Fabrício Amaral: “Goiás é conhecido no Brasil por sua natureza. Apostamos no turismo ecológico”

24 dezembro 2023 às 00h01

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Euler de França Belém, Italo Wolff, Raphael Bezerra e Bárbara Noleto
Fabricio Borges Amaral é presidente da Goiás Turismo (Secretaria Estadual de Turismo) e do Fórum Nacional dos Secretários e Dirigentes Estaduais de Turismo (Fornatur). Amaral tem uma longa trajetória no setor de turismo, tendo iniciado sua carreira como estagiário no Ministério do Turismo, em 2003, e chegado até a ONU (Organização das Nações Unidas).
Ele é autor da Lei Geral do Turismo, que regulamenta a atividade turística no Brasil, e de outras normas relacionadas ao tema. Ele também foi consultor legislativo da Câmara dos Deputados, assessor especial do ministro do Turismo e secretário nacional de Políticas de Turismo.
Em 2019, ele foi nomeado presidente da Goiás Turismo pelo governador Ronaldo Caiado, com a missão de promover o desenvolvimento do turismo no estado. Sob sua gestão, a Goiás Turismo realizou diversas ações, como a participação em feiras nacionais e internacionais, o apoio aos municípios turísticos, a criação de roteiros integrados, a capacitação de profissionais e a divulgação dos destinos goianos.
Euler de França — Porque temos tantos hotéis em Goiânia? De onde vêm nossos turistas?
Fabricio Borges Amaral — Veja bem, o turismo é uma pauta absolutamente econômic. Eu costumo brincar que a cultura tem valor e o turismo tem preço. Isso diz muita coisa. Turismo é toda movimentação de pessoas, segundo a Organização Mundial de Turismo e a Lei Geral do Turismo — que é como se fosse o Marco Regulatório do Turismo no País e que é da minha autoria, inclusive. Eu fui do Ministério do Turismo, fui da ONU, e eu fui contratado à época para fazer essa legislação.
Então, a premissa é: se a pessoa entrou na cidade, dormiu e consumiu, não interessa por qual motivo, isso é considerado turismo. Em Rio Verde, o turismo vem da movimentação corporativa do agronegócio. Em Goiânia, vem muito da movimentação corporativa de eventos, negócios, e saúde. Cerca de 80% dos passageiros da Gol e da Tam que descem em Goiânia são para fazer trabalhos corporativos. E, agora, vamos dizer de uns cinco anos para cá, o nosso lazer e entretenimento à noite tem chamado muita atenção do Brasil. A balada de Goiânia sempre foi celebrada, mas Goiânia entrou em um nível que chega ao do Rio e São Paulo, principalmente na cabeça das pessoas de fora, do Sul e do Norte-Nordeste, que querem vir para cá conhecer baladas e barzinhos. Na moda, a quantidade de pessoas é absurda.
Euler de França – Me falaram que a música atrai gente até de fora do país?
Sim, isso aqui virou uma Nashville da vida. E eu recebo gente de tudo quanto é lugar do país, que veio para cá acreditando que Goiânia seria onde a carreira artística iria deslanchar. Lá no interior ele é famoso, então ele vem para a capital como se fosse São Paulo. Eu não tenho certeza dessa informação, mas faz todo sentido: nos arredores do Parque Flamboyant há o maior PIB da música mundial,porque é onde está o escritório do Gusttavo Lima, do Leonardo, da Maraísa, do Alok… Todas essas pessoas produzem novos artistas.
Fizemos uma pesquisa recentemente e descobrimos que, dos dez maiores cachês de música no Brasil hoje, oito são sertanejos. Isso atrai muitas pessoas para Goiânia. Eu conheço gente que têm negócios no Brasil todo e optaram por morar em Goiânia, pela segurança e pela qualidade de vida. Por isso, acho uma pena a perda de potencial, gostaria que a prefeitura cuidasse um pouco mais da cidade, olhasse mais para esse aspecto, pois é uma cidade em evidência.
Italo Wolff – O Aeroporto tem capacidade de suprir a demanda?
