Há eleitores de direita e de esquerda no Brasil, obviamente. Mas a maioria dos eleitores não confere tanta importância às questões ideológicas, optando por avaliar resultados das gestões dos governantes.

Pode se criticar Lula da Silva, do PT, e Jair Bolsonaro, do PL, tanto em termos de ideário quanto de gestão. Mas os eleitores escolheram, para a disputa do segundo turno, os dois políticos mais experimentados. O petista foi presidente da República por oito anos e é político há mais de 40 anos. Bolsonaro, várias vezes deputado federal, é presidente há três anos e quase 10 meses. A dupla conhece o Brasil e, por experiência, sabe o que se precisa fazer.

Portanto, ao colocar Lula da Silva e Bolsonaro no segundo turno, não importando se um é de esquerda e se o outro é de direita, os eleitores mostraram amadurecimento, no sentindo de apostar na experiência, em quem, bem ou mal, tem o que apresentar — quer dizer, tem resultados para mostrar.

Havia uma expectativa de que Lula da Silva ganharia no primeiro turno e quase venceu. Faltou menos de dois pontos percentuais para o petista liquidar a fatura na primeira etapa. Já Bolsonaro ficou em segundo lugar, mas com uma votação maior do que as pesquisas previam. Foram apresentadas várias questões a respeito disso, e, no geral, a discussão é politizada, sem qualquer objetividade. As opiniões, às vezes mal-informadas e mal-intencionadas, substituíram a exposição de argumentos.

Fala-se que, no segundo turno, há uma “instabilidade” dos eleitores. É como se estivessem se movendo, pra lá e pra cá, e por isso a expectativa de poder é, a rigor, dos dois candidatos. As pesquisas indicam que Lula da Silva é o favorito, mas com Bolsonaro nos calcanhares. O Datafolha mostra que só está perdendo no Nordeste

Como o debate sobre as pesquisas está inteiramente politizado, é praticamente impossível discutir a questão de modo razoável. Nem mesmo diretores dos institutos souberam se defender, e um dos motivos é que não querem dizer o óbvio: pesquisas quantitativas não têm a obrigação de acertar resultados eleitorais. Seus resultados são intenções de voto e, se elas variam, e às vezes velozmente, aquilo que sai das urnas pode ser um tanto diferente da, digamos, “previsão”.

Os questionários poderiam ser mais abrangentes, por exemplo, para explicar a posição dos indecisos, que, na prorrogação, o dia da eleição, podem mudar o quadro percebido pelos institutos de pesquisa. A própria palavra “indecisos” talvez tenha de ser revisada. Porque, muitas vezes, não são exatamente indecisos, e sim eleitores que estão observando o quadro com extrema atenção e, por isso, decidem em cima da hora. Os que se posicionam com certa antecedência, não raro sem examinar os projetos dos candidatos, são mesmo os eleitores decididos?

Fala-se que, no segundo turno, há uma “instabilidade” dos eleitores. É como se eles estivessem se movendo, pra lá e pra cá, e por isso a expectativa de poder é, a rigor, dos dois candidatos. As pesquisas indicam que Lula da Silva é o favorito, mas com Bolsonaro nos calcanhares. O Datafolha mostra que só está perdendo no Nordeste, o que é preocupante para o petista.

Num quadro que se aproxima de empate técnico, ao menos em algumas pesquisas, o que os eleitores estão dizendo? Que estão acompanhando a campanha — inclusive os ataques das artilharias pesadas dos dois lados (a bolsonarista parece ainda mais ativa) — com atenção redobrada. Como não são, em sua maioria, ideológicos, e sim pragmáticos, os eleitores estão “oscilando”. São indecisos? Talvez não. O mais provável é que às vezes se entusiasmam com um candidato e, aqui e ali, perdem a empolgação com o outro postulante. A “pancadaria” do bolsonarismo ou do lulismo muda votos de vários eleitores? É provável que sim. Mas pode ser que alguma proposta também galvanize a atenção deles e, de repente, mude seu voto.

Costuma-se sugerir que ganha eleição quem mantém a expectativa de poder ao seu “lado”, sedimentando-a, pouco a pouco, até torná-la insuperável. Hoje, a expectativa de poder está com Lula da Silva?

Uma leitura das pesquisas indica que, de fato, a expectativa de poder está com Lula da Silva. Mas é uma expectativa de poder cristalizada? Pode ser e pode não ser.

Na verdade, as duas candidaturas são fortes, muito fortes, e estão galvanizando a opinião dos eleitores. Por isso, tanto pode ganhar o candidato do PT quanto o candidato do PL. O quadro é de incerteza.

Cobra-se que os candidatos sejam propositivos e, a rigor, nenhum dos dois tem sido. Pelo contrário, esmeram-se em ataques, com “artilharia russa”. Fica-se com a impressão de que os eleitores apreciam observar a exibição pública dos defeitos de cada um para conhecer o que há nos “escaninhos” de gente “poderosa” e “importante”.

Mas, para o país, não é mais adequado uma campanha propositiva, voltada para o presente e para o futuro? Claro que é. Porém, num quadro polarizado, os candidatos tendem a apresentar os defeitos um do outro — aumentando-os, por vezes — com o objetivo de aumentar sua rejeição, ou seja, de retirar votos.

A campanha de Bolsonaro investe pesado na questão da corrupção dos governos do PT — lembrando o mensalão e o petrolão, que são fatos incontestáveis — e em sua suposta “aliança” com criminosos (sem evidências factíveis). Associa o petista ao comunismo, quando é, no máximo, socialdemocrata.

A campanha de Lula menciona as rachadinhas, que, segundo a jornalista investigativa Juliana Dal Piva, no livro “O Negócio do Jair — História do Clã Bolsonaro”, foram “inventadas”, não pelo senador Flávio Bolsonaro (PL), como as vezes se pensa, e sim por Jair Bolsonaro (o negócio dele é isto: rachadinhas).

Juliana Dal Piva mostra, numa pesquisa rigorosa, que a família comprou dezenas de imóveis — oficialmente, 51 —, quase sempre pagando com dinheiro (e não cheques ou depósitos bancários), supostamente com recursos de origem pública, oriundos das rachadinhas. Durante anos, Bolsonaro e ao menos dois de seus filhos contrataram funcionários para seus gabinetes e ficavam com a maior parte dos ganhos (às vezes 90%, e até o auxílio alimentação e a restituição do imposto de renda). A relação entre o miliciano Adriano da Nóbrega (morto na Bahia por PMs), capitão da Polícia Militar que era expert em assassinatos sob encomenda, e os Bolsonaro ainda não está inteiramente dimensionada. Mas, sim, eram amigos.

A última pesquisa Datafolha mostra um quadro de empate técnico entre Lula da Silva (49% — 53% dos votos válidos) e Jair Bolsonaro (44% — 47% dos votos válidos). O petista permanece em primeiro lugar, num quadro de estabilidade, mas sua posição não é confortável. Faltam 14 dias para a eleição — que será realizada no dia 30 de outubro. Há tempo para uma reviravolta pró-Bolsonaro? Não é possível prever. O que se pode dizer é que, diante de um eleitorado que parece estável mas não é, tudo é possível.