“Independência é um pilar que todos estão no Ministério Público precisam defender”

31 janeiro 2021 às 00h00

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O procurador-geral de Justiça de Goiás, Aylton Flávio Vechi, encerra os primeiros dois anos de sua gestão exaltando parcerias com outros poderes e aproximação da instituição com a sociedade
Há dois anos à frente do Ministério Público de Goiás (MP-GO), o procurador-geral de Justiça de Goiás, Aylton Flávio Vechi, encerra no dia 8 de março o seu primeiro mandato. O balanço feito por ele é positivo em relação à imagem da instituição frente aos goianos. Em entrevista ao Jornal Opção, o procurador aponta que a desburocratização e o fortalecimento da atuação dos promotores são as marcas do MP-GO.
Aylton Vechi ingressou no MP-GO em 1990. Foi promotor titular nas comarcas de Alvorada do Norte, Rialma, Itapaci, Rio Verde, Itumbiara e Goiânia. Já foi chefe de gabinete e assessor administrativo da Procuradoria-Geral de Justiça e atua como procurador de Justiça desde 1998, com atuação na área criminal. Foi integrante do Conselho Superior do Ministério Público por 11 vezes e exerceu o cargo de corregedor-geral do Ministério Público por duas vezes. Aylton já integrou em três oportunidades a lista tríplice para o cargo de procurador-geral, sendo em uma delas o mais votado. Em 2019 ele foi o escolhido pelo governador Ronaldo Caiado (DEM). Seu nome foi o único colocado na lista deste ano, portanto, deve permanecer por mais dois anos à frente do MP-GO.
Além dos avanços no Ministério Público de Goiás, o procurador-geral da Justiça avalia os reflexos que a força-tarefa Lava-Jato exerce para a atuação de todas as investigações. Ele reconhece que houve alguns desvios, mas que o legado é inegável. “Correções de caminhos e eventuais equívocos que tenham sido cometidos, todos eles agora podem ser aproveitados como experiência para que a gente adote uma postura adequada e correta”, aponta.
Aylton Vechi também defende que as operações e investigações devam ser menos midiáticas. Segundo ele, é importante manter a população informada, mas é preciso dar maior destaque para a apresentação de resultados. “Temos que divulgar, mas com cuidado para que a denúncia não se pareça ou se transforme numa verdadeira condenação”, diz o procurador-geral de Justiça que é muito bem avaliado entre colegas promotores, principalmente por sua atuação moderada e de defesa das ações do MP-GO.
O senhor encerra agora os dois primeiros anos como procurador-geral de justiça do Estado. Como o senhor avalia que fica a imagem do MP frente ao trabalho realizado neste período?
A avaliação que nós fazemos de dentro do Ministério Público, pelo contexto da própria pandemia, é de um trabalho bastante efetivo. Conseguimos neste período atuar em todas as frentes, tudo pela preservação da vida e pela preservação da saúde. Agimos de forma coordenada, não só com o Poder Executivo, mas com o próprio Poder Judiciário. Fizemos um esforço para que atingíssemos esse objetivo.
O que a sociedade avalia, provavelmente, é de que o Ministério Público esteve próximo a ela e em defesa dela, especialmente no aspecto da pandemia, na preservação da vida e da saúde das pessoas. Fora esse contexto, era nosso objetivo desde o dia em que assumimos a procuradoria-geral fortalecer a atividade fim, ou seja, fortalecer o trabalho do promotor de justiça. Acredito que só dando melhores condições e fortalecendo a estrutura que o MP tem para os promotores de justiça, conseguirem entregar para sociedade aquilo que ela espera da instituição: a defesa dos seus interesses e direitos.
Todo esforço que fizemos na gestão é para que a força da instituição sempre fosse canalizada para aqueles que realizam a atividade fim do Ministério Público, ou seja, promotores e procuradores de justiça. Esse foi o nosso maior foco. Atingindo isso e fortalecendo esse trabalho, eu tenho certeza de que a sociedade conseguiu ser atendida naquilo que esperava do Ministério Público.