O aeroporto está com uma logística aérea boa. Temos capacidade de crescimento de 60% das operações do aeroporto, com aumento de relevância viés internacional. É comum que, quem pensa em turismo, pense só em lazer, mas no nosso caso o turismo de lazer é o menor deles. O maior é corporativo; em Goiânia, a moda traz muita gente, mas principalmente pelo transporte rodoviário. O único lugar do Brasil em que a Tam tem uma loja de cargas é dentro da Região da Rua 44; pouca gente sabe disso. Porque? Porque facilita a logística de distribuição do comércio eletrônico, que cresceu muito. A Rua 44 deve movimentar agora, no fim do ano, quase R$ 2 bilhões em vendas.
Euler de França – As pessoas que fazem turismo de negócios também querem visitar a cidade, ver alguma coisa. O que o turista tem para fazer em Goiânia?
Na minha avaliação, acho que Goiânia tem uma carência muito grande de museus. Recentemente estive na Europa a trabalho e é impressionante. Tudo quanto é lugar que você vai tem museu. Temos carência de atividades em Goiânia no fim de semana. Você tem as feiras, que são muito famosas e geram muito interesse, sobretudo das mulheres. E à noite temos bares e restaurantes. Por isso, nossa grande dificuldade é convencer o turista que vem trabalhar aqui de segunda a quinta a ficar até domingo com a família. O fim de semana em Goiânia é considerado baixa para a hotelaria.
A gente estava falando do sertanejo; seria muito bom se a tivéssemos um circuito do sertanejo em Goiânia. Independente do gosto musical, eu gosto mais de rock [risos]. Quero comer uma comida típica, quero vestir flanela, quero saber onde o Gusttavo Lima mora e tirar uma foto com artistas de que gosto, quero ir numa praça que toca viola caipira 24 horas. Ou seja, tem que ter uma conexão que justifique as pessoas virem para cá e permanecerem aqui no final de semana. Isso é um projeto nosso, mas depende muito da prefeitura. Estamos apostando muito no centro, mas o centro infelizmente não tem sinais de que vai ter vida nos próximos anos.

Italo Wolff — O senhor deve ter visto o projeto de revitalização do Centro. Eu queria saber a sua opinião. O senhor acha que resolve?
Eu gosto do projeto, mas sou contra a maneira de colocar o projeto para a sociedade. Esse projeto do centro mexe com infraestrutura, ele mexe com questões que não se faz em um ano ou dois anos. Qual é o grande problema do Centro? A pauta política, a descontinuidade. Um prefeito chega um e faz um projeto, chega outro e faz outro projeto. Um vai empurrando para o outro.
O que deveria ser feito no centro, de forma muito prática? Ali no Centro de Convenções, já temos a Casa do Turismo, onde tem o Centro de Atendimento do Turismo, com artesanato para vender e ao lado tem a polícia. Então vamos pegar esse lugar como um eixo de estruturação. Pegue dois quarteirões para cada lado e isente o IPTU por 10 anos para quem quiser empreender e morar lá. Cerque a região, não deixe carro passar em ruas menores, e crie um grande espaço movimentado de convivência, de música, de cultura. Os livros antigos também estão lá, é um atrativo. Porque não?
Uma coisa de que eu gosto muito em Gramado é que a cidade respeita o plano diretor. Em Goiânia, cadê as fachadas padronizadas? A gente perde dinheiro. Em Pirenópolis, lá na rua do lazer, já repararam que todas as fachadas é padronizado? A Cielo chegou e bancou toda a construção da rua, mas tinha regras. Se não estivesse tudo padronizado, não receberiam o dinheiro. Então, culturalmente a gente ainda tem essas dificuldades.
Raphael Bezerra — O Centro tem um problema em relação à segurança com os moradores de rua?
Isso é um problema social do Brasil. Então esse tipo de problema social, eu não posso esconder ele. Fiz um projeto com o ministério público para resgatar e treinar vários moradores de rua e oferecer treinamento profissional. Hoje vários trabalham nos restaurantes que frequentamos em Goiânia. Eram pessoas viciadas em crack, algumas conseguem deixar o vício e outros não, mas é nossa obrigação dar essa assistência. Essas pessoas merecem uma atenção da sociedade.
