Lulodependência pode levar o PT ao suicídio político na eleição de outubro
21 abril 2018 às 21h43
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O PT não será extinto, mas ficará cada vez mais fraco se insistir, durante a campanha deste ano, em fazer mais a defesa de Lula da Silva e menos a defesa do Brasil
Petistas, como a senadora Gleisi Helena Hoffmann, presidente do PT, estão defendendo Lula da Silva, mas não o PT? Em tese, postulam a defesa de ambos. Mas parecem acreditar que, para salvar o PT, só há uma alternativa: salvar o ex-presidente.
Lula da Silva é um grande político e tem de ser avaliado pela média (sua história), não exclusivamente pela condenação (o extremo). Sua história é maior, até muito maior, do que o envolvimento em corrupção. Mas sua condenação à prisão nada tem de ilegal e, portanto, não afronta as leis do país. Na verdade, trata-se de uma prisão absolutamente legal — tanto que seus advogados recorreram a todas as instâncias e a todos os artifícios legais para tentar livrá-lo da cadeia. Se houvesse alguma ilegalidade e ilegitimidade nas ações da Polícia Federal, do Ministério Público Federal e da Justiça, os petistas tão-somente denunciariam suas ações, e não contratariam advogados de primeira linha para defendê-lo. O apelo de Gleisi Hoffmann aos países árabes, como se pudessem interferir no Brasil, fica na conta do ridículo, do folclore político. É como se estivesse convocando os árabes para um golpe de Estado no Brasil. Por que não há nenhuma maneira legal de eles interferirem no país tropical abençoado por Deus. Desespero não ajuda nem Lula da Silva nem o PT. Muito menos a nação.
O que dizer da Gleisi Hoffmann? Que merece respeito, e não deve ser achincalhada devido às suas posições políticas. Mas o que quer realmente, diria um psicanalista, a presidente do PT? O mais provável é que, por trás do discurso de que precisa livrar Lula da Silva da cadeia, a fala oculta da senadora seja outra. Livrar Lula, se for possível — e, por certo, não é (frise-se que responde a outros processos) —, seria o mesmo que salvar Gleisi Hoffmann e, claro, outros petistas.
Pré-candidata a deputada federal em outubro, no Paraná, Gleisi Hoffmann está em campanha aberta, ao fazer a defesa de Lula da Silva, para ser eleita. Porque, se não for, cai nas malhas da Justiça de primeira instância. Nas mãos de juízes rigorosos, como Sergio Fernando Moro, dificilmente a senadora, cujo mandato acaba em 31 de dezembro deste ano, escapará de uma prisão (ela e o marido, Paulo Bernardo). As denúncias contra a petista são fortes e, aparentemente, substantivas.
Talvez seja possível sugerir que, quando olha Lula da Silva, o preso, Gleisi Hoffmann pensa mais ou menos o seguinte: “Sou eu amanhã”. Ora, se prenderam um ex-presidente da República, um político com a história de Lula da Silva, por que os magistrados não seriam rigorosos com uma senadora, em comparação, relativamente anódina?
Tiro no pé
No fundo, o PT só enxerga uma salvação para si, quer dizer, precisa “salvar” Lula da Silva, transformando-o em mártir. Ocorre que a população brasileira não tem o hábito de perdoar mártires corruptos, e o ex-presidente poderá ser condenado em novos processos, aumentando a pecha de que “assaltou” os cofres públicos.
É claro que não há a mínima condição de o PT lavar as mãos e adotar o discurso de que precisa se livrar de Lula da Silva. Não dá para dissociar o PT da figura do ex-presidente. Pode-se dizer que o poderoso chefão é, até aqui, o oxigênio do petismo. Daqui pra frente, pode se tornar o gás carbônico.
Mas os próceres esquerdistas precisam entender que, da cadeia, Lula da Silva poderá ajudá-los apenas parcialmente. Durante a campanha, poderá até prejudicar os candidatos do PT.
Portanto, a lulodependência pode levar ao suicídio político-eleitoral do PT. Petistas que estão enrolados na Operação Lava Jato (e outras), e para os quais não há escapatória que não seja uma condenação, certamente vão continuar com o discurso de que Lula da Silva é vítima e que, mesmo da prisão, fortalece o PT. Trata-se do famoso tiro no pé.