Sempre que há uma operação do MP, há opiniões questionando a forma midiática que as ações são realizadas, e posteriormente há ações que acabam sendo interrompidas na justiça, sem o resultado esperado inicialmente. Como o senhor observa isso?
Enquanto promotor de justiça eu sempre tive uma postura de publicar resultados. Acho que o Ministério Público tem o dever de investigar, especialmente quando se trata de operações. Acho que é um papel do MP exercer a investigação e não abrir mão de apurar crimes praticados por organizações criminosas, crimes do colarinho branco, enfim, toda gama de crimes que são próprios da atividade investigatória criminal do Ministério Público, mas com o cuidado de não antecipar resultados ainda não obtidos. Muitas vezes o MP, quando atua, acaba com a exposição midiáticas, não só em Goiás, mas no Brasil. Já vimos cidadãos que tiveram a biografia maculada e posteriormente, num juízo de mérito da apuração, há a absolvição já que não se comprovou prática criminosa. Temos que ter cuidado e coerência.
“Sempre tive o reconhecimento do trabalho, porque não deixei de investigar, mas publiquei a sentença condenatória ao invés de publicar a denúncia.”
Eu prego que o MP deve se preocupar muito com os resultados que se tem. Ao invés de dar uma publicidade muito grande para denúncia, mas é preciso que também não esqueçamos que a sociedade precisa da informação e precisa conhecer o que o MP faz, e isso só o faz através dos canais de comunicação e da imprensa. Temos que divulgar, mas com cuidado para que a denúncia não se pareça ou se transforme numa verdadeira condenação. Esse é o cuidado que sempre tive durante o meu período de atuação como promotor de justiça e sempre tive o reconhecimento do trabalho, porque não deixei de investigar, mas publiquei a sentença condenatória ao invés de publicar a denúncia. Essa é minha visão.

Promotores dizem duas coisas. Primeiro, que os protocolos indicados por sua gestão tornaram o MP de Goiás mais eficiente, mais normativo, mais institucional. Segundo, há os que dizem que o MP é mais burocrático. Como avalia a questão?
Eu desburocratizei o Ministério Público. Antes o cidadão chegava aqui no MP querendo uma certidão para saber se estava sendo investigado pela instituição. Ele tinha que percorrer por todas promotorias de justiça para saber se tinha alguma coisa contra ele. Hoje o cidadão chega no nosso site e extrai, automaticamente, sem nenhuma intervenção, uma certidão positiva ou negativa a respeito de qualquer coisa que tramite aqui no MP relacionado a sua pessoa. Isso é desburocratizar.
Eu eliminei o trabalho da promotoria que tinha que atender a esse cidadão. Eu eliminei a via sacra que esse cidadão fazia para obter uma certidão que é direito dele e o Ministério Público não dava. Fiz com que isso acontecesse de forma automática. Da mesma forma, nós estamos em um processo de transformação de toda nossa atuação finalística, que são as investigações e os inquéritos civis. Tudo isso passa a tramitar até o mês de maio de forma digital. Nós não teremos mais papel no MP. Tudo através de sistemas. Isso é desburocratizar a instituição.
Todos os pedidos que envolvam o interesse de promotores de justiça estão ao longo dessa gestão sendo encaminhados para sistemas automatizados e vamos concluir na próxima gestão. São sistemas que permitem que os promotores, por meio de seus computadores, façam o requerimento e obtenham as respostas. Isso é desburocratizar.
Antigamente o promotor tinha que levar ao protocolo, daí o protocolo encaminhar para o setor próprio, no setor tinha que encaminhar para o servidor, então fazia a prestação do serviço dele, para depois ir para uma instância de decisão e somente então chegava para o promotor a resposta da decisão. Não será mais assim.