Euler de França — O que é mais visitado em Goiânia?
Hoje, seguramente os bares e restaurantes. A gastronomia de Goiânia é muito boa, tanto é que o Ian Baiocchi tem quatro restaurantes e ganhou prêmios de nível nacional. Os hotéis também não deixam a desejar.
Euler de França — O Castro’s continua sendo um hotel de qualidade?
Continua, porque ele se reinventa, faz feijoada no sábado, traz música. A infraestrutura está boa. O hotel retirou o carpete, que não faz sentido mesmo em uma cidade tropical como Goiânia. É um empreendimento para se inspirar, porque se não me engano o Castro’s é de 1980, junto com o Serra Dourada, o Autódromo e o Centro de Convenções.
Euler de França — Eu já ouvi pessoas que vieram para Goiânia para conhecer as obras do Niemeyer. O Centro Cultural Oscar Niemeyer (CCON) virou referência turística?
Eu fui gestor do CCON por dois anos. Quando peguei, não funcionava nada. Hoje nós temos duas bibliotecas funcionando. O Oscar Niemeyer é um complexo, um dos complexos dele é um museu de arte contemporânea – que é aquela parte redonda – a biblioteca adulta é de arte contemporânea, só arte contemporânea. Então você tem uma curadoria especial ali para os livros entrarem e saírem. E tem uma biblioteca infantil linda. A gente também abriu licitação para um cinema que está maravilhoso, teve mostras de cinema no subsolo. Hoje é o melhor cinema de Goiânia, sem sombra de dúvida. Não sei se vocês tiveram a oportunidade de conhecer. O Natal também começou na minha gestão, em 2020. Hoje virou uma loucura aquilo lá, a OVG que toma conta. Então o espaço voltou a ser utilizado. Esse ano espera-se cerca de um milhão de pessoas. Tá dando uma média de 20 a 50 mil pessoas por dia. A gente até avaliou tirar, mas não tem para onde levar. E a gente fez uma pesquisa com a sociedade e teve um grau de aprovação de 99,8%. Porque lá é um espaço icônico, né? A gente gasta pouco dinheiro para fazer o natal. A OVG, no caso, contratou um pessoal de Gramado e fez uma história. Se você entrar lá, é como se fosse um circuito contando histórias de Papai Noel. E tem espetáculos todo dia. Para fechar sobre o Oscar Niemeyer, o último desafio, eu tentei e acabei saindo, então o projeto parou, que era de montar um restaurante na cobertura. Que seria para aproveitar 100% do potencial do Oscar Niemeyer.
Euler de França – A biblioteca funciona? Mas e aquela história de que não aguentava o peso?
Aquilo é balela. Temos parecer da Goinfra, inclusive. Quando cheguei à direção, a primeira coisa que pedi foi um estudo sobre isso. Não tem risco de cair. Ambas bibliotecas estão funcionando, inclusive a infantil.
Euler de França – Quanto o turismo representa para a economia de Goiás e de Goiânia?
Temos de Goiás, a última pesquisa que fizemos aponta para 8,2% do PIB. Considerando que nós estamos em um Estado veementemente do agronegócio. E nós somos, no setor de serviços, disparado o que mais gera empregos. O turismo hoje é um dos segmentos que mais gera serviços no Brasil. O hotel Castro’s tem 200 funcionários, qual indústria tem 200 funcionários? Só as gigantes. Então o turismo representa distribuição de riqueza, geralmente são empresas muito pequenas e com um nível bacana de empregos e renda.
Euler de França – Eu estive agora em setembro no Parque Nacional das Emas, uma coisa eu achei muito interessante, devia ter umas 300 pessoas, dessas eu acho que umas 200 eram estrangeiras. Russos, italianos, ingleses, americanos, japoneses, chineses. Primeiro que eu não vi gente falando essas línguas por lá para atender. Porque a gente não tem uma política de incentivo ao turismo nos parques?
