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O presidente Lula da Silva (PT) e o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) não são cultos como Fernando Henrique Cardoso, mas são muito mais políticos, no sentido de serem populares e de entenderem os humores — e suas mudanças — dos cidadãos.

É óbvio de nem Lula da Silva nem Jair Bolsonaro confiam puramente em intuição. Por isso municiam-se, o tempo inteiro, de pesquisas tanto quantitativas quanto qualitativas. O segundo pode até apresentar suas desconfianças em relação à ciência. Porém, na prática, não abdica dela. As estatísticas e os cruzamentos de várias informações, a partir das qualis, são cruciais para quem planeja interferir no processo político de um país.

Lula da Silva opera, no momento, para manter o apoio dos pobres e ampliar o apoio das classes médias. Certas medidas de seu governo, inclusive quando mexe no imposto de renda, isentando parte substancial da população assalariada, têm a ver com o seu projeto de reeleição.

Gilberto Kassab e Tarcísio de Freitas: unindo centro e direita | Foto: Divulgação

Há um detalhe que as pesquisas às vezes não captam bem. Lula da Silva é “melhor”, para os eleitores, do que seu governo. Quem não fizer a distinção não vai entender, de maneira ampla, porque o petista-chefe aparece na frente ou, eventualmente, empatado com Jair Bolsonaro.

Lula da Silva aparece à frente do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), da ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro (PL), do deputado federal licenciado Eduardo Bolsonaro (PL), do senador Flávio Bolsonaro (PL), do governador do Paraná, Ratinho Júnior (PSD), do governador de Goiás, Ronaldo Caiado (União Brasil) e do governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo).

Por que, no momento, ninguém ganha de Lula da Silva — nem mesmo Jair Bolsonaro? Porque, assim como o líder do PL, o petista-chefe é uma força da natureza. Os dois pairam, por assim dizer, acima dos demais líderes e dos partidos políticos.

Lula da Silva e Jair Bolsonaro são maiores do que seus partidos e são, do ponto de vista de muitos eleitores, não-ideológicos. Quer dizer, as ideologias, de esquerda e de direita, não os atrapalham. O que, convenhamos, é um caso a estudar.

Ronaldo Caiado, Daniel Vilela e Pedro Sales: ampliando a aliança | Foto: Guilherme Alves/Jornal Opção

Então, quem avaliar Lula da Silva pelo governo, o seu governo, pode dar com os burros n’água. O presidente não tem, claro, uma reeleição garantida. Ninguém tem. Mas está no jogo e é forte.

Dado seu jeitão xucro, Jair Bolsonaro parece meio abobado. Mas é uma imagem falsa. Trata-se de um político inteligente e astuto. É uma espécie de Lula da Silva da direita.

Jair Bolsonaro causa espécie em certa elite de esquerda, mas é apreciado pelo povão. Os dois políticos da direita e da esquerda são, digamos assim, “gente como a gente”. Pessoas comuns, por isso “apreciáveis”.

Lula da Silva e Jair Bolsonaro passam a imagem de que, se deixarem — o Congresso (Câmara e Senado) e Judiciário —, podem “resolver” os principais problemas do país. São “salvadores da pátria”, filhos e pais do velho e eficiente estilo populista de fazer política. São diferentes e, ainda assim, são parecidos. Espécies de Caim e Abel, de Esaú e Jacó.

Ciro Nogueira e Antonio Rueda: aproximando o centro e a direita | Foto: Divulgação

Operação para agregar as direitas e os centros

A astúcia de Jair Bolsonaro leva, num primeiro momento, ao ataque de vários políticos, colocando até aliados na defensiva, a depender de sua vontade. Estaria, em tese, afastando-os da competição pela Presidência.

Mas até os netos do ex-presidente sabem que não poderá disputar eleição em 2026, daqui a um ano e três meses. Está inelegível. Quem não entender isto não sabe do que está falando e vai ficar com imagem de paspalhão quando o tempo das convenções chegar.

As movimentações de Jair Bolsonaro pelo país foram e são politicamente eficientes. O líder do PL ficou com a imagem, ante muitos — sobretudo os néscios das redes sociais —, de que poderá ser candidato a presidente.

Entretanto, ao contrário do que pensam os bailundos, Jair Bolsonaro não está se movimentando pelo país, sempre falando pelos cotovelos, porque planeja ser candidato a presidente. Mais do que qualquer um, sabe que não será candidato. Afinal, “o sinal está fechado” para os que são golpistas e espionam ilegalmente.

Ratinho Júnior: líder da direita no Paraná | Foto: Marcelo Andrade

Na verdade, ao circular pelo país, Jair Bolsonaro está buscando, não voto para si, e sim o beija-mão. O ex-presidente opera para que a disputa de 2026 passe por suas mãos. Sobretudo a disputa presidencial e a do Senado. É seu jogo.

Há cientistas políticos que têm preconceito em relação a Jair Bolsonaro. Pelo fato de que lidera a extrema direita e, sim, operou por um golpe de Estado contra Lula da Silva e, em seguida, contra o governo do petista.