Há o reconhecimento de toda classe e só conseguimos atingir algum grau de eficiência, na minha visão como gestor, ao desburocratizar a instituição. É isso que estamos fazendo. Óbvio que para chegarmos a esse nível de eficiência e de sistematização para tornar o MP todo digital favorecendo a resposta da sociedade, exige algum aprimoramento daquilo que estamos fazendo nas promotorias e nas procuradorias. Falo da inserção de informações nos sistemas. Isso leva tempo. Isso impõe um certo trabalho, mas não é de forma alguma burocracia. Estamos fazendo tudo dentro das melhores regras de gestão e portanto o reconhecimento de toda classe, pelo menos o que recebo de feedback, é de que há uma satisfação.
Sabemos obviamente que nem todos concordam, mas grande parte da instituição sabe que estamos num caminho progressivo e permanente e vamos continuar nessa linha de entendimento. É isso que fortalece o trabalho do promotor de justiça. Quando o promotor não tem que olhar nos arquivos em papel para saber se aquele cidadão está sendo investigado, porque isso é feito automaticamente pelo sistema, com as informações que foram alimentadas no sistema. As pessoas confundem que digitalizar os documentos para colocar no sistema seria burocrática, mas depois que se coloca consegue extrair informações importantes e prestar um serviço de qualidade. É preciso que se tenha essa noção.
Quando o cidadão era atendido antes, ele iria a cada promotoria, falava com o servidor, depois até o promotor para fazer a demanda dele. Hoje temos o canal que chama MP Cidadão. A pessoa entra no site do Ministério Público, faz a sua denúncia, ela automaticamente vai para promotoria de justiça. Após isso, essa denúncia chega ao promotor que avalia se é caso de atuação ou não. Sendo o foco de atuação se instala o procedimento devido e o cidadão quando faz a denúncia recebe o número daquela notícia de fato e consegue acompanhar a investigação como um todo. Antes, para o cidadão saber como estava o andamento daquela demanda que elevou ao MP ele tinha que ficar ligando para promotoria e o servidor tinha que atender a ligação, deixando de fazer algo que estava fazendo. Como agora o cidadão tem o sistema para checar como está o andamento daquela denúncia que ele fez, acho que conseguimos desburocratizar a atuação do Ministério Público.
“O fato de termos um canal, isso não impede o cidadão de ter contato com o promotor de justiça.”
Hoje o MP está mais próximo da sociedade, que consegue apresentar denúncias e se encoraja a participar desse processo?
Eu não tenho dúvida. Quando se tem o acesso fácil e que não depende do funcionamento da promotoria – hoje nós temos o regime do turno único e estamos com as promotorias trabalhando das 12h às 19 horas. A pessoa tem o canal MP Cidadão. Ali ele pode fazer a denúncia a qualquer hora. Facilitamos o acesso. A ideia é que a pessoa tenha o acesso e acompanhe o trabalho que está sendo desenvolvido em razão da denúncia que ele fez. Eu vejo como positivo.
O fato de termos um canal, isso não impede o cidadão de ter contato com o promotor de justiça. Eu digo isso toda vez que publicamente me dirijo a promotores de justiça: a nossa existência e manutenção depende da proximidade de nossos membros como cidadão com a sociedade. Nós não podemos nos distanciar da sociedade. Quando o cidadão quer ser atendido e percebe que o MP Cidadão não vai resolver e quer falar com o promotor, ele vai ter o promotor para levar sua denúncia e seu anseio e problema. Ele pode falar diretamente com o promotor. Nenhum canal desses que foram criados retira do cidadão a possibilidade do contato pessoal com o promotor de justiça. Considero extremamente relevante. O cidadão precisa ter possibilidade de contato direto com o promotor de justiça. E o promotor de justiça sabe que esse papel, que orienta, auxilia, encaminha, providência… em razão do contato que tem com o cidadão é essencial para existência da nossa instituição.
Há um legado da força-tarefa Lava – Jato para a atuação atual do MP?
Vamos fazer um extrato. Do ponto de vista técnico, a investigação no Brasil evoluiu muito depois da Lava Jato, em razão da experiência dela. Os resultados foram muito favoráveis. Tanto que do ponto de vista jurídico temos visto uma confirmação do trabalho desenvolvido pela operação até nos tribunais superiores. Vejo esse avanço muito grande. Aprendemos com os erros. E o resultado para sociedade eu creio que é positivo e encorajador.