Nós temos dois parques nacionais em Goiás e a gente tem uma dificuldade com isso, porque a gestão não é nossa. Chapada dos Veadeiros, Cidade de Goiás e Parque das Emas são inclusive patrimônios mundiais ambientais reconhecidos pela Unesco. Isso é muito forte, porque o reconhecimento da Unesco é universal. Então quando um russo chega lá e vê o símbolo da Unesco, ele já entendeu como é que funciona aquela história toda. E isso é muito significativo. Agora, na minha opinião pessoal, eu não acho que o Estado, digo qualquer órgão público, não tem competência de cuidar de unidades de conservação, não dá conta.
Euler de França – E, por exemplo, o Parque Estadual Altamiro de Moura Pacheco?
Todos eles, todos tinham que ser concessionados. Obviamente o Altamiro tem questão de reservatório, mas assim, com exceções. Nós temos, se eu não me engano, 23 unidades de conservação estaduais. Está em fase de concessão em Caldas, em Pirenópolis e em Terra Ronca, que é belíssimo, que são as cavernas. O Parque Nacional dos Veadeiros é concessionado, é uma empresa que está bem lá, está bem cuidado. E o [Parque] das Emas, na minha visão, também tinha que abrir uma concessão.
Euler de França – O Parque das Emas está bem cuidado.
Sim, tá bonito. Mas eu digo o seguinte, quem é o grande exemplo hoje do Brasil? Foz do Iguaçu. Tanto é que “roubaram” o Munir, que é muito amigo meu, que era o CEO do grupo Resorts, e contrataram ele para ir para lá. É porque não tem investimento, o Estado não consegue. Aonde tem investimentos privados, gera mais emprego, mais fluxo, menos degradação ambiental, menos fogo. Então o privado ganhando dinheiro, com um bom contrato de concessão, ele vai cuidar da unidade de conservação. Isso é no mundo, não é? Então o Governador [Caiado] entendeu isso, a gente tá conversando com o BNDES para concessionar os Parques Estaduais de Goiás. Os acessíveis, não é coisa cara. E aí você de fato transforma. O grande apelo de Emas é a observação de pássaros, se você pegar o volume financeiro de observação de pássaros nos Estados Unidos, chega a bilhões. E o Brasil explora 0%.
Ali tem dois problemas, que é a distância, é longe pro público amplo. Em Brasília são 4 milhões de pessoas na mesma redoma, lá não tem. E o segmento lá não tem tanto apelo cênico. Lá nunca vai ter volume, lá é para quem gosta de animal e observação. E que é um público interessantíssimo, porque é um público de ticket alto, é um público que paga caro por isso. Vamos mergulhar nessa história toda e trazer os gringos para cá, eles gostam.

Bárbara Noleto – E vale pensar no turismo ecológico?
Totalmente. Hoje a tendência é essa. Esses dias eu perguntei pra minha equipe, como posicionar Goiás lá fora? A gente precisa ter uma cara, o que é Goiás? É o pequi? O sertanejo? A natureza? O que que é? Então a gente foi e fez essa pesquisa, e “natureza” ganhou disparado. E aí a gente está se posicionando. Já lançamos o Caminho de Cora, os Encantos do Planalto Central, e eu vou lançar um outro caminho, que se chama Caminho Goyazes, são 1200 km. Então a natureza hoje é o nosso carro chefe. O que a gente tem de diferencial fora do país e dentro do Brasil? Natureza. Todo mundo tem comida boa, nossa comida é ótima. Todo mundo tem balada, sendo de sertanejo ou não, Salvador e Rio tem baladas. O nosso sertanejo é singular. Eu gosto dessa palavra. O que Goiás tem de singular, que vai te tirar de dentro de casa? Então, como só tem em Goiânia, eu quero ir lá em Goiânia.
Italo Wolff – O que é o caminho Goyazes.
