Italo Wolff e Euler de França Belém

*Entrevista publicada originalmente em
25 de junho

Professor de Economia da Pontifícia Universidade Católica de Goiás, Valdivino de Oliveira, de 71 anos, passa a impressão de ter vivido várias vidas. Porque fez muitas coisas e, algumas delas, ao mesmo tempo. Foi secretário da Fazenda de Iris Rezende, quando este era governador. Foi secretário de Finanças da Prefeitura de Goiânia nas gestões de Daniel Antônio, Joaquim Roriz (era interventor) e Nion Albernaz. Depois, foi secretário da Fazenda do Distrito Federal nos governos de Joaquim Roriz e José Eduardo Arruda. Pode-se dizer que o Fundo Constitucional do Distrito Federal (FCDF) — que mantém Brasília “viva” — é uma de suas criações. 

Ele também foi deputado federal (brilhou na área de economia) e vice-prefeito de Goiânia. E, provando sua quase onipresença, foi presidente do time do Atlético. Consta que, dada sua dedicação e conhecimento, conseguiu pôr as finanças do clube em ordem. Há uma lenda (talvez real) de que, na gestão pública, quando alguém não consegue resolver um problema na área de finanças logo aparece uma pessoa para dizer: “Pergunte ao Valdivino”. E, quando inquirido, o economista tem a resposta na ponta da língua.

Euler de França Belém – O senador Omar Aziz (PSD-AM) retirou as limitações previstas pelo Marco Fiscal ao Fundo Constitucional do Distrito Federal (FCDF) em seu relatório, que foi aprovado nesta quarta-feira, 21. O senhor foi um dos proponentes do Fundo. Como avalia a medida?

O Distrito Federal é altamente dependente do Fundo Constitucional. O DF é hospedeiro da República; lá estão as embaixadas, o poder Legislativo, Executivo e Judiciário, com os tribunais Justiça, de Contas, Eleitorais. Enfim, toda a estrutura do país instalada ali impõe à cidade um custo muito alto. 

Além do mais, a maior parcela do PIB do do Distrito Federal vem do setor público, que não contribui com impostos. A constituição torna os entes federados imunes entre si – a União não paga impostos para o Governo do Distrito Federal (GDF). Portanto, temos em Brasília uma riqueza que gera pouca receita para administração da cidade. 

A concentração de bens também cria encargos. Habitantes das cidades do Entorno vão à Brasília em busca de Saúde quando adoecem; o urbanismo tem de ser exemplar pois esta é a capital da República; os agentes do governo distrital também participam da segurança de órgãos da União. 

O FCDF está prevista no inciso XIV, artigo 21 da Constituição Federal de 1988, e foi regulamentado em 2002, quando eu trabalhava em Brasília. Até então, os recursos para sustentar o DF eram “voluntários”. Nas discussões com o ministro da Fazenda, Pedro Malan, e o secretário adjunto do Tesouro Nacional, Eduardo Guardia, lembro-me de ouvir Malan afirmar algo como: “Vocês estão cansados de pedir dinheiro e nós de atender pedidos. Vamos criar um fundo.”

Montamos uma comissão. Fiquei responsável por representar o DF e Simão Cirineu por representar a Casa Civil. Também havia representantes do Ministério do Planejamento e Ministério da Fazenda. Redigimos o projeto, que foi apreciado pelo Congresso e sancionado pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB). A partir de então, o DF passou a contar com transferências do Fundo Constitucional, sem mais convênios voluntários. 

Valdivino de Oliveira explica como subsídios são essenciais para estados emergentes | Foto: Leoiran / Jornal Opção

Euler de França Belém – Segundo alguns economistas, a vocação econômica de Goiânia é o setor de serviços, pois grande parte da renda da cidade vem do comércio. O senador Vanderlan Cardoso (PSD) sugere que a cidade precisa de indústrias. Outros ainda afirmam que é melhor deixar essa atividade para Aparecida de Goiânia. O que o senhor pensa sobre o assunto?

A divisão do PIB em três setores – agricultura, indústria e serviços – é feita pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) já poderia ter sido reformulada. É uma classificação que coloca em “serviços” o sistema financeiro, a administração pública, o comércio. Em Goiás, os serviços correspondem a 64% do PIB, mas é preciso analisar esse número. 