Petistas que não estão envolvidos com corrupção, e são centenas pelo país, só têm um caminho para não serem mal-sucedidos do ponto de vista eleitoral. Claro que não terão como abandonar Lula da Silva — elefante em sala de quitinete —, mas terão de se distanciar do ex-presidente e, ao mesmo tempo, condenar a corrupção de maneira veemente. Quem não adotar este discurso, priorizando também um projeto para a sociedade — a defesa de Lula tende a ser vista como um projeto contra o país, contra a legalidade —, dificilmente será eleito ou reeleito. Na campanha, os petistas que perderem tempo focando em Lula, e não nas questões de interesse dos indivíduos-cidadãos, certamente serão derrotados. Se Lula da Silva é um problema do PT, de seus militantes, não é, desde sua prisão, um problema do país, que tenderá a esquecê-lo. Petistas acham que brasileiros de formação cultural mediana ainda se lembram de Getúlio Vargas e Juscelino Kubitschek?
O PT está no chão, nocauteado. Mas tem condições de se levantar. Só precisa entender que deve romper com a lulodependência. Não há escapatória. Ou levanta a cabeça e diz à sociedade que tem substitutos decentes ou passará pelo maior vexame eleitoral de sua história.
Até os gatos, cachorros e pássaros de Garanhuns, São Bernardo e Curitiba sabem que Lula da Silva não tem mais condições de ser candidato a presidente da República. Sua ficha é suja, pela condenação judicial em segunda instância. Mais do que isto, sua ficha é suja do ponto de vista dos brasileiros, independentemente da decisão da Justiça. Ao defender Lula, sem avaliar o que pensa realmente a sociedade — que não é sinônimo de sindicalistas e líderes de trabalhadores sem-terra e sem-teto —, o petismo mostra profunda desconexão com a sociedade, com os brasileiros que não são vinculados a partidos e ideologias políticas. Nos anos em que governou o país, de 2003 a 2016, o PT mostrou sintonia com a sociedade, apesar de todos os percalços apontados — como a corrupção e, aqui e ali, arroubos autoritários. Agora, ante a prisão de Lula da Silva, parece ter esquecido tudo, sobretudo a moderação, e, devido ao desespero, voltou às práticas antigas, como a contestação de decisões judiciais.
Se Lula da Silva não pode e não vai ser candidato a presidente, mas continua com o nome em pauta pelos petistas — os institutos de pesquisa insistem em colocar seu nome nos levantamentos, como se o político fosse o dom Sebastião do Brasil —, o PT está cometendo um “crime” contra seu mais provável candidato a presidente, Fernando Haddad.
Como ministro da Educação e prefeito de São Paulo, sempre na cota de Lula da Silva, Fernando Haddad, se não brilhou, também não fez feio. Não há notícia de que seja venal e, apesar das críticas, talvez não seja possível avaliar sua gestão na capital de São Paulo — com PIB e população superiores aos de vários Estados — como ruim. Não foi excelente, mas deve ser considerada no limiar do razoável, quiçá do “bom”.
Economista, professor da Universidade de São Paulo, Fernando Haddad é mais articulado do que a maioria dos petistas. Embora seja o candidato preferido de Lula da Silva — ao lado do baiano Jaques Wagner (mais político do que o ex-prefeito de São Paulo, mas com a imagem mais desgastada) —, está sendo tratado, pelo próprio PT, como um político do segundo time. Com sua boa imagem, além do discurso fácil, ainda que não populista, o que o distingue de Lula da Silva (e o PT talvez precise de alguém que seja diferente do ex-presidente), pode não ser eleito, mas terá condições de preservar parte do legado do PT e, ao mesmo tempo, ajudar os candidatos do partido nos Estados.
O PT não será extinto, mas ficará cada vez mais fraco se insistir, durante a campanha deste ano, em fazer mais a defesa de Lula da Silva e menos a defesa do Brasil. O PT precisa ser, até outubro, menos lulopetista e mais petista e brasileiro. É sua salvação.
Há quem postule que, por ter azeitado a corrupção no país, no lugar de combatê-la, o PT merece a extinção. É um equívoco. O PT é um partido de esquerda — não deixou de ser esquerda porque alguns de seus líderes, como Lula da Silva, José Dirceu e Antonio Palocci, retiraram, direta ou indiretamente, dinheiro dos cofres públicos — dos mais moderados. Não tem — ou não tinha — a mínima intenção de trocar o capitalismo pelo socialismo. No máximo, queria implantar uma espécie de socialdemocracia no país. Por mais que a direita não aceite, o PT não é stalinista e, insista-se, não trabalhou para implantar um regime similar ao cubano no país. Sem o PT como partido de esquerda hegemônico, praticamente subordinando ou contendo os demais partidos de esquerda, há uma tendência à radicalização — que não é positiva para a sociedade. Para o Brasil, portanto, é importante que o PT não seja extinto. Porque, com todos os problemas, é superior a partidos radicais como PSOL, PSTU e PC do B.