Eu gosto muito da questão da natureza conectada com as pessoas, quando eu vi o caminho de Cora, ele é de 2010, só que não tinha nada. Então o caminho Goyazes vai sair de Goiás, passar ali em todos aqueles municípios, chegar em Corumbá. Vai passar por Abadiânia, Olhos d’Água, Santo Antônio do Descoberto, Brasília, aí vira o Planalto Central. Atravessa todo o planalto central, vai até Formosa. De Formosa até Cavalcante é o caminho dos Veadeiros. Então vão ser, na verdade, quatro caminhos, totalizando 1200 km, o único caminho do mundo que conecta três patrimônios mundiais. E essa é a nossa estratégia, sim. E ligar Goiás, Brasília e Chapada [dos Veadeiros] com história, porque faz parte da colonização do Brasil. Tem toda uma história ali dos índios, dos bandeirantes, da ocupação do território. E a gente no caminho vai contando essa história, os guias contam sobre a corrida do ouro. Então o Caminho Goyazes, para nós, vai ser uma jóia. Porque hoje, o caminho de Cora é 100% sinalizado, com banco, ponto de parada, placa de poesia, tá lindo. O trajeto pode ser feito de bicicleta, a pé, ou a cavalo, de carro não dá pra fazer. Tem caravanas de cavalo. Eu fiz quase 90 km a pé. Eu fiz ele picado, foi bom, vale a pena. Mas eu fazia uma média de 20 km por dia, com pousadas boas, comida boa, cama boa. Eu, por exemplo, dormi em uma pousadinha depois de Pirenópolis, em Radiolândia. Você chega lá e o cara tá te esperando com uma carne assada, uma cervejinha. Então não é só a caminhada.
Euler de França – E onde começa?
Começa na cidade de Goiás, passa ali em Ouro Fino e vai embora, chega ali no povoado de Itaberaí. E sempre prioriza os pequenos, trilhas de longo curso para conectar unidades de conservação. Imagina uma onça que saiu do Acre e precisa chegar em Porto Alegre. Então a ideia é montar um grande corredor ecológico. Ainda mais se puder agregar história, então tá muito legal. A gente agora tá numa fase social, ano que vem a gente vai mandar um projeto que chama Águas de Cora, para ir nas escolas, contar do meio ambiente, o projeto saiu um pouco do turismo, mas entrou numa área que eu gosto muito, que é cuidar das pessoas. É conversar com a comunidade local, eu passei por lá e o cara vendendo água me agradeceu. “Filho, eu ganho cinco vezes mais vendendo água do que capinando lote”. Então deu certo, ele já está vivendo do caminho de Cora. Então eu vou levar pro governador, na verdade, um grande projeto de Estado. O caminho Goyazes dá mais de 40 municípios, 700 mil pessoas envolvidas no caminho Goyazes. Então, nesse corredor, imagina a gente tratando de tudo, desde o empreendedorismo até o meio ambiente, conservação das matas ciliares, geração de emprego. Que as pessoas não precisem sair daquele local para ter dignidade de trabalho.
Euler de França – E a segurança?
Nós estamos bem na segurança, não tem índice de roubo em Goiás num nível que preocupe. Mas é um projeto também, junto com a polícia, de criar uma polícia turística, com drones e rádios. Mas, por exemplo, no caminho de Cora, quando as pessoas vão fazer, tem um sistema onde os associados sabem que tem alguém fazendo. Se a pessoa se perder por mais de X horas, já aciona a polícia. Então é um projeto também de segurança pública, mesmo que a gente nunca tenha tido problema de violência no caminho de Cora, pelo menos nos últimos cinco anos que eu estou no governo. É bem legal, é um negócio que eu sou entusiasta.
Raphael Bezerra – Eu quero voltar um pouquinho no tempo para a gente falar sobre a pandemia e a pós-pandemia. Como Goiás se posicionou e se preparou nesse momento? E como foi a recuperação na pós pandemia?