Correções de caminhos e eventuais equívocos que tenham sido cometidos, todos eles agora podem ser aproveitados como experiência para que a gente adote uma postura adequada e correta. Onde achamos que erramos precisa corrigir. Vamos dessa forma, que se tratando de toda atuação da força-tarefa, nós tenhamos empregados os mecanismos que favoreceram as investigações no Brasil, principalmente nos crimes que envolvem autoridades que não eram sequer tisnadas pela atuação do MP e mais do que isso, corrigir eventuais distorções que possam não ter sido compreendida pelo próprio poder judiciário. Vejo como positiva. Prestou um bom serviço e acho que aprendemos.
Há quem afirme que o procurador-geral da República, Augusto Aras, ao poupar o presidente Jair Bolsonaro e o ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, das consequências do Covid — a questão da responsabilidade —, pode ter prevaricado. O que o sr. tem a dizer a respeito?
Eu não enxergo dessa forma. Como hoje em dia a informação chega muito rapidamente à sociedade, há, de certa forma, interpretações de tudo que chega. Eu vejo que é preciso reconhecer que não há autoridade que não esteja sujeita aos rigores da lei.
Na atuação em relação a pandemia e a própria vacina, a postura do Ministério Público tem sido uma só. Quem tem o trato mais próximo da pandemia são aqueles que conhecem a ciência e a medicina. Temos que nos apoiar nisso e ter fundamento para que haja preservação da vida e da saúde. A responsabilização daqueles que eventualmente caminham em sentido oposto precisa ser apurada. E uma vez constatada a existência de responsabilidade, que possa ser civil ou criminal, os caminhos da lei precisam ser adotados.
Eu vejo que há muita divagação sobre o fato, é evidentemente essa postura do procurador-geral da República, na prática, não vejo como se estabelecer uma isenção da responsabilidade aqueles que eventualmente deixaram de agir. Acho que o procurador-geral da República, quando instado, tomará das médias, como qualquer outro membro do MP toma quando há uma irregularidade, quando há prática de um crime ou mesmo de um ilícito civil.
A postura da instituição nunca foi de isentar, mas de apurar. Havendo constatação de responsabilidade, tomará as medidas cabíveis. É assim que vejo. Não vejo uma nota como resultado de uma atuação, uma nota que está sendo interpretada, pode não ter sido feliz, mas o importante é que no momento que for instado a atuar, não deixe de atuar. Até agora ele (Augusto Aras) sempre atuou. Vimos algumas providências que tomou, inclusive perante ao próprio Supremo Tribunal Federal no sentido de buscar o alinhamento de condutos à Lei. Não tenho dúvidas que isso na prática, uma vez chamada a responsabilidade para investigar qualquer fato, ele vá deixar de investigar. Isso não é próprio do Ministério Público.
“Temos ainda déficits e provavelmente havendo possibilidade de reposição dos cargos nós o faremos.”

Na avaliação dos processos referentes ao governo de Goiás, o MP tem se mostrado independente? Procede que o atual governo é bem avaliado do ponto de vista da probidade?
Independência é um pilar que todos estão no Ministério Público precisa defender. Temos uma atuação conjunta a todos os poderes e órgãos autônomos. Os problemas fiscais que o Estado passou e vem passando, todos eles são amadurecidos com todos os chefes de poder e instituições, conjuntamente na busca de soluções. Quando durante a pandemia tivemos os momentos mais graves, tratamos de forma sinérgica, colaborativa, conjunta e coordenada. Vejo que esse espaço é importante e ninguém teve sua independência comprometida.
Não é porque o judiciário participou de uma reunião onde estava o Ministério Público, o executivo e TCE e TCM, que algum deles perdeu a independência. Estamos ali em busca de soluções para o bem comum. Nesse aspecto não há no que se falar de perda de independência, nem para o MP nem para outro poder ou instituição.