Embora Goiânia se beneficie da atividade agrícola de Goiás, não há contribuição do agro para o PIB da cidade, que não tem mais área para agricultura. Não temos mais áreas rura. A alternativa para Goiânia é, além de avançar no setor de serviço, avançar no de indústrias – principalmente a agroindústria. 

Quando eu fui para Brasília, se dizia: “Aqui é a capital federal, a terra da burocracia, não há espaço para chaminé.” Hoje, há muitas indústrias alocadas no Setor de Indústria e Abastecimento (SIA). É um parque industrial respeitado. 

Euler de França Belém – Sobre a questão da inflação e crescimento econômico, o PT diz que o país poderia estar crescendo mais se a taxa de juros baixasse. O Banco Central (BC) diz que, no momento, é preciso manter o juro neste patamar, O que você pensa? O presidente do BC Roberto Campos Neto está certo ou Lula da Silva (PT) está certo?

Eu acho que o presidente do Banco Central está certo. O crescimento não é um ato da vontade política. Passa pela vontade de investir, mas o problema da economia brasileira hoje não decorre dos níveis de investimento (até porque temos capacidade ociosa muito grande). 

O país deixou de crescer a nível expressivo desde 2015 e 2016, quando tivemos uma recessão, e depois veio a pandemia que causou fechamento de empresas e redução da produção. O PIB mundial caiu, o custo da energia e dos insumos industrial subiu, provocando uma inflação internacional. 

Essas crises, causadas por desarticulação nas cadeias de produção, não podem ser resolvidas localmente. O controle da inflação deve ser feito com política monetária expressiva, que foram as que Roberto Campos Neto adotou. As medidas recessivas causaram desinflação, reduzindo o crescimento dos preços que chegou a 12,3% em 2022. 

Hoje vivemos os frutos dessas medidas. Lula colhe inflação acumulada neste ano abaixo de 3%. Há possibilidade de crescer acima das projeções de 1,4% em 2023. As bolsas voltaram a operar em pontuação alta, próximas do pico do governo Bolsonaro de 120 mil. Se os pressupostos macroeconômicos são sólidos, a confiança no país aumenta e o investimento volta. 

Foi em boa hora que o Brasil consolidou a independência de seu Banco Central. O que Haddad fez de fato para melhorar a economia? Até agora, nada; tem colhido frutos do esforço passado. Lula deveria aplaudir Campos Neto. A vontade de todos os governos é sempre gastar mais do que arrecadam, até por isso um arcabouço fiscal é importante, juntamente com política monetária, cambial e fiscal. 

Italo Wolff – O que o governo argumenta é que a inflação causada pela alta dos insumos não é controlada pela retirada do dinheiro de circulação, como é o caso das inflações provocadas por excesso de oferta. 

A história diz o contrário. Em 1970, os americanos se encontraram com 12% de inflação, provocada por déficits orçamentários elevados, o embargo do petróleo e o colapso das taxas de câmbio administradas. O Federal Reserve (equivalente ao Banco Central dos Estados Unidos) adotou uma política monetária retracionista por dez anos. Por aqui, estamos apenas no terceiro ano. Houve recessão e desemprego nos Estados Unidos, mas a economia americana ganhou uma performance macroeconômica fundamental para continuar crescendo até os dias de hoje. 

Italo Wolff – O senhor acredita que o novo arcabouço fiscal terá capacidade de controlar os gastos? Não há o risco de elevar impostos para fazer a receita crescer e assim justificar novo aumento de gastos?

Temos de acreditar que vai controlar os gastos. Se o governo não cumprir, incorre em crime de responsabilidade. Acredito que o arcabouço fiscal só tem um defeito, mas que pode ser reparado quando a proposta passar pelo Congresso. Ele deveria ser também um instrumento para o poder público estadual e para o poder público municipal. Deveria ser um instrumento de balizamento dos gastos para os três entes.

As câmaras e assembleias Brasil afora aumentam seus próprios gastos por força de lei sem saber de onde vem o recurso para a ampliação desse orçamento. Essa foi uma das razões pela qual deixei de trabalhar em secretarias de economia municipais: secretários e parlamentares acreditam que precisam gastar mais para solucionar todos os problemas. Durante a pandemia, em Anápolis, eu tinha de repetir: “Estamos em uma pandemia, com queda de receita, e você quer gastar? Você tem que economizar!”