A pandemia foi dura demais. A gente olha para o lado das mortes e das perdas, que é o mais importante obviamente. Mas do ponto de vista da economia e da sustentabilidade, para nós foi uma tragédia. As pessoas não podiam sair de casa, não podiam circular, e isso é no mundo, em Goiás não foi diferente. Teve várias falências de hotéis e pousadas no Brasil todo. Muita gente não conseguiu voltar, e um segmento foi muito afetado e não voltou de fato, é o segmento de eventos. A gente acha que voltou 20%, um centro de convenções não se volta da noite pro dia. Inclusive estão com problemas lá, a gente está tentando ajudar. Mas surpreendentemente a gente apostou no óbvio, não foi nem questão de ser competente ou não competente. “Vamos apostar nos destinos emissores de Goiás” que é São Paulo, Brasília e Minas. Eu fiz trabalhos lá nesses locais e as pessoas vão viajar de carro. E aconteceu, essas pessoas realmente intensificaram suas viagens de carro e não desistiram delas. Então, hoje, por exemplo, Pirenópolis que meio de semana estava vazio, hoje não fica vazio mais. Não foi por acaso. Em São Paulo a mesma coisa, é até um problema, porque na Chapada dos Veadeiros os preços estão altíssimos pela oferta e demanda. Então eu acho que a gente passou bem a pandemia, num ponto de vista geral de recuperação econômica, e mudou o comportamento. O que é mudar o comportamento? A conexão com a natureza explodiu. A conexão com a natureza, hoje, todo mundo quer ir pro mato. todo mundo quer ter contato com a natureza, o respeito aos animais – que é uma pauta que eu acompanho com muita força – aumentou muito. No caminho de Cora Coralina hoje, se você ver alguém jogar o lixo na rua, alguma pessoa vai dar uma bronca. Isso é um sinal do senso de responsabilidade, que é muito legal. Então é por isso que a gente tem que apostar no turismo de natureza, que é uma das nossas bandeiras. A gente fala que a pesca esportiva de Goiás está muito bem, é a melhor do Brasil disparado.

Euler de França – Mas onde?
Tudo quanto é lago e rio em Goiás, hoje, se pesca de forma esportiva. Cota zero prisões, isso é o governador implacável. Eu fiquei muito feliz, porque eu apostei em política pública para a minha pasta e o governador enxerga muito mais que aquilo. Então, hoje, se você levar um peixe no seu carro você vai preso, mas não escapa. E nós viramos referência nacional. No ano passado, eu fiz 14 torneios de pesca esportiva em Goiás. E as cidades não cabia tanta gente para dormir. Recolhimento de lixo, palestra em escolas, a polícia ambiental presente, tudo o que você imaginar. Então hoje Goiás é referência na pesca esportiva, mas muito por essa questão da natureza.
Euler de França – É uma pesca preservacionista, né?
Muita gente critica e eu entendo a crítica. Porque tem gente que não quer que pesca de jeito nenhum. E a democracia é o diálogo absoluto, né? Mas os caras que matavam os peixes lá na beira do rio, hoje, estão ganhando 50 mil reais por dia como guia de pesca. Então era o cara que matava o peixe de forma irresponsável, predatória, matava matriz, ele é quem preserva hoje. E eu estou falando de centenas de pessoas. Então é uma pauta também muito interessante para o Estado de Goiás.
Euler de França – A Art Déco em Goiânia tem a ver só com a prefeitura?
Não, não tem a ver só com a prefeitura, mas o que acontece? Nós não temos Art Déco em Goiânia mais, digo do ponto de vista de apreciação, de vivência. Um dos grandes papéis do poder público é a normatização. Eu sou empresário, eu falo, o poder público não pode ser protagonista em quase nada. Quem gera emprego e renda é empresário e tal. Mas no ponto de vista de regulamentação e normatização é a prefeitura, mas não faz. Não temos uma normatização de recuperação de Art Déco. Parece que vira um problema para o dono daquele lugar. A gente tem uma inspiração em Versalhes, se você observar o formato de Goiânia, naquele triângulo central é idêntico a Versalhes. É maravilhoso, são coisas belíssimas. Eu estive na Europa nesse semestre e a gente fica saudoso. Porque Goiânia é uma cidade muito nova, né? Tinha que preservar. Quando você vai na Europa e fala que possivelmente Goiânia tem um centro preservado de Art Déco, você teria o interesse dessas pessoas virem para cá. Mas hoje, infelizmente não acontece.