O que posso dizer é que tivemos nos últimos dois anos uma força muito grande do Estado na busca por apuração de crimes. Nunca se investigou tanto na polícia como se tem investigado. Também há liberdade para a polícia fazer as investigações. Isso realmente há de ser conhecido. Não vou estabelecer comparações, mas eu digo o seguinte: quando nós do MP, que acompanhamos as ações da polícia e ação governamental, e não chegam mais tantas denúncias como se chegava em outras gestões, – não falo da última, mas de outras -, quando o compromisso de nós todos que estamos a frente das instituições e dos poderes é de permitir que a sociedade tenha o atendimento das suas necessidades e que o erário público está sendo empregado para suas necessidades, e isso tem sido reconhecido por todos. Eu vejo que estamos caminhando no sentido correto.
Eu não vou dizer das outras gestões, mas dessa gestão. Digo com muita tranquilidade porque participo como procuradora-geral de Justiça do Estado dessas reuniões e das articulações que se faz para resolver as questões da sociedade, e tenho visto como muito positivo. Quando promotor, portanto, em gestões passadas, eu verificava muitas denúncias. Aqui temos alcançado resultados, tanto o MP quando a polícia tem alcançado resultados e acho que o estado está se saneando e de alguma forma estamos com mais recursos para empregar em favor da sociedade.
O sr. concorda que procede que há carência de promotores e juízes no interior de Goiás? No caso específico do MP, o que precisa ser feito? Mais concursos?
Fizemos um concurso recente, em agosto passado demos posse a 20 promotores de justiça. Temos algumas regiões em Goiás que historicamente tem um déficit de promotores e essas regiões nordeste e norte do estado. E esses 20 promotores foram todos direcionados para essa região. Essa é uma região que tem déficit de promotores e é a mais carente do estado. Então é para lá que esses promotores foram dirigidos, muitos dos quais, inclusive, vão se titularizar nessas localidades.
Temos ainda déficits e provavelmente havendo possibilidade de reposição dos cargos nós o faremos, porque a movimentação dos cargos a gente faz assim: aquele que entrou como promotor substituto vai se tornar promotor de justiça de entrância inicial, então fica vago aquele cargo de promotor substituto. É esse cargo que a gente tem que repor. A reposição é por concurso público.
Eu sei que o judiciário hoje tem aproximadamente 80 vagas de juiz. A situação do MP é um pouco melhor do que isso. Mas com a movimentação desses promotores que assumiram em agosto, ou seja, quando eles se titularizarem em novas promotorias de justiça que estão vagas hoje, vai surgir a necessidade de um novo concurso público, que nós pretendemos fazer.
A Assembleia Legislativa aprovou, na segunda-feira, a Lei Orçamentária Anual (LOA). O MP aprova o projeto apresentado?
Historicamente, no Estado, a gente encaminha a proposta orçamentária ao Poder Executivo como determina a Lei. Daí então se encaminhava para o Legislativo a proposta que era entendida da forma mais correta e adequada dentro dos padrões orçamentários e financeiros do Estado. O que aconteceu agora é que no processo de se dar uma solução adequada, democraticamente o governador do Estado reuniu-se com todos os chefes de poder e de instituições autônomas e nós deliberamos esse projeto da LOA, conjuntamente.
Antigamente o que se fazia era que depois que a LOA era encaminhada a Alego, cada chefe de poder tinha que ir lá e falar com os deputados para cada um defender o seu pedacinho do bolo. Fazia o seu trabalho para conseguir resolver seus problemas. Agora, como tratamos disso de forma democrática, em uma reunião, eu não tenho que me preocupar. A proposta que foi para Alego é exatamente o que foi combinado. Então estamos tranquilos. Nós acompanhamos todos movimentos da Alego, porque é dali que sai todas as regras que afetam diretamente a sociedade e interesses do Estado, mas com relação a LOA foi muito tranquilo. Ela foi discutida antes de ser apresentada na Alego. O que foi aprovado é o que serve para o MP.
