Mulheres que governam países estão se sobressaindo no combate à pandemia do coronavírus
19 abril 2020 às 00h00
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Lógicas, disciplinadas e pró-ciência, gestoras de Taiwan, Nova Zelândia, Finlândia, Islândia e Alemanha são bons exemplos para Bolsonaro e Trump
Pesquisas feitas pela Universidade do Sul da Califórnia, nos Estados Unidos, e pela Universidade Radboud, da Holanda, concluíram que mulheres governantes, mesmo sob intensa pressão, em geral administram de maneira mais prudente do que homens. Levantamentos recentes demolem uma tese antiga — de que mulheres são mais intuitivas e os homens mais lógicos. Mostram que elas são mais lógicas e hábeis e concentradas no exame dos dados, das informações, e no estabelecimento de ações. Não decidem por impulso, têm uma mentalidade científica e não são resistentes às mudanças.
No combate à pandemia do novo coronavírus, as mulheres que administram países estão se saindo melhor, na maioria dos casos, do que os homens. Mais tarde, com o problema resolvido, será possível avaliar as informações com mais precisão. Entretanto, no momento, as mulheres estão bem na frente, tanto em eficiência quanto em visão humanista no trato aos indivíduos. Quando precisam ser firmes, como no fechamento de fronteiras entre países, não titubeiam. No intuito de salvar vidas, agem como estadistas determinadas. É provável que Winston Churchill ficaria impressionado com o que está acontecendo.
Taiwan de Tsai Ing-wen
Tsai Ing-wen, de 63 anos, é mestre e doutora em Direito pela Universidade Cornell (onde Vladimir Nabokov deu aulas de literatura), nos Estados Unidos, e tem Ph.D em Direito pela prestigiosa London School of Econmics, da Inglaterra. Professora universitária, Tsai Ing-wen está no segundo mandato como presidente de Taiwan (é a primeira mulher a gerir o país). Muito menor do que Goiás e pouco maior do que Sergipe e Israel, a ilha conta com 25 milhões de habitantes. Forte na área de tecnologia, a nação asiática é a 26ª maior economia do mundo.
Até quinta-feira, 16, foram diagnosticadas 395 pessoas com a Covid-19 — com seis mortes. Frise-se que o país fica próximo da China, onde primeiro apareceu o novo coronavírus, com rápida mortandade.
Ao contrário de outros gestores, Tsai Ing-wen percebeu rapidamente a gravidade da crise. A autoridade pública de Wuhan admitiu ter registros de casos de uma “pneumonia misteriosa”, em 31 de dezembro de 2019. A presidente decidiu, no mesmo dia, que os voos provenientes da cidade chinesa teriam de passar por inspeções sanitárias rigorosas. Adiante, em 23 de janeiro de 2020, os visitantes de Wuhan foram devolvidos à China. Depois, em 6 de fevereiro, todos os chineses foram proibidos de trafegar pelo pequeno país.
O governo de Taiwan criou um centro de controle para a Covid-19. A presidente Tsai Ing-wen acrescentou mais uma medida: fechou as fronteiras “para todos os não residentes. O país também aumentou consideravelmente a produção de equipamentos respiratórios e máscaras — 16 milhões das quais serão doadas para alguns dos países mais afetados pela doença, entre eles os Estados Unidos e Estados-membros da União Européia”, informa reportagem de Ana Rosa Alves, de “O Globo”.
Nova Zelândia de Jacinda Asdern
Jacinda Kate Laurell Ardern, de 39 anos, é formada pela Universidade de Waikato e assessorou o ex-primeiro-ministro da Inglaterra Tony Blair. A jovem é a primeira-ministra da Nova Zelândia — hoje conhecida como “terra dos hobbits” (por causa do filme-franquia “O Senhor dos Anéis”, baseado na obra do escritor britânico John Ronald Reuel Tolkien). O país é rico, tem um dos IDHs mais altos do mundo e a corrupção é escassa. O país, menor do que Goiás, tem quase 5 milhões de habitantes (Goiás tem 7 milhões).