Raphael Bezerra – E ainda assim vêm muita gente de fora, eu fui fazer uma reportagem e tinha um espanhol e uma argentina, o pessoal visitando o Teatro Goiânia.
O Teatro tá legal. Mas é igual eu falei, eu acho que a Art Déco é um dos elementos dessa história toda. Tinha que pensar uma coisa sistêmica e a longo prazo para o centro de Goiânia. E eu acho que o Estado tem que estar envolvido, sim. O Estado tem um poder financeiro maior, o Estado tem uma capacidade administrativa maior. Então são as autoridades políticas se juntarem e criar um grande projeto, de uns 20 anos, para o centro e começar. Ninguém vai fazer da noite para o dia. O atual prefeito, Rogério, que eu adoro, mas não vai fazer nada daqui para julho, é impossível. Porque assim, podia ter todo o dinheiro do mundo, não é assim que funcionam as coisas.
Euler de França – E não tem uma ideia de ônibus de turismo uma vez por semana, pelo menos no domingo?
Tem empresário de olho nisso, te falo em primeira mão. Tem uns dois empresários querendo comprar o ônibus de City Tour, daqueles que tem em Brasília, vermelho. Não sei se vocês já viram, mas é parecido com aquilo. Não é barato, aquilo é milhão de reais pra cima. Tem empresário já fazendo estudo de viabilidade. Seria legal, a gente tem boas oportunidades aí.
Euler de França – Na verdade, tem museus em Goiânia, tem coisas para ver, tem a casa do Pedro Ludovico.
Tem um museu de arte contemporânea lindo. Fiz amostras do Siron Franco lá. Então dá para montar roteiros.
Euler de França – E o Siron Franco não é um personagem mal explorado, não? Porque o Siron Franco em si é um museu.
Pois é, rapaz. Já pensou? Sabe que eu nunca conversei disso com ele, não tenho uma amizade.
Euler de França – Aqui no Brasil não se dá valor aos vivos, só depois que morrem. Aí vira demônio ou santo.
Seria bom, seria um prazer. Mas quer saber de uma experiência interessantíssima que eu tive? Eu levava escolas públicas para dentro do museu, eu fazia questão. Me diziam que os meninos nem iam entender nada, mas a ideia é essa mesmo. É para entrar e sentar lá, ter um mundo de orientação e deixa as crianças verem os quadros, ajuda eles a interpretarem. A gente toma muito cuidado com a questão da idade, e foi um sucesso danado. Você descobria verdadeiros talentos ali em questão de segundos. Meninos de oito, nove ou dez anos de idade que tinham uma percepção das obras que muitos adultos não tinham. A gente também levava alguns autores. Então, é uma pena quando a gente não tem essa cultura valorizada.
Italo Wolff – Sobre Caldas Novas, qual sua perspectiva sobre a cidade? Porque a gente tem a impressão de que está em um momento de decadência, né?
Olha, o que aconteceu em Caldas? O ticket lá é baixo, paga menos e é claro que as massas vêm. E eu acho que tem que ser democrático para ser. Não se trata disso. Uma das ideias lá é a diversificação de ofertas. Então são dois pontos importantíssimos. Uma articulação do governador vai duplicar a via de Morrinhos a Caldas. E isso é muito importante, uma entrada bonita, tudo isso já está acontecendo. Estão trabalhando lá. Volto à história dos parques, vamos concessionar um parque lá. O cara vai ficar três dias na água quente e vai ficar mais um dia para visitar o parque. Ele pode ficar mais dois dias, para tomar um banho de cachoeira. Ele vai observar os pássaros, pegar um teleférico, andar de bike. Então a diversificação da oferta tende a requalificar o público. Eu tenho muito cuidado com isso, porque a única coisa que a gente não gostava era aquela bagunça de carnaval, aquelas coisas envolvendo sexualidade no meio da rua e tal. Coisas assim, que denigrem inclusive a imagem da família. E aí entra um ponto importantíssimo, quem paga a conta é a família.