O governo de Goiás tende a aderir ao Regime de Recuperação Fiscal (RRF). Como avalia o impacto sobre o MP e poderes Legislativo e Judiciário?. A adesão significa que não se terá concurso e aumento salarial por determinado prazo?
Temos um déficit fiscal no estado e todo mundo reconhece isso. O MP participou de diversas reuniões tratando dessa questão. Hoje temos uma Lei Federal, que é a Lei 173 de maio de 2020, que estabelece e dá socorro aos estados e municípios em razão da pandemia. Ela estabeleceu inúmeras restrições à concessão de cargos, concessão de gratificação e concessão de auxílios. Então há uma limitação desde maio de 2020, que estamos sob a égide desta lei que tem sua validade até dezembro de 2021.
As regras aplicadas por essa lei são muito próximas daquilo que dispõe o Regime de Recuperação Fiscal. Portanto, nós já estamos nos trilhos destas regras. Estamos praticamente adaptados a isso. Infelizmente não podemos, embora às vezes eu até tenha necessidade, criar cargos e tudo mais porque temos essas limitações. E vamos caminhando com menos e fazendo mais. Tentando atender a demanda da sociedade e respeitando as leis.
A minha percepção é de que o governador e toda sua equipe tem tratado com extrema responsabilidade a questão do déficit fiscal. Nós tivemos uma melhora na arrecadação, Goiás até se destacou com o agronegócio, mas isso não é suficiente para que abandonemos as estratégias legais para solução do problema fiscal, cujo uma delas é o RRF. Eu confio nas autoridades que estão analisando e ajustando o estado para o ingresso no regime e se essa for a medida adequada, nós estamos prontos para nos sujeitar ao rigor do regime. Estamos bem preparados para suportar isso. É fato que a nossa demanda cresce muito e temos um quadro de servidores ainda restrito, não é suficiente para atender a população, mas onde não há espaço para criação de cargos, vamos tentar fazer com criatividade e responsabilidade , nós consigamos, durante o período em que o Estado eventualmente estiver no Regime de Recuperação Fiscal, atender a demanda da sociedade de forma adequada e suficiente.
“Em todas reuniões que tenho com colegas e promotores de justiça eu reafirmo que minha obstinação é fortalecer o trabalho do promotor e do procurador de justiça.”
Como o sr. analisa a situação da proibição, durante a pandemia e até hoje, das aulas presenciais integrais nas escolas e instituições de ensino em todos os níveis, que foi sugerida pelo governo e apoiada incondicionalmente pelo Ministério Público, e o paradoxo de outras atividades permitidas, como por exemplo bares abertos, onde as pessoas se sentam uma ao lado das outras na mesa sem máscara em ambientes fechados. O Ministério Público corre o risco de ser visto como defensor de que a educação é a atividade menos importante entre todas desenvolvidas na sociedade?
Não acredito nisso. A educação só serve para que o cidadão possa ser produtivo para sociedade. Agora se eu não tiver o cidadão porque ele teve um problema de saúde e morreu em razão da pandemia… em função da gravidade do momento, uma opção precisa ser feita. Justamente isso que está sendo cobrado hoje do governo federal, pelo negacionismo do presidente da República. Nós não podemos negar que o problema é grave, existe e temos visto, infelizmente, o que aconteceu em Manaus, o que está acontecendo no Pará, é para nós um momento de muita tristeza e muita angústia. As pessoas estão perdendo a vida.
Temos que ter o cuidado. Todos os cidadãos têm que ter em mente, que mesmo sendo jovem, convive com o idoso na casa dele e está levando Covid para casa. Estamos perdendo inúmeras vidas por aglomerações, e não grandes aglomerações, por vezes são pequenas aglomerações. Temos que pensar nisso.
Na escola o sistema que está sendo utilizado hoje, que é de videoconferência, não é o melhor sistema. Estamos longe do melhor método de ensino e sabemos que a proximidade do aluno com o professor estimula o aprendizado. Então acho que as aulas presenciais são extremamente importantes e essenciais, mas não posso me esquecer, que no momento, em razão dessa gravidade, é melhor que nós tenhamos um método alternativo, até que com segurança nós possamos colocar alunos e professores dentro do mesmo espaço.