A Nova Zelândia, até quinta-feira, 16, tinha nove mortes. Jacinda Ardern, ao receber as primeiras informações sobre o novo coronavírus, processou-as e tomou uma decisão imediata. A primeira-ministra mandou fazer testes em massa e, prontamente, fechou as fronteiras do país. Determinou também o isolamento social logo no começo da pandemia.
Jacinda Ardern não fez “comícios” pelas ruas, não esbravejou com o ministro da Saúde. Nada disso. Serenamente, sem titubear, aconselhou-se com médicos e cientistas e tomou as decisões que um estadista tem de tomar para salvar a vida das pessoas. E, no lugar de intermináveis reuniões, decidiu tudo rapidamente. A política se apresenta como socialdemocrata.
Na Nova Zelândia, o governo está preocupado com a economia, mas o centro do debate é a vida das pessoas. O país é apontado como bem estruturado e, por isso, a crise tende a ser debelada mais rapidamente.
Finlândia de Sanna Mirella Marin
Com um espaço territorial do tamanho de Goiás, e 5,5 milhões de habitantes, a Finlândia é um país que investe maciçamente em educação. Seu IDH é um dos maiores do mundo. Além dos serviços, o país é forte na produção de alta tecnologia e fabricação de máquinas e veículos. Trata-se de um país nórdico.
A primeira-ministra da Finlândia, Sanna Mirella Marin, é, entre os gestores de países, a mais nova do mundo — tem apenas 34 anos. Formada em Administração pela Universidade de Tampere, participa da vida política do país há algum tempo. É considerada de esquerda e sempre posicionada em defesa das questões sociais. É uma grande incentivadora da educação moderna do país — apontada como uma das melhores do planeta.
Por ser jovem e atenta aos novos meios de comunicação, Sanna Marin usou, com habilidade e eficiência, as redes sociais e buscou apoio nos influenciadores digitais para combater o novo coronavírus. Em pouco tempo, a população, dado o incentivo do governo, tornou-se bem informada sobre a doença. Até quinta-feira, 16, a nação finlandesa tinha 3369 pessoas infectadas e 72 mortes.
Dada a rapidez em combater a pandemia e em atender as pessoas, a popularidade da primeira-ministra alcançou 85% dos eleitores. Ao contrário do presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, que está em baixa, sobretudo por não apoiar o isolamento social.
Islândia de Katrín Jakobsdóttir
A Islândia (a terra do gelo) é um país nórdico, um território vasto (102.775km²) para uma população de 363 mil habitantes. É rico, com serviços ativos e uma indústria (não só da pesca) avançada. O processamento de alumínio (a energia elétrica barata permite preços competitivos no mercado internacional) e de alimentos é um de seus pontos fortes. Como a Finlândia, o governo investe fortemente em educação. O IDH é um dos mais altos do mundo.
Katrín Jakobsdóttir, de 44 anos, é formada em islandês e francês pela Universidade da Islândia. O tema de sua dissertação de mestrado é a obra do escritor de romances policiais Arnaldur Indrioason. Apesar da possibilidade de uma carreira acadêmica, dada sua excelente formação intelectual, a jovem optou pela política.
A revista “Forbes” destaca que Katrín Jakobsdóttir, uma política que participa ativamente da vida de seu país, tem uma atuação proativa no combate à pandemia do coronavírus.
Desde o início, o governo de Katrín Jakobsdóttir ofereceu testes gratuitos para os moradores do país. Mesmo aos que não apresentam sintomas. A Islândia testou no mínimo 10% da população e o governo acompanha bem de perto o que está acontecendo com seus cidadãos. Sublinhe-se que a primeira-ministra não perdeu tempo com discussões inócuas nem com debates estéreis a respeito da história do “vírus chinês”. A prioridade é o atendimento rápido e de qualidade — para salvar vidas — e não o debate ideológico, quase sempre infrutífero e parasitário quando se trata de saúde. Como o governador de Goiás, Ronaldo Caiado, a primeira-ministra não politizou, no pior sentido do termo, a questão.