Neste sentido, não se trata nem de preconceito, e sim de constatação. Jair Bolsonaro é o líder dos golpistas — como o sequaz general Braga Netto.

De qualquer maneira, o diagnóstico, verdadeiro, de que Jair Bolsonaro é golpista não exime o cientista político de examiná-lo com relativo distanciamento.

Jair Bolsonaro parece andar em linha reta. Seria um político linear. Ou seja, previsível. Mas não é bem assim.

Romeu Zema: a direita de Minas Gerais | Foto: Divulgação

Na circunstância, por trás da capa do “velho” Jair Bolsonaro, há um “novo” Jair Bolsonaro.

Noutras palavras, o que se está dizendo é que Jair Bolsonaro está articulando mais e brigando menos. O que não parece de seu feitio.

Em São Paulo, ao perceber que estava perdendo seu pupilo Tarcísio de Freitas para Gilberto “José de Paris” Kassab — o eminência parda do governador de São Paulo —, Jair Bolsonaro poderia ter “explodido”, assim como tem feito o pueril Eduardo Bolsonaro.

Mudando o percurso, deixando de lado seu caráter explosivo e ególatra, Jair Bolsonaro buscou se aproximar de Gilberto Kassab, sob mediação do epígono Tarcísio de Freitas.

Por que Jair Bolsonaro está mudando sua tática? Porque percebeu que, para alcançar resultado positivo — a estratégica (a Presidência da República para um aliado) —, precisa aglutinar as direitas.

Michelle Bolsonaro: a alternativa familiar para uma questão pública | Foto: Agência Brasil

Orientado talvez por pesquisadores experimentados, Jair Bolsonaro finalmente entendeu que, para tentar vencer Lula da Silva — um profissional da política —, precisa, mais do que tudo, aglutinar as direitas e os centros políticos.

A rigor, Gilberto Kassab não é de direita. É de centro. Um centro que tende para a direita, mas não se torna direita. Trata-se de um centro que agrega insatisfeitos de várias correntes, inclusive a direita. Agindo com habilidade, o ex-prefeito de São Paulo conseguiu montar um dos partidos mais fortes da Câmara dos Deputados e do Senado. Trata-se do PSD.

Em São Paulo, quem opera a base legislativa para Tarcísio de Freitas governar em paz não é o bolsonarismo, e sim o kassabismo, que é moderado, tolerante e pragmático.

O candidato a presidente da direita vai precisar das direitas, da centro-direita e do centro. Jair Bolsonaro, num átimo, parece que percebeu que o jogo passa por aí.

Gustavo Gayer: próximo da base de Ronaldo Caiado e Daniel Vilela | Foto: Câmara dos Deputados

As direitas e os centros — frise-se: não há um único centro, pois a vibe do senador Ciro Nogueira, do pP, não é a mesma de Gilberto Kassab —, se estiveram unidos, não apenas para a disputa presidencial, mas também para as disputas para governador nos Estados e no Distrito Federal, com bases amplamente reforçadas, poderão ganhar de Lula da Silva talvez no primeiro turno.

Porém, se a eleição for entre um candidato da direita — resultante quem sabe de uma disputa desgastante no primeiro turno — e Lula da Silva, no governo turno, o resultado pode ser dos mais imprevisíveis.

Se Lula da Silva for para o segundo turno em primeiro lugar, como resultado de uma luta fratricida das direitas no primeiro turno, a expectativa de poder poderá reforçar sua campanha.

O petista-chefe é responsável por cinco eleições vitoriosas para presidente da República. Insista-se: é um profissional. Do quilate de Jair Bolsonaro, talvez até mais astuto, mais tancredianonevista.

Como fica o quadro das direitas em Goiás

Ao operar para formatar uma grande frente política dos centros — com Ciro Nogueira e Gilberto Kassab — e das direitas — com Ronaldo Caiado, Romeu Zema, Ratinho Júnior e Tarcísio de Freitas —, Jair Bolsonaro sabe que terá de fazer concessões nos Estados.

Em Goiás, por exemplo, opera por uma aliança com Ronaldo Caiado e Daniel Vilela (MDB). O PL lançará, possivelmente, um dos candidatos a senador — quiçá o deputado federal Gustavo Gayer, se estiver elegível em 2026, ou Fred Rodrigues — como companheiro de chapa de Gracinha Caiado.

A tendência é que a chapa governista em Goiás, derivada da definição da eleição nacional, seja composta assim: Daniel Vilela, para governador, Adriano da Rocha Lima (Pedro Sales ou José Mário Schreiner), na vice, e Gracinha Caiado e Gustavo Gayer (ou Fred Rodrigues) para senador. O empresário Alexandre Baldy, do pP, e o deputado federal Zacharias Calil, do União Brasil (tende a trocar de partido), devem ser suplentes.

Se opera para unir as direitas em todo o país, por que Jair Bolsonaro não planeja uni-las em Goiás? É a pergunta crucial. A lógica sugere união geral.

O quadro pode ser outro? Claro. As coisas estão se definindo como descritas acima, mas ainda não estão definidas. O senador Wilder Morais (PL), se a aliança não for adiante, poderá ser candidato a governador.