Sabemos que o mesmo cuidado que um jovem adulto tem com sua segurança sanitária e saúde, não é o mesmo de uma criança. Ela não se preocupa tanto. E nosso receio que essa convivência em ambiente escolar, não só em sala de aula, mas em todo ambiente.Esse universo de circunstâncias que nos leva a defender que o momento agora impõem que tenhamos um metodos alternativo as aulas presenciais. não é que o MP entenda que o contato pessoal na escola não seja bom, ou não seja necessário. Ao contrário. Mas temos que fazer uma ponderação de valores, entre a vida, a saúde de quem está na escola e quem convive em casa, temos que pensar no grupo todo. Nesse aspecto eu tenho notícia que o sindicato das escolas tem se mobilizado e tentando ampliar os limites de 30 para 50% de alunos em aulas presenciais, mas mesmo assim, não é o adequado. Então não estamos perto de chegar a uma solução. A solução virá com a vacina. A partir do momento que tiver a vacinação dos grupos de risco teremos mais tranquilidade de começar esse processo de volta para a escola, com segurança e sempre preservando a vida e saúde de todo cidadão.
Como o sr. avalia a ação do Conselho Nacional do MP? Há quem postule que tem sido muito duro com os promotores.
Há várias visões. Recentemente vi em um jornal uma matéria dizendo que alguns congressistas apontam que o CNMP é muito corporativista e que o CNJ era menos corporativista. Eu não vejo assim. O Conselho Nacional do Ministério Público realmente pune muito. Temos inúmeros exemplos mostrando que ele é muito punitivo. O grande papel do Conselho não é esse. Nós temos as Corregedorias Estaduais e as Corregedorias da União. Elas funcionam e muito bem.
O CNMP tem um papel fundamental, fora esse de ficar apurando conduta, ou faltas funcionais de membros. Veja que há um universo de desigualdade imensa no País. O MP de Alagoas tem uma realidade totalmente diferente da realidade de Goiás, que tem uma perspectiva totalmente diferente do MP de São Paulo, que tem uma diferença muito grande da atuação do MP de Santa Catarina e do Acre. Neste universo de desigualdade o CNMP deve atuar para que o Ministério Público tenha uma única face para sociedade. Esse é o papel fundamental do Conselho Nacional do Ministério Público, deixando, na minha percepção, o papel de apuração de ilícitos funcionais praticados por membros para as corregedorias locais.
Acho que o grande peso do CNMP é fazer esse exercício e levar para todos os estados ferramentas de atuação correta, o acompanhamento da administração de forma correta para que a gestão seja empregada toda com esforço para atividade fim, como é meu objetivo aqui. Então fazer com que essas desigualdades diminuam para que o cidadão, estando ele em Goiás ou em São Paulo, reconheça a instituição do Ministério Público e saiba o que ela pode oferecer pra ele. Esse é o grande papel e grande legado que o CNMP deve deixar.
Agora os casos que eventualmente, não haja uma atuação adequada da corregedoria local, aí sim devem ser apurados pelo Conselho Nacional do Ministério Público. Mas eu não vejo o CNMP como corporativista ou leniente. É um conselho rigorosíssimo, tanto com relação às gestões do Ministério Público – porque eles têm os órgãos de controle da gestão das instituições-, como também da conduta dos membros da nossa instituição. São rigorosos.

Vemos muitos casos de corrupção; por outro lado, há vários sistemas de controle no Brasil: MPs, tribunais de contas, ações populares de cidadãos. Obras ficam paradas durante anos. Há como o MP contribuir para o sistema de controle ser mais racional?
Tem que ser mudado. Estamos tentando fazer isso aqui em Goiás. E volto a minha fala inicial sobre atuação sinérgica. Temos uma atuação conjunta e coordenada. Toda vez que temos uma ação conjunta dos diversos órgãos de controle envolvidos com compartilhamentos de informações, com compartilhamentos de iniciativas, agindo conjuntamente, conseguimos chegar a melhores e efetivos resultados de forma mais rápida.
