O principal “adversário” de Lula da Silva é o “já ganhou”
13 fevereiro 2022 às 00h01

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O maior rival do presidente Jair Bolsonaro é a publicidade “negativa” que ele mesmo faz do seu governo
Sabe-se, desde sempre, que não se ganha eleição por antecipação e que o futuro nem a Deus pertence. Há candidatos que começam as campanhas com números gigantes e terminam derrotados por postulantes que eram considerados eleitoralmente mais fracos.
Cientistas políticos experimentados, como Antônio Lavareda e José Álvaro Moisés, sabem que pesquisas são registros de momentos. Captam o “calor” e o “humor” da circunstância. Claro que há, porém, a possibilidade de o crescimento de um candidato cristalizar-se e se tornar incontornável. Por isso aquele postulante que estiver em segundo lugar não pode perder contato com o que lidera as pesquisas de intenção de voto. De algum modo, tem de se manter próximo, com a chama acesa de que poderá, adiante, superar o primeiro colocado.
Já o candidato que está à frente, mesmo se ainda estiver em ascensão — sugerindo que pode não ter teto —, precisa ter cuidado redobrado com o otimismo em gotas dos aliados. Observe-se que, mesmo tendo se isolado na liderança, Lula da Silva está buscando costurar alianças políticas e, também, empresariais. Há quem postule que já está preocupado com a governabilidade, tentando criar uma força política para que possa governar com mais tranquilidade. Quem pensa assim tem razão em parte, porém não inteiramente. O petista-chefe está preocupado mesmo é com a eleição de 2 de outubro — que será realizada daqui a sete meses e 15 dias.

Lula da Silva costura para ampliar sua frente e, ao mesmo tempo, sedimentá-la. Porque sabe que, quanto mais apoios conquistar, a expectativa de poder se eleva. Instala-se na sociedade a ideia de que é “invencível” e, sobretudo, de que o adversário — no caso, o presidente Jair Bolsonaro — está isolado, e, portanto, sem expectativa de poder.
Se se fiasse tão-somente nas pesquisas, a raposa política Lula da Silva se acomodaria, e até aceitaria os rogos dos radicais do PT para se afastar, por exemplo, do conservador moderado Geraldo Alckmin, ex-PSDB. Pelo contrário, o petista-chefe está se aproximando de outros tucanos, como Aloysio Nunes, e articulando apoio a candidatos não petistas aos governos de Pernambuco e Minas Gerais.
A articulação de Lula da Silva em várias regiões do país, sugerindo que o PT está mais interessado na Presidência da República dos que nos governos dos Estados, sinaliza que admite que a parada ainda não está definida.
A vivência de Lula da Silva, um político astuto, certamente lhe sugere que a peleja deste ano poderá ser uma das mais duras da história do país. Uma campanha pesada, com um marketing afiado — requentando acusações contra o petista, mesmo que este diga que foi “absolvido” pela Justiça —, pode tornar a disputa mais acirrada e, portanto, polarizada.
A direita bolsonarista não vai entregar o ouro — o poder — com facilidade. Temas como a prisão de Lula, a história de corrupção no seu governo e seus projetos “autoritários” — como a ideia de regular a Imprensa — serão recolocados ante os olhos dos eleitores.
Uma campanha tipo carnificina verbal, com as redes sociais e as ruas conflagradas, é menos útil para Lula da Silva do que para Bolsonaro? Os dois são estilo teflon. Mas um deles será visto como mais teflon pelos eleitores. Quem, não se sabe ainda.
Conquista de novos apoios é crucial
Sabe-se, pela histórico das disputas, que os eleitores definem seus candidatos em cima da hora. Seja porque querem examinar o que cada um diz a respeito de melhorar sua vida, observando qual é mais crível — portanto, verificando o histórico dos postulantes. Seja por inércia. Políticos e jornalistas tendem a acreditar que aquilo que estão discutindo, com certa quentura, interessa profundamente aos votantes. Talvez não interesse tanto assim. É provável que estejam mais preocupados com os jogos do time do coração, com o lançamento de um novo automóvel, a aquisição de um imóvel, a inflação, o preço da gasolina e o desemprego. Por vezes, até com a fofoca do dia: quem é a mulher tatuada que o ator Reynaldo Gianecchini está, supostamente, namorando? Aquilo que parece ser decisivo para jornalistas e políticos talvez não o seja para as demais pessoas.
Portanto, vale insistir que Lula da Silva “não” está eleito, como sugerem as atuais pesquisas, e Bolsonaro não está politicamente “morto”. Não se pode nem mesmo sugerir que não há possibilidade de um candidato de centro crescer e disputar o segundo turno com o petista ou com o político do PL.
Haveria eleitores “envergonhados” de Bolsonaro portando-se como “indecisos”? Não se sabe, mas não é improvável.
Por isso, a campanha, que vai acirrar os ânimos — possivelmente, sem criar um debate produtivo, de interesse do país —, é que vai decidir o próximo presidente do país. O momento atual mostra Lula da Silva fortalecido e Bolsonaro fragilizado. Mas pode ser o quadro atual. Com o contraditório ressurgindo, com o acirramento das linguagens, há a possibilidade de a situação mudar? Não dá para saber, claro. É preciso esperar um pouco mais.
Lula da Silva e Bolsonaro são duas raposas, profundamente intuitivas, sem descurar da racionalidade, e por isso são, ambos, perigosos um para outro. Convém não subestimar nem superestimar nenhum dos dois.
Dada sua linguagem tosca e sua dificuldade de elaborar ideias e argumentos, Bolsonaro às vezes é subestimado por analistas políticos. Mas seus números nas pesquisas não são inteiramente insatisfatórios. Uma leve subida pode criar uma nova expectativa de poder. Uma leve queda de Lula da Silva pode criar a expectativa de que pode ser vencido. Por isso os dois operam, neste momento, para conquistar novos apoios.
O petista busca amparo no centro. Bolsonaro procura a força da centro-direita. Não será surpresa se, adiante, o União Brasil, com o objetivo de operar contra Lula da Silva, caminhar em direção ao presidente.
Resta concluir que, neste momento, o maior adversário de Lula da Silva é a história do “já ganhou” e o maior rival do presidente é que não sabe “vender” aquilo que há de “positivo” no seu governo. O marqueteiro de Bolsonaro certamente terá de convencê-lo a parar de fazer o marketing do “negativo”. Se a maioria dos brasileiros está vacinada, com recursos do governo federal, não há razão para o presidente continuar com o discurso anti-vacina.