“Lula deveria aplaudir Campos Neto”, diz Valdivino de Oliveira | Foto: Leoiran / Jornal Opção

Euler de França Belém – A dívida do estado de Goiás está congelada pelo Regime de Recuperação Fiscal, certo? Quanto o estado vai começar a pagar? Em que condições? 

A grande jogada do governador Ronaldo Caiado (UB) foi ter aderido ao RRF, garantindo recursos para enfrentar a queda de receita causada pela pandemia e pela redução do ICMS de combustíveis, energia, etc. Fora do regime, Goiás teria muita dificuldade de atravessar esse período.
Agora, é evidente que essa dívida está se acumulando enquanto o Estado não paga. Na gestão financeira, se diz que a dívida não é um problema de quem deve, é um problema de quem tem a receber. A União, que é a credora, nunca vai escolher quebrar estado algum. Para receber, o Governo Federal poderá aceitar refinanciar o pagamento por anos. 

Euler de França Belém – Como avalia o fundo que taxa produtos agrominerais, o Fundeinfra?

É importante para o cidadão goiano, na medida em que esses recursos se transformam em investimentos na infraestrutura que vai ajudar o próprio agronegócio. Eu entendo que é uma boa iniciativa do governo, que foi forçada pela conjuntura econômica de queda de receitas, mas que é justa. O estado de Goiás é um é um estado em franco desenvolvimento, e esse crescimento tem de ser acompanhado por investimentos em infraestrutura, estradas, pontes, pavimentação.
O Fundeinfra é gerido por um comitê, um colegiado que decide onde os recursos vão ser aplicados, o que é uma boa garantia. É como outros fundos importantes que já deram certo no passado, a exemplo do Fundo Protege Goiás e o Fundo de Combate à Pobreza (FCP). Com apenas 2% a mais no ICMS, muita gente teve acesso a bolsa de estudos, complemento de renda, obras sociais. É papel do Estado fazer essa integração social por meio do desenvolvimento econômico. 

“A taxa do agro é positiva. É papel do Estado fazer a integração social por meio do desenvolvimento econômico”

Valdivino de Oliveira

Euler de França Belém – Desde sempre, as prefeituras alegam estar quebrando. Agora, a situação parece grave novamente. O que está acontecendo?

As prefeituras, de forma geral, se acostumaram ao crescimento da receita. A receita foi crescendo e os municípios foram aumentando gastos de forma engessada. Isto é, quando se constrói um hospital, o prefeito engessa despesas com a Saúde porque terá de manter salários crescentes, manutenções, entre outros. Quando vem uma crise de receita, como a que aconteceu no ano passado, não há como cortar gastos. Que serviço as prefeituras dispensam? Nenhum; se endividam. 

Italo Wolff – O senhor mencionou que Goiás é um dos estados que mais cresce no Brasil. O que explica esse fato?

Em 1991, o PIB de Goiás representava 1,78% do total do PIB brasileiro. Em 2022, já representamos 2,95% do PIB Brasileiro. Ou seja, quase dobramos nossa contribuição relativa. Desde 1996, o Goiás está acima do crescimento médio nacional, do Centro-Oeste, Sul e Sudeste. 

Dois fatores concorrem para isso. Primeiro, a expansão da fronteira agrícola. Goiás expandiu sua fronteira agrícola, passando a ser um grande produtor e isso trouxe consigo a agroindústria. Temos no estado muitas plantas fabris de óleos, fármacos, beneficiadoras agropecuárias.  A agroindústria veio porque Goiás a atraiu com incentivos fiscais, o que nos leva ao segundo fator. 

Em 1996, não fabricávamos nem bicicletas, e a partir dos anos 2000, passamos a produzir veículos. Parte delas deixou o estado, mas chegamos a ter quatro montadoras simultaneamente: Mitsubishi, Chery, Hyundai e Suzuki. Goiás tem uma fábrica de tratores, a John Deere, em Catalão. Anápolis possui um polo de indústrias químicas. Então, ampliamos a produção de manufaturados rapidamente graças aos incentivos fiscais.

Euler de França Belém – Falando em isenções fiscais, por que se compreendeu que uma reforma tributária era necessária?