Acredito muito que o que falta hoje nestes setores é a atuação compartimentada. Cada um faz o seu trabalho sem comunicar ou compartilhar com o outro. Nisso se perde muita energia das instituições. Se por exemplo o Tribunal de Contas do Estado está fazendo uma apuração de determinado fato que envolve a gestão estadual e compartilha comigo, nós começamos a trocar informações a respeito disso e certamente isso vai resultar num proveito melhor para sociedade. Eu acredito muito que essa atuação coordenada, colaborativa e sinérgica ajuda muito e faz com que as coisas funcionem.
Temos o Destrava, um programa iniciado pelo governo federal envolvendo o Ministério Público Federal, e vários setores. Aqui em Goiás temos um órgão dentro do MP que se chama Núcleo de Incentivo à Autocomposição, que incentiva o diálogo entre os responsáveis pelas soluções das questões apresentadas, esse programa surgiu em razão de que tem muitas obras no Brasil paradas. Inclusive o próprio procurador-Geral da República, Augusto Aras, teve papel fundamental na percepção dessa questão. Ele que saiu a frente, buscando junto ao governo federal e as instituições esse compartilhamento de informações e de ideias para que houvesse um esforço conjunto sobre essas obras paradas.
Aqui em Goiás conseguimos resolver praticamente 70% das obras paralisadas. Agindo de forma compartilhada dentro desse programa Destrava. Dialogando, verificando qual problema que o município teve, porque a obra foi descontinuada, porque a obra parou, se houve problema de ordem financeira, se não houve repasse, se faltou atitude perante a execução de contratos. Tudo foi apurado pelo MP, junto aos responsáveis pelo Município, pelo governo federal, de forma que conseguimos resultados que não teriam ocorrido se não agisse de forma compartilhada. A solução está aí: nunca nos isolarmos. O isolamento gera desconhecimento. E estamos na era da informação. Quanto mais informações o TCE me fornecer e eu fornecer a ele, o com o TCM, quanto mais diálogos entre as instituições, melhor é nossa atuação. Esse é o caminho como solução.
O senhor é o único promotor que se inscreveu para concorrer a vaga de procurador-geral de justiça para os próximos dois anos. Como o senhor planeja essa próxima gestão e qual marca o senhor quer deixar?
Eu tenho uma obstinação. Os colegas sabem. Em todas reuniões que tenho com colegas e promotores de justiça eu reafirmo que minha obstinação é fortalecer o trabalho do promotor e do procurador de justiça. Fortalecer a atividade fim. Todo esforço nosso continuará sendo esse. A administração do MP não pode servir a si mesma. Estou como procuradora-geral de justiça para dar à sociedade aquilo que ela espera do Ministério Público. Eu só faço isso se eu usar todo esforço da instituição para que o promotor atue cada vez mais, com mais apoio, com mais tranquilidade. Ai sim terei um resultado social.
Vou continuar trabalhando esse fortalecimento e modernizando a gestão, enxugando a gestão, fazendo com que jaka uma completa desburocratização da gestão. Falo com todo conhecimento que iniciamos esse processo, e vamos continuar nessa linha. Agora mesmo todos os promotores de justiça estão recebendo em regime de comodato um aparelho celular e dados para as comunicações do MP com o cidadão que busca a instituição. Como temos o mecanismo do whatsapp e ele serve para muitas coisas, nós vamos aplicá-lo para que o cidadão não precise se deslocar, mas recebe e faça suas comunicações.
Vamos avançar na gestão sem esquecer o lado humano, tanto dos promotores que precisam estar estruturados já que a demanda é crescente, e sem esquecer que só estamos aqui para o cidadão. A nossa existência é para servir ao cidadão. O meu objetivo é para que a sociedade seja atendida. Todo esforço que eu fizer nesse sentido alcançará o êxito na nova gestão. Atender a sociedade com promotores atuantes, com estrutura e apoio para dar resposta rápida. Esse é nosso objetivo maior.