Alves/Jornal Opção

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Outras quadras

Além das quadras na Praça do Avião e no Setor dos Funcionários, o Jornal Opção também visitou as quadras do Parque Mutirama (Setor Central), da Praça Monte Cristo (Setor São José) e da Quadra do Progresso (Setor Progresso). Os espaços também apresentam péssimas condições. O piso de todas as quadras, por exemplo, está cheio de rachaduras, e as tabelas, aros e demais equipamentos encontram-se em estado ruim de conservação.

Fotos: Guilherme Alves/Jornal Opção

Planos para 2026

Além do plano de revitalização gradual de quadras e espaços esportivos da cidade, o secretário de Esportes de Goiânia afirmou que há um projeto para transformar os campos de terra, os chamados “terrões”, em campos sintéticos. A meta é entregar pelo menos cinco campos sintéticos no mês de outubro, em comemoração ao aniversário de Goiânia, no dia 24.

“Isso já representa uma mudança de cultura, substituindo os campos de terra por campos sintéticos. Queremos entregar essas estruturas ainda no mês do aniversário de Goiânia”, afirmou Bites. Ao mesmo tempo, ele ressaltou que a situação das quadras poliesportivas e dos espaços esportivos em geral será resolvida de forma gradual, devido à limitação de recursos, destacando que Goiânia ainda enfrenta um estado de calamidade financeira.

“Não podemos atacar todos os problemas de uma vez, porque não há recursos para isso. É preciso planejamento, e assim vamos resolvendo de forma gradual. Hoje, em Goiânia, temos problemas crônicos em locais como a Praça Monte Cristo, o Parque Mutirama e a Praça do Avião, questões que vêm de gestões passadas. Existe, sim, um plano para o próximo ano para as quadras poliesportivas, utilizadas em diversas atividades”, relatou.

Tabela na quadra do Parque Mutirama está sem aro | Foto: Guilherme Alves/Jornal Opção

A respeito dos relatos de insegurança, o secretário defendeu uma parceria com as forças de segurança, incluindo a Guarda Civil Metropolitana (GCM) e a Polícia Militar do Estado de Goiás (PMGO). “A segurança pública não é responsabilidade exclusiva da Secretaria de Esportes, mas temos capacidade de dialogar para buscar soluções. O comandante da GCM, Gustavo Toledo, e o coronel Pedro Henrique Batista, do Comando de Policiamento da Capital da PM, estão sendo parceiros nesse sentido”, destacou.

Bites, que também é ex-coronel da PMGO, ressaltou a importância do registro das ocorrências para gerar dados para a Secretaria. “Sem esse registro, não temos estatísticas. Por isso, sempre orientamos a comunidade a registrar os caso. Quem tiver notícia de problemas em ambientes esportivos pode entrar em contato diretamente pelo Instagram da Semel. Estamos atendendo, respondendo todas as mensagens e, a partir das denúncias e do apoio da comunidade, conseguiremos programar soluções”, explicou.

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