Até quinta-feira, 16, a Islândia havia registrado 1,7 mil casos de contaminação e somente oito mortos. A gestão de Katrín Jakobsdóttir criou um sistema de rastreamento de dados de alta qualidade e isto abriu a possibilidade de o país não precisar optar pelo isolamento nem pelo fechamento das escolas.
Alemanha de Angela Merkel
A Alemanha, país mais rico do Europa e o quarto mais rico do mundo — com um nível de vida muito superior ao do segundo mais rico, a China —, é, no concerto das nações, relativamente nova. Nasceu em 1871 — há 149 anos, sob a égide da Prússia e de Otto von Bismarck. Sua área territorial (357.051 km²) é maior do que a de São Paulo (248.222 km²) e pouco maior do que a de Goiás (340.111 km²). O país tem 82,8 milhões de habitantes.
Portento tecnológico-industrial, em várias áreas, a Alemanha, desde Konrad Adenauer (governou o país de 1949 a 1963 — até aos 87 anos de idade), se firmou como a grande potência da Europa, acima da Inglaterra (os seguidores de Boris Johnson, ao vergastar a União Europeia, miram muito mais os alemães, eternos rivais), da França e da Itália. Nos últimos anos, o país adotou uma política cordial no relacionamento com os imigrantes — que recebem ampla proteção do Estado. O que prova que conservadores, ao contrário da lenda criada pela esquerda, não são sinônimo de “atraso” e “reacionarismo”.
A chanceler alemã, Angela Dorothea Merkel (née Kasner), é uma política extraordinária. Formada em Física pela Universidade de Leipzig, sua tese de doutorado é sobre física quântica. Conservadora, é, acima de tudo, uma humanista. Sua política de tratamento aos imigrantes — receptiva e presente — é uma das mais humanas da Europa e ela se tornou, por isso, uma figura inspiradora. Talvez seja possível dizer que se trata da conservadora mais progressista da Europa.
Ao contrário de Bolsonaro — cuja visão é pré-científica (mantém uma espécie de relação mágica com medicamentos miraculosos, como a cloroquina) —, Angela Merkel, até por sua formação rigorosa, é inteiramente pró-ciência. Sua popularidade, depois de vários anos (desde 2005) governando a Alemanha— cujo povo é exigente e bem informado —, permanece alta. Ela é respeitada, admirada. Uma estadista com a qual o povo — volk — pode contar e em quem se pode confiar.
A Alemanha é um dos países mais atingidos pelo coronavírus. Até quinta-feira, 16, para 137.698 casos registrados, morreram 4052 pessoas. Embora seja o quarto país mais atingido pelo coronavírus (não se está tratando aqui de mortes), ainda assim tem menos mortes do que Estados Unidos e Irã, fora da Europa, e, no continente europeu, Itália, Espanha, França, Reino Unido e Bélgica.
Angela Merkel adotou medidas rigorosas para garantir o distanciamento entre pessoas — e por isso não optou pelo confinamento nacional (há quem diga que, dada a disciplina dos alemães, isto é mais fácil do que em outros países). O governo proibiu encontros — reuniões — com mais de duas pessoas. Escolas, lojas e centros esportivos estão fechados. O maior número de leitos de terapia intensiva da Europa fica na Alemanha.
A chanceler adotou a política de fazer testes em massa — mais de cem mil por dia — da população alemã (o que inclui os imigrantes). Os problemas existem, e vão se agravar, até determinado período, mas Angela Merkel tomou as medidas cabíveis em tempo hábil. Sobretudo, adotou as soluções adequadas, por aceitar a orientação de médicos e cientistas. Ela também pensa na economia, mas prioriza a saúde. É adepta da tese de que um carro pode ser substituído, mas a vida é única, não há “peça” sobressalente.
Em síntese, como apontou o “Estadão”, as mulheres governantes estão acertando por vários motivos — como “as intervenções rápidas, baseadas em argumentos científicos, testes em massa, medidas de isolamento efetivas e transparência com a população”. São ótimos exemplos para os presidentes Bolsonaro, do Brasil, e Donald Trump, dos Estados Unidos.