Há um consenso de que o atual sistema tributário apresenta uma série de distorções que precisam ser corrigidas. A burocracia é excessiva, o sistema tributário é complexo, o volume da litigiosidade fiscal é enorme. A disputa entre contribuintes e fisco gera prejuízo para empresas, dívida ativa, multas de até oito vezes o valor do imposto devido. Então, o modelo atual gera desestímulo ao investimento, que acaba por fazer com que nossas empresas percam competitividade. 

Hoje se compreende que o principal fator para o crescimento econômico, em todo o comércio global, é a competição. Garantir a competitividade é criar condições para o crescimento. Com os encargos para operar no Brasil, perdemos não só a indústria para países como a China, onde não existem encargos tão pesados, mas até o setor de serviços. Hoje, vemos pessoas comprando direto do exterior. Ou seja, até o comércio mais buscado é o de sites chineses, como a Shopee e outros. 

Italo Wolff – E quais argumentos em favor da manutenção dos impostos como estão?

O pessoal pensa que a mera criação de um imposto único, sobre o valor agregado, resolve tudo. Não resolve. Primeiro porque o seguinte o ICMS é um imposto sobre valor agregado (IVA). Ele só se chama ICMS, mas já incide sobre todas as fases de produção no ato do consumo. É mais cobrado de quem tem mais dinheiro, pois consome mais. O que justifica essa narrativa entusiasmada? A promessa de redução de impostos que se criou para justificar a mudança.  

Os estados e empresas já têm expertise na gestão do ICMS por administrá-lo há mais de 50 anos. Já existem diversos estudos sobre a capacidade de geração de receita e o impacto do ICMS na economia. Criar um IVA significa treinar todos os operadores (não só o fisco mas também empresários) para calcular o novo imposto. Mudar todo o sistema de informação do Estado, produzir novos estudos; tudo isso levaria muitos anos.  

Euler de França Belém – O que está por trás dessa discussão tão favorável à reforma? 

Os estados emergentes, como Goiás, Amazonas e Mato Grosso, descobriram como atrair empresas por meio de incentivos fiscais. Encontraram uma forma de fazer crescer suas economias, o que provocou um “ciúme” muito grande nos estados do Sul e Sudeste. A reforma tributária é uma forma de extinguir essa competição. Todos os técnicos do sudeste são a favor do IVA, porque é uma forma de tirar a liberdade dos estados emergentes de atrair empresas. 

Valdivino de Oliveira: “Creio que governadores não vão abrir mão da atribuição de taxar seus ICMS” | Foto: Leoiran / Jornal Opção

Euler de França Belém –  Nessa condição, acredita que será capaz de convencer outros estados a desistir dessa ideia? 

Nossa tese é que a reforma proposta fere de morte o pacto federativo. Esperamos que isso impeça sua realização. Fere de morte porque extingue a competência dos entes de arrecadar seus tributos. Toda competência que os municípios têm para arrecadar seu principal imposto, que é o ISS, vai para a autoridade da União. Vamos concentrar no governo federal toda a atribuição de estados e municípios para tributar suas atividades econômicas e o estado vai passar a viver de mesada.

Quem vai calcular o tamanho da mesada a que Goiás tem direito será o comitê gestor desse imposto, lá em Brasília. O que vai ocorrer: ao fim do mês, vão dizer, “Goiás, você tem tantos milhões, e se esses tantos milhões não forem suficientes para pagar sua folha, não é problema meu.” Estados correm o risco de quebrar se perderem controle de suas receitas. O mesmo serve para os municípios, que precisam manter a sua competência para arrecadar tributos. 

Então, creio que os governadores não vão abrir mão dessa atribuição. Pelas conversas que temos tido, creio que estão despertando para os problemas que se avizinham. 

Euler de França Belém – Como estão esses diálogos?

Tenho conversado todas as semanas com o governador Caiado. Hoje, ele é o principal líder dessas ideias no país. Além de Goiás, outros estados foram alertados e compreenderam os problemas em abrir mão de sua competência, como Espírito Santo, Sergipe, Distrito Federal, Mato Grosso e outros; talvez dez estados ao todo. Eu não lido com a articulação política – apenas informo Ronaldo Caiado com esses estudos – mas acredito que ele tem feito sua parte para se reunir com os demais governadores e apresentar esses dados. 

Italo Wolff – Qual alternativa existe?

Temos de colocar uma escolha na mesa. Nossa “bala de prata” é a simplificação do ICMS, ainda sob autonomia estadual, mas eliminadas suas imperfeições e burocracias, por meio de um Projeto de Lei Complementar que já está no Congresso, o PLP 283/2020. Esse projeto altera a Lei Kandir para simplificar e uniformizar regras do imposto estadual, produzindo melhor distribuição de renda entre as regiões do país. 

O ICMS é complexo, mas podemos harmonizá-lo. Como pontos positivos, vamos manter o pacto federativo sem extinguir a via de crescimento da arrecadação que os estados encontraram para promover inclusão social. Talvez o argumento mais convincente sejam os dados de crescimento e distribuição de renda em função da cobrança do ICMS. 

Italo Wolff – O senhor não concorda com a ideia de se substituir essa abundância de impostos cheios de exceções por um imposto único? 

A alíquota projetada para esse novo imposto sobre bens e serviços (IBS) é de 27%. Tudo aquilo que passamos 50 anos ajustando para calibrar o ICMS teria de ser feito novamente. Hoje, o ICMS médio dos estados é de 17%. As empresas de comunicação, como os jornais, suportam pagar 27%? Os médicos e advogados suportam; os mecânicos podem tirar 27%, além do imposto de renda que eles já pagam?

É claro que um imposto que englobe PIS, COFINS e tudo mais terá uma alíquota cheia altíssima. Aí eu te pergunto: quem não suporta pagar 27% de IBS, o que faz? Vai para a informalidade. O barbeiro, médico e mecânico vão para a informalidade, o que termina por reduzir a arrecadação. 

Italo Wolff – O senhor discorda da alegação de que os estados, ao abrir mão de impostos, perdem receita?

Sim. Isso é um suposto paradoxo, mas, na realidade, as isenções são concedidas a receitas que ainda nem existem nos estados e que podem ser criadas com a promessa de benefícios fiscais. Os estados que deram mais incentivos fiscais, cresceram mais. Norte, com a Zona Franca de Manaus, Centro-Oeste e Nordeste. 

Por que cresceram? Porque as empresas atraídas não geram receita para o estado apenas pagando ICMS, mas aquecendo a economia e consumindo diversos outros serviços que, sim, pagam ICMS. É uma falácia dizer que os estados abrem mão de receita pelas isenções, pois eles arrecadam mais ao atrair indústrias.

Não computamos isso no cálculo do crescimento por setor produtivo, mas toda indústria usa telefone, que gera ICMS para o estado. Usa energia, o estado recebe ICMS. Usa frota de veículos, o estado recebe ICMS. Esses carros usam pneus, o estado recebe ICMS.

Italo Wolff – O novo arcabouço fiscal pressupõe receita crescente para justificar investimentos crescentes. As isenções não vão contra essa lógica?

Esse é o problema. Na realidade, a reforma tributária é uma tentativa de arrecadar mais, sendo que o Brasil não suporta aumento de carga tributária. A reforma ideal deveria ser neutra. Ou seja, não pode aumentar impostos, sob risco de causar desemprego descontrolado. Em parte, é o que já estamos vivendo com a evasão de nossas indústrias para o Paraguai e outros países.
A solução seria alocar melhor os impostos. Cobrar do mercado financeiro, exportações, lucros e dividendos. É claro que simplificar tudo significa arrecadar mais da média, da maioria, que já está sobrecarregada. Temos de taxar as exceções.

Italo Wolff – Defensores da reforma dizem que ela equilibra os setores do agro, serviços e indústria. 

Essa reforma transfere carga de um setor para outro. A indústria, que é quem mais paga, transfere grande parte do encargo para o agronegócio, cuja bancada no Congresso não aceita a reforma. Afirmam que o setor não suporta o aumento para os teóricos 27% (alguns economistas falam em 30%). Mas, em parte, o setor de serviços também vai ser penalizado. 

A Confederação Nacional da Indústria (CNI) e outros representantes industriais apoiam a reforma por isso. Mas não acredito que a reforma seja boa nem para a indústria, porque ao extinguir a liberdade de estados concederem isenções, várias indústrias vão acabar sendo taxadas